Bokurano
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REVERIE: COMEÇO DA PARADA

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Mensagem  Admin Qui Dez 30, 2010 4:52 pm

REVERIE: COMEÇO DA PARADA 2ahfm9u

Capítulo 1: Fala, Gil!

Como aprender a ser stalker. Eu deveria escrever um livro falando sobre o assunto. Bom, não é algo tão fácil assim de ser ministrado, requer talento natural, acima de tudo, além de uma disposição tremenda para perder tempo vasculhando a vida alheia, de celebridades ou não e por aí vai. Passei a pensar sobre o livro quando saí do Rio de Janeiro, minha cidade natal, em direção à São Paulo, a terra que já foi da garoa, agora é das chuvas constantes, do nublado constante e do monóxido de carbono constante, mas na minha opinião ele é tão falho que nem o sinto – eu sou leigo até demais nestes assuntos, quem se sentir incomodado, por favor, me corrija. Percebi que o sotaque dos fluminenses muda a partir de Barra do Piraí, e olha que este município nem tão longe fica do Rio, quando você se embrenha mais ao oeste da coisa já ouvimos sotaque caipira, aquele sotaque paulista caipira básico, que mesmo sendo caipira soa melhor que o sotaque padrão paulistano. Mas, o que é o sotaque padrão paulistano, hoje em dia. São Paulo comporta pelo menos 3 sotaques, 3 “dialetos”: o padrão “não tô EINTEINDEINDO”, o caipira (que predomina da Grande São Paulo para os lados) e o nordestino. Não entendo como ainda tem paulistano que odeia nordestino. Eles estão longe da minha lista de vítimas do meu preconceito, eles são tão úteis, foram tão úteis para o crescimento e desenvolvimento da capital que, puta que pariu, alguém deveria alçá-los a um status mais favorável. Uma viagem de 6 horas no ônibus ou faz a gente pensar bastante sobre uma porrada de coisas ou nos faz pensar em nada, é 8 ou 80 mesmo, pode crer. Ou então nos direciona à vergonha, como no caso de que eu estava totalmente perdido e sem dinheiro em Belo Horizonte, e, sendo ajudado para retornar ao Rio me debulhei em choro ali mesmo, na poltrona 34 do Executivo da viação Útil. Se eu explicitei minha tristeza para os outros foi porque queria que compartilhassem dela de qualquer jeito, e foi o que fiz. Olhando para os outros com os olhos transbordando lágrimas, a boca trêmula, os membros encolhidos... e me mostrando assim para uma mulher bonita! Eu sou um imbecil, claro. Isso foi há mais de 5 anos, quando vagava por aí sem destino e sem uma mentalidade pronta. E como estou hoje? Preparado para vagar por aí com maior segurança, segurança mental, física, psicológica, mas tão coitado quanto antes. A diferença é que não cometo mais estas besteiras. Mas, como eu estava carente, meu Deus... Er... ainda estou.

Tive de reler algumas revistas enquanto não chegávamos ao terminal Tietê. Na viagem passada, de Sampa para o Rio, puxei conversa com uma jovem que havia sentado do meu lado. Quando é mulher bonita sempre puxo assunto e desenvolvo uma conversa, deixo ela relaxada e aberta o suficiente para que eu pergunte se ela tem namorado. Quando respondem que sim, eu obviamente me retraio, assim como a animação e espontaneidade de meus papos. Geralmente, elas percebem, e eu me envergonho. Foi assim com uma magrelinha pálida e ruiva que fazia faculdade de Moda em São Paulo, e quando ela disse que não gostava de sair, mas depois ligou para uma amiga dizendo que sim, que daria as caras em uma festinha, eu pensei que ela estava sendo a pessoa mais óbvia possível. O namorado dela devia ser um merda, mas mesmo assim, um merda que comia bem, pois eu gosto de magrelinhas branquinhas com sarda e ruivas. Tinha um sorriso aberto, dava para ver seus últimos molares, olhos grandes e castanho escuros. A última que conversei foi uma gordinha de cabelos pretos e longos, peitudaça e que quando disse que tinha namorado abriu um sorriso assumidamente constrangedor. Antes disso, eu precisava de seus “serviços”: eu tinha um trabalho a ser feito num museu, tinha hora para chegar, mas não tinha como contatar os chefes naquele momento, e eu nem uso celular. ODEIO CELULAR. Daí, ela me fez o favor de ligar pros caras, que permitiram meu atraso numa boa. Depois que disse que tinha namorado confundiu alhos com bugalhos e disse que me ajudou “por puro altruísmo”. Eu sei disso, minha filha. Ninguém se apaixona por mim, e eu também não misturei as coisas quando perguntei se você tinha namorado. Depois destas duas experiências maravilhosas, por que eu iria insistir em bater papo com gurias bonitas nas viagens?

É certo que não vou entrar nessa palhaçada de dizer que as mulheres são isso e aquilo. O problema é que tem uma negada que perde tempo demais questionando as mulheres e seu jeito. Eu já quebrei muito a cabeça falando sobre isso, um maldito feito que só acabava comigo, com minha paciência, com minha mente. Sabe a frigideira? Então, imagine um cérebro fritando em uma frigideira. Era o meu. Não perco mais tempo com essa besteira.

Qual a minha situação atual? Por que eu me mudei para São Paulo? Como gosto de fazer “cu doce” em certas situações, não vou dizer assim de pronto. Desci o Brasil para investigar uma pessoa, mas esse não é o principal motivo de estar me deslocando da cidade que já foi maravilhosa para a cidade nublada que combina mais comigo do que qualquer outra cidade, pequena ou grande. Obviamente, carrego uns apetrechos que quebram um galhão quando preciso. O meu laptop, por exemplo. Eu tinha dificuldades em abri-lo em qualquer lugar lá no Rio. Isso, é isso mesmo que você está pensando: é porque lá é bem perigoso, etc e tal. É, é isso mesmo. Mas hoje em dia qualquer cidade é perigosa, certo? Só que no Rio a banda toca de forma mais hardcore que em outros lugares. Mas, eu passei bem pouco por situações de risco, só quando eu procurava. Como por exemplo, nos dias em que morria de fome e caminhava por locais desconhecidos, na época em que eu precisava de grana para a passagem do ônibus, a barriga vazia, as pernas maltratadas de tanto caminhar. Certo dia cheguei na entrada de uma favela, na Ilha do Governador, procurando a associação de moradores do bairro... acho que o nome era Guarabu, e acabei topando com um jovem mulato que portava um walkie talkie. Meu intuito era não olhar para ele, mas ele iria chegar em mim de qualquer jeito, já que ele era um bandido e eu, um desconhecido naquele lugar. Na entrada da favela mesmo, eu podia ser levado para o interior desta e ser morto ou tomar uma surra, se me confundissem com informante da polícia. Já aconteceu antes, não custava nada acontecer de novo.

“Vem cá, tu veio de onde?”, foi a pergunta dele. Em segundos, tive de me desdobrar para bolar uma origem que não batesse de frente com as “áreas de abrangência” das favelas e facções criminosas, porque você sabe que o Rio de Janeiro tem facções que dominam boa parte das favelas, e claro, um cara de favela x não pode entrar em favela y. Respondi que moro no Centro, “perto da Rua do Senado”. Isso, escolhi um lugar bem neutro, o que é difícil de achar na cidade. Disse que iria conversar com alguém da associação porque estava procurando emprego e tudo mais, mas foi difícil dele cair na minha lábia. Percebeu que eu estava BEM nervoso quando minhas pernas bambearam de forma bastante vergonhosa, eu lá, temendo por minha vida e gaguejando como se não houvesse amanhã. “Ó, não fica nervoso não, hein? O bagulho está doido”, o meu coração também estava doido, porque batia bem rapidamente. Não obstante ele sair pela boca acabei entrando na favela e rumando em direção à associação, onde conversei com o presidente do local, emendando meu pedido de emprego... e da passagem de ?ônibus. Quando saí de lá – com a grana no bolso – o olheiro não estava mais lá. Não desci em disparada, desci calmamente, meio que olhando para trás... e chegando numa via distante da comunidade respirei fundo, seguro.

Um dos momentos em que meu cu mais piscou, em toda a minha vida. Hoje eu não corro mais estes riscos. São Paulo também comporta favelas, algumas do tamanho da Rocinha – a maior da América Latina – , mas claro que não vou entrar nelas nem se eu me convertesse em mendigo. Se eu morresse no Guarabu não teria chances de conhecer uma gordinha pela internerd e namorado por mais de 4 meses. Mesmo se a gordinha em questão tivesse uma filha de outro casamento, e esta filha, tão linda, se afeiçoasse a mim de tal forma que me chamaria de “pai”. Como todo bom masoquista, gosto de relembrar estes momentos bons e ruins, e me penitenciar por uma série de coisas: me penitenciar por não ter investido naquele relacionamento amoroso, por não expor minha vida de forma tão fácil e patética, por não me desdobrar para estudar e trabalhar, mesmo se o emprego for tão puxado que arrancaria meu couro. O meu couro já está ferrado mesmo. Mas, se eu consegui passar dos 25 anos sem beber, sem usar drogas e sem cometer crimes... tá beleza.

Antigamente eu era acometido por uma doença estranha, a Síndrome do Migrante, que constitui no maluco que odeia as péssimas condições – em todos os sentidos – de sua cidade natal e quer rumar para outra, seduzido por uma oportunidade de emprego, por novos amigos, por uma futura boa posição social. A doença é contagiosa, pode pegar qualquer um. Mas, em tempos passados minha mente era tão falha que sempre dava o braço a torcer e retornava para o Rio. Chegando no Cais do Porto dizia: “de volta ao inferno”, seguido pela dor de barriga que logo depois tomava conta do meu corpo todo. Eu não gostava do Rio. Eu nunca gostei verdadeiramente do Rio. A verdade é que essa cidade só presta para turistas. Turistas e pobretões anestesiados, os que sonham com a Copa do Mundo, Olimpíadas, os que sonharam com o Panamericano em 2007... o carioca médio não consegue pensar por si próprio, ele apenas sonha. Sonha e consome. Sonha, consome e fala merda. Sonha, consome, fala merda, pensa merda. E por aí vai. Não é à toa que alguns conseguem se livrar dessa maldita condição e maldizem os demais cariocas. É porque os demais cariocas nunca sairão deste estado. Essa catatonia intelectual, blá blá blá... não vou encher o saco de vocês com esse papinho. Estava na cara que eu não duraria 30 anos na capital federal. Estou falando do Rio, não de Brasília. Afinal, o que é Brasília? A cidade não caiu em desuso, não foi demolida? Isso já faz parte da porra do passado. Né?

Dessa vez não fui agraciado com uma presença feminina – não qualquer mulher, claro – nas poltronas próximas da minha, mas mesmo se tivesse em outro lugar não me deslocaria da minha poltrona até a dela. Sei lá, não gosto de incomodar os outros, quando percebo que estou enchendo o saco – seja numa batidinha do pé na cadeira alheia ou até mesmo quando tomo água em um bebedouro e tem alguém esperando – eu me recolho logo. Em contrapartida encheu o saco eu ter de aturar uma mulher de meia idade conversando com um idoso, mas ela conversava em outro idioma, um idioma que custei para identificar e acabei não identificando, de qualquer forma. Não era inglês, nem alemão e nem javanês. Para matar a charada verifiquei suas características físicas. Nada. Ela tanto podia ser uma sueca quanto uma brasileira. Morena gorda de olhos azuis e cabelos cacheados, pneuzinhos saindo da camisa... certamente era o idioma mais irritante que já ouvi, especialmente porque a mulher não falava, ela gritava, então me aborrecia ainda mais. Enquanto ela falava o receptor encarava tudo emitindo grunhidos monossilábicos, e eu rezando para que ele calasse a boca para ela calar também, mas não calava, com suas perguntas ele fomentava a discussão. Eu daria uma porrada nos dois, se fosse um sujeito mais puto com a vida. Terminei por despejar um “Shut up! Bitch!” e milésimos de segundo depois troquei de poltrona, fui mais para a frente. Conviver com os demais seres humanos sempre é complicado... imagine agora que meu projeto começou a andar, comecei a fazer sucesso, as pessoas vão passar a me observar com outros olhos. Agora, pelo menos uma ou duas pessoas irão gostar de mim e do meu trabalho. Eu tenho de me preparar para isso.

O ônibus já percorria a cidade de Guarulhos – pela rodovia Presidente Dutra – quando começou a chover. Já imaginava que iria cair um pé d'água destes, uma enorme nuvem cúmulo nimbus nos perseguia desde São José dos Campos. Sempre tive o desejo de voar sem a ajuda de mecanismo algum, cortar as nuvens principalmente nos dias de chuva, onde eu poderia chegar lá em cima e presenciar o céu azul, enquanto lá embaixo o mundo desabava de tanta água. Seria o maior triunfo. Mesmo dizendo que estaria à própria sorte e sozinho em São Paulo não ficaria assim por tanto tempo, antes de cair na estrada combinei uma coisa muito especial para mim. Me assustei com a quantidade de barracos e a extensão duma favela que situava-se nos dois lados da rodovia. Saí umas 4 vezes da poltrona para pegar água de um recipiente próximo ao banheiro do veículo, quanto mais nervoso, mais sede me dava. Quando andei até lá, preparei-me para dar uma bela olhada no rosto da estrangeira, mas ela já estava dormindo. Efetivamente calara a boca quando expus minha revolta. E o velho, olhando para a minha lata como se me quisesse puxar uma faca...

Observando direito minhas papeletas, eu tinha um local para ficar em São Paulo. Seria ridículo se os perseguidores – veja só, um perseguidor sendo perseguido – de plantão soubessem que estava passando por uma pindaíba, mesmo tendo realizado aquele projeto. Daí, provavelmente seria chamado para algum programa dominical, onde explorariam o meu problema financeiro até o osso. Claro que ganharia uma grana e outros benefícios com isso, mas me sentiria sujo por dentro. Não adianta, algumas pessoas que se vendem não se sentem tão em paz. Meu projeto vai me dar uma grana, isso acontecerá com naturalidade. Tem que acontecer. Gastei quase todas as minhas economias tentando fazer com que pelo menos 20% da população do Rio soubesse dele. Sabendo disto repassarão para as outras pessoas, daqui a pouco estarei famoso em níveis nacionais. E ficarei ainda mais famoso se eles souberem o meu outro projeto em São Paulo, e depois de eu terminar o ano de 2011 rico (ou algo próximo a isso) e mais rodado que puta o hype diminuirá, e minha fama também... até eu criar algo ainda mais estarrecedor.

Em meia hora chegamos ao terminal do Tietê. Não trouxe guarda chuva. Gente pra caramba. O motorista abriu o bagageiro e me ajudou a pegar minha mala vermelha com rodinhas. Dali eu tomaria um metrô até o bairro do Pari, mas como não existe uma linha que me deixe exatamente perto de onde ficarei teria de soltar na estação Armênia, a mais próxima, tão perto da rodoviária que eu nem precisaria gastar R$ 2,65, mas como estava chovendo às pencas...

Muita gente no interior do vagão. Fui empurrado sem dó por uns executivos, minha vontade maior era de pular no pescoço deles e rasgar à dentadas. É isso, me aborreço facilmente, mas também aborreço as pessoas... até hoje não consigo absorver direito estas pequenas adversidades. Quando aborreço os outros de forma até mais agressiva não penso no que eles sentem no momento. Não culpo eles por terem vontade de me matar algum dia. Toda essa gente em um vagão não é por causa da proximidade do Natal ou de algo parecido. São Paulo é assim mesmo. Não chega a ser assim no Rio. Tratei de rever algumas coisas: aqui tem 4 linhas de metrô e no Rio tem 2. 5 ou 6 linhas de trem, enquanto que no Rio tem 4, eu acho, e muito mais bagunçado. Lá somos subjugados por uma concessionária de merda, do tipo que vive fazendo jingles alegres e diálogos porcamente interpretados por não-atores. Em Sampa, mais seriedade, sem jingles e diálogos. Podia ser a cidade perfeita. Não é.

Eu estava bem cansado. Aturo uma viagem de 6 horas numa boa, mas não gosto das paradas, por mais curtas que sejam. Tipo, é como se parasse o andamento da máquina, e na verdade é isso mesmo. A gente fica acostumado com o andar da carruagem, e quando para é como se desligassem nossa mente. Geralmente quando para não saio da poltrona, nem mesmo quando estou com fome. Se for sede pego os copinhos de água e pronto. Também odeio os shoppings de beira de estrada, como o Graal. Mais ainda, odeio qualquer tipo de shopping. Em São Paulo é alta a quantidade de cinemas que não foram instalados em shoppings... bom, mais alta que no Rio, haha.

Lembro que, antes de eu sair do terminal rodoviário notei uma lan house encrustada lá no canto. Podia aproveitar para ver as novidades da internerd, o que escreveram para mim no Orkut, se os e-mails seriam algo diferente de spams e por aí vai, mas desanimei quando soube que apenas 1 hora de acesso custava R$ 7,00. Deixei para procurar uma lan house mais barata no bairro onde iria me instalar. Certamente que encontraria. Não que os meus contatos de MSN prestassem para alguma coisa, imagine você estar em frente ao computador pela tarde inteira e o máximo de contatos que estariam online ao mesmo tempo seriam 5. 5 pessoas. Mesmo cumprindo aquele projeto independente no Rio de Janeiro minha lista de contato não aumentou. Não vou dizer que não imaginava que não aumentaria, pois imaginava sim, como qualquer outra pessoa. Arrumar amigos estava no meu plano de mudança, como vocês já sabem. E eu ali, sendo imprensado no metrô por algumas pessoas, de todos os tipos e tamanhos. Eu já estava enjoado de observar o rosto dos orientais, passei a olhar para o teto. Tinha o endereço escrito no papel, este estava enfurnado no meu bolso de trás. Passei por enorme alívio quando saí do vagão na estação Armênia. Meu corpo pedia um descanso já.

“Sabe onde fica a rua Pedro Vicente?”, perguntei ao taxista, à frente da estação. “É essa aqui, mas você tem o número?”. Claro que tenho o número. Mostrei para ele, e ele acabou estendendo a mão direita para o fundo da rua, onde fazia o cruzamento para a Avenida Cruzeiro do Sul, que saída do Centro da cidade e percorria a Zona Norte. Chovia demais, meus sapatos furados acumulavam ainda mais água, água essa que caía de minhas sobrancelhas. Vendiam guarda chuvas a R$ 5,00, comprei e me mandei, pisando nas enormes poças que se formavam na calçada.

Saíram os descendentes de japoneses, entravam os imigrantes bolivianos e peruanos. Eu nunca consegui distinguir um do outro. Baixinhos, com aquele rosto de pizza. São fisicamente mais semelhantes uns aos outros que os orientais. Pelo jeito, sempre andam em grupos, certo? Atravessei a Cruzeiro do Sul e prossegui do outro lado da Pedro Vicente, onde passei por uma drogaria, uma pequena fábrica de embalagens e uns bares. Estava se aproximando do local onde passaria o resto dos meses. 500, 530, 550... cheguei.

Era um conjunto residencial verde, com mais de 10 andares, situado atrás de um posto de saúde. Já não era mais na Pedro Vicente, mas sim em um cruzamento que dava nesta mesma rua. O ambiente meio sujo já revelava o que eu podia esperar daquele local, de seu interior, talvez fosse ainda pior que a casca. Notei algumas crianças correndo e gargalhando do meu lado, saíam de fora e subiam as escadas lá dentro. À minha frente, uma guarita com vidro rachado. Um homem de bigode se entretivera com uma revista de palavras cruzadas. Parou a caneta quando viu meu semblante encharcado. Antes que dissesse alguma coisa, falei: “Eu sou o Gil, tinha combinado de que pagaria um apartamento aqui, o 501, liguei pra vocês antes de sair da minha cidade pra cá”. “Ah, peraí”, disse o homem, que verificou meu nome em um caderno preto. Percebi a expressão dele mudar da dúvida para o descanso, ou algo assim. “Bem vindo, cara. Você é o carioca, né?”. Não respondi nada porque alguns caras em São Paulo gostam de chamar o carioca de “carioca” invés do seu nome. Mas, eles sabiam que eu era carioca, então, mais cedo ou mais tarde teria que bater de frente com isso, certo?

Veio me encher de perguntas engraçadinhas, dizendo que eu tinha saído fora do Rio de Janeiro por conta da guerra que está acontecendo lá, entre outras coisas. Não dei bola, quando soube que estava sendo descartado o homem da guarita me deixou de lado, me deixou subir a escada em paz. E foi uma subida demorada o suficiente para vasculhar a vizinhança com meus grandes olhos. Gente botando o papo para o ar, crianças bonitinhas brincando e correndo por aí, rap tocando... depois teria que dar um giro pelo bairro, precisava de qualquer jeito. Mas, não naquela hora. Precisava era dormir.

Cheguei na porta do quarto. Peguei minha chave amarela e pus na fechadura. Ouvi ruídos... parecia que tinha alguém lá dentro, algum gato ou até mesmo uma pessoa. Senti desejo em descer as escadas e comunicar ao guarda, mas não queria depender dele, não naquele momento. A porta já estava aberta. Foi tentar abri-la e levei uma porrada da porta, já que deram uma porrada nela, então eu levei uma porrada dela, entendeu? Quase caí, bufei aborrecido, quando um homem de meia idade saiu dizendo desculpas. “Desculpa aí, mano, você é o Gil?”. Assenti com a cabeça. Quis tocar meu braço para alçar meu corpo, mas não deixei. “Nós acabamos de arrumar sua cama, pode ver, vem aqui ver”. Acariciei a testa enquanto entrava no quarto. Aliás, como eu imaginava. Quarto, cozinha e banheiro. Um pequenino corredor e chegávamos à cama e ao criado mudo. “As roupas de cama tão aqui, quer que eu arrume pro senhor?”, perguntou. Respondi que não. Mais uns minutinhos depois arrumei tudo e ele acabou vazando do quarto, finalmente me deixando em paz, sozinho do jeito que eu queria. Aproveitei para desabar na cama como uma bigorna, mas ainda não totalmente tranquilo. Virei meu rosto, respirei fundo. Tinha uma pequena janela, dava para ver a rua sem prédios tamparem tudo. Tirei meus sapatos, minhas meias e vasculhei o local. Estava tudo razoavelmente limpo, depois disso voltei a me deitar. Era um maldito cubículo, mas como só eu usaria aquele lugar tava tranquilo. Se eu tiver que levar uma menina pra cá, seria ainda mais difícil ela não achar que não passo de um pobre de merda. Mas, faz parte, eu iria casar com alguém. “Ah, mas até para namorar, a primeira impressão acaba prejudicando tudo”. É, concordo contigo, mas eu não teria o menor saco para pagar um hotel, até porque, eu não ficaria o dia inteiro desfrutando daqueles prazeres. Teria de gostar de mim do jeito que estou, mesmo na merda. Eu já estava marcado para enriquecer mesmo...

Tive medo de cair no sono, pois talvez acordasse só de madrugada ou até mesmo no dia seguinte. Ainda tinha coisas para fazer naquele dia. Levantei-me e fui dar uma olhada clínica no banheiro. Levantei a tampa do vaso e me espantei com o tamanho do “submarino” que boiava ali. Dei 3 descargas para ele afundar e sumir. Queria rir, mas não conseguia. Minhas costas doíam, então eu queria sair, mas lutava contra a dor, que me queria deitado na cama e descansando numa boa.

Mas uma parte de meu corpo não queria dormir agora. Sentei na cama e tirei o laptop. Precisava me atualizar quanto ao andamento do meu plano.

Nenhum contato no MSN além dos Grupos. Ah, sim, um amigo que só sabe receber minhas reclamações sobre a vida... quando tenho que desabar, é ele com quem converso... mas seus conselhos são muito falhos, ora são coisas impossíveis de ser feitas por um ser humano normal – nesse caso, nem ele faria tais coisas, caso estivesse no meu lugar – , ora são coisas ridiculamente simples. Nunca me senti satisfeito com seus conselhos. Já deveria tê-lo bloqueado há muito tempo. Acabei não fazendo nada. Passei minhas preocupações para o meu outro email. Dessa vez pipocaram emails sobre o meu próximo projeto. Produtores me assediando... uma diretora que iniciou a “Retomada” do cinema nacional – a partir da primeira metade da década de 90 – e descoladinhos. Como meus dedos coçavam, resolvi respondê-los todos de uma vez. Depois fechei o laptop, guardei dentro de minha mochila e deixei dentro de uma gaveta empoeirada. Precisava sair para encontrar uma pessoa hoje.

Me certifiquei de que o quarto estava bem trancado. Depois disso passei pelo corredor, e fui olhado e comentado por algumas mulheres, uma buchudinha de cabelos desgrenhados e uma magrela morena de cabelos lisos, maior que eu. Levava comigo uma pequena pasta vermelha. Ainda chovia. Até pensei em esperar a chuva, mas tinha a maior cara de que não terminaria hoje, logo, tratei de descer as escadas e saí do prédio correndo, em direção a um abrigo. Chovia mais que antes. Cheguei a um orelhão, mas não tinha cartão. Fui até uma banca e perguntei quanto custava um de 30 unidades. “R$ 5,00”. Paguei resmungando. Depois disso, fiz a ligação.

- Alô – respondeu a pessoa do outro lado. Uma voz feminina, exageradamente suave. - Quem fala?
- É o Gil – disse a ela, tenso. - Já cheguei a São Paulo. Como você está, faz dias que não nos falamos.
- Você... você realmente veio pra cá – balbuciou a menina. Me deixou apreensivo. - Que coisa...
- Como assim “você realmente veio”? - perguntei. - A gente tinha combinado que nos encontraríamos hoje.
- Tá, eu lembro disso, não vou faltar com a promessa. Está em qual lugar?
- Tinha dito a você que ficaria uns tempos no Pari, é perto da Luz, acho. Você me disse que mora na Luz.
- Na verdade, eu moro na Barra Funda, que é um pouquinho depois, indo pra Osasco – acertou a guria. - Pretende ficar quanto tempo aqui?
- Até conseguir realizar um projeto, também é um dos motivos que me fez vir pra cá. Logo depois volto pro Rio. Tem como me ver hoje ou amanhã?
- Ah, amanhã a gente pode se ver. Hoje é sábado, né? Você me pegou justamente na hora em que o expediente termina.
- Não sabia que você tava trabalhando...
- Sem problemas, pode me ligar sempre que quiser – disse ela, rindo logo após. Eu sabia que as coisas não seriam tão fáceis assim. Se eu ligasse para ela em outra ocasião em que tivesse ocupada, reclamaria. - Já tem lugar pra ficar?
- Eu te disse que já tinha alugado um quarto pela internerd... aliás, seria mais fácil se eu alugasse uma casa. O pouco tempo que estou naquela cohab foi o bastante para me irritar. Amanhã a gente se encontra, então? Pode ser pela manhã?
- Ah, acho que vou fazer uma coisinha de manhã...
- Vai trabalhar no domingo também? Tá, pode ser à tarde. 13:00 tá bom pra você? Na entrada da estação de trem da Barra Funda?
- Tá bom, pode ser! - bradou a menina, como se chegasse ao ápice da felicidade. - Estarei de vestido curto verde e azul florido. E você?
- Hum... camisa branca, calça jeans e blazer preto... olha, as unidades do meu cartão estão acaban...
- Peraí, que minha chefe tá me chamando, te ligo depois, tchau – disse, desligando o celular na minha cara.

Não sei se rio ou se choro com o fato de ter botado essa menina na minha vida. Digo, é uma das tentativas. Mais uma dentre a porrada de garotas que eu tento algo mais além da amizade descartável, mas não tento pegar estas garotas sem motivo. Esta retardadinha me surpreendeu em uma coisa. Uma foto que me fez balançar as cadeiras, mas para qualquer pessoa não significaria nada, até porque a guria é magrinha, logo, para muitos não teria o menor resquício de sensualidade. Acontece que eu não sou esse “muitos”, mas não estou andando contra a maré por andar. Eu realmente fiquei atraído por ela. Aspirante a atriz, fez algumas peças e tal... com certeza vai me fazer um pedido bem previsível, mas quero ouvir de sua boquinha. Digo, bocão, ela tem uma boca grande. E olhos grandes. Acho que nunca teve namorado, e se teve durou muito pouco tempo. Mas eu estarei aí para quebrar esse tabu. Disse a vocês que gosto de verdade da garota?

Depois disso não tinha mais nada para fazer. Vasculharia o bairro naturalmente, mas não seria naquele dia. Meu cansaço aumentou ainda mais e eu precisava deitar numa boa cama, ouvir alguma estação de rádio AM – santo laptop! - e pensar na melhor maneira de chegar na OUTRA pessoa. Afinal, estar perto dela faz parte do meu outro projeto. Tinha o suposto endereço da pessoa, mas hoje não podia fazer mais nada. Nem sabia se ela já gozava de sua própria liberdade, não lembrava o dia, entretanto, não custava nada dar uma olhada no endereço no dia seguinte. Voltei para a cohab, cumprimentei o mesmo guarda que queria me tirar um sarro esperando que ele fizesse isso, mas não fez. Ufa.

Marcamos o encontro amanhã (domingo). Como certamente nos despediremos lá para as 19:00 ou menos poderei ir à “conferência” da Sasha Green sem problemas. Huehe.

Mas... não pude dormir, já que me mandaram um e-mail assim, de última hora, o laptop estava aberto, ligado, e eu certamente o deixaria assim. Era um e-mail de um colega de MSN, que vi pessoalmente só uma vez na vida, um sujeito garboso, elegante e bem mais educado que eu. Como se trata de uma pessoa especial – não no sentido de “retardado” - resolvi dar uma chance a ele no meu momento de descanso.

“Oi, Gil, tudo bem. Cara, já conseguiu chegar em São Paulo? Devia ter me dado uma ligada, pois estou preocupado contigo de antemão, rs. Sempre falou mal de Sampa e tudo mais... espero que, logo quando chegar me dê uma ligada, sabe que minha casa fica em Guarulhos, vamos fazer alguma coisa juntos, sim? Abraços”.

Ah, tenho inveja do sujeito por ser tão agradável assim, por outro lado se fosse tão bacana quanto ele as oportunidades para qualquer um se aproveitar de mim seriam grandes. De súbito, pintou uma vontade imensa de sair para ligar pro sujeito, quem sabe visitá-lo ainda hoje, mas estava chovendo demais, a filha da puta da chuva – era certo de que não cessaria hoje – toparia comigo de qualquer forma, mas não era hora para dar uma de covarde. Saí do quarto, da cohab e fui ao orelhão novamente. Liguei pro cara, como era para telefone fixo custou um pouquinho para dar adeus às minhas unidades. “Oi, Gil, tudo bem com você?”

- Mais ou menos, mas cheguei a Sampa sem problemas – respondi a ele. Estava esperando ele perguntar o porque de eu estar mais ou menos. - Então, tem como eu aparecer aí hoje ou na segunda?
- Claro, pode aparecer aqui hoje, se quiser. Sabe como chegar a Guarulhos, lembra do meu endereço?
- Do endereço eu lembro, só não sei como chegar.
- Simples, onde você está?
- No bairro do Pari. O nome da rua é Pedro Vicente.
- Está conseguindo ver uma estação de metrô?
- Não, moro um pouco do começo da rua, mais lembro que peguei o metrô antes de vir pra cá. Metrô Armênia.
- Isso, perto dele tem o ônibus da linha Cocaia, da EMTU. Pergunta pro motorista pra deixar perto da minha rua, certo?
- Certo, não tem metrô praí, né?
- Não, infelizmente.

Então, tive de desligar para enfrentar a pequena jornada. Rumei até a estação de metrô do Armênia e procurei o ponto final do ônibus da linha Cocaia. Eu esquecia o fato do tal Cocaia era em Guarulhos. Perguntei para um taxista – que esperava passageiros em seu ponto bem próximo da entrada da estação – e ele me indicou. “É, é ali mesmo”. 20 minutos depois o ônibus chegou, então disse ao motorista para me deixar próximo ao endereço onde eu queria. Ele passou para o cobrador e este respondeu: “Tranquilo”. Esperava que fosse tranquilo mesmo.

Eu já estava entediado, antes mesmo da condução chegar na rodovia Presidente Dutra e entrar em Guarulhos. De entediado passei para aborrecido, pois enfrentamos um engarrafamento assim que deixamos a área do terminal do Tietê, digo, do Shopping D – o terminal ficava do outro lado da marginal. Não tinha em mãos um jornal, revista ou qualquer coisa que pudesse ser lida. Nem a bula do meu remédio estava à minha disposição, então teria de me acostumar – em definitivo – com viagens em que sua única opção seria acompanhar a paisagem com os olhos e então, tentar se hipnotizar. Eu queria mergulhar na marginal, mas não naquele momento. De tanto olhar para aquela enorme vala a céu aberto decidi que ficaria ainda mais famoso se tomasse um banho daquela água, qualquer outro dia em que eu estivesse casadinho com a minha loucura. Imaginem, “conhecido diretor de cinema indie faz o que ser humano algum – em sã consciência – fez: mergulhou e nadou no rio Tietê!”. Já podia me preparar para ser observado por uma porrada de pessoas, que sim, aí sim prestariam atenção na minha trajetória. Normalmente já gozo de certa fama, se eu mergulhasse nessa podridão que é o Tietê – pelo menos nesta parte dele, já que sua nascente é limpa – estaria na cabeça das pessoas. Mas eu estarei nelas de qualquer forma quando souberem do meu outro projeto, não? Eu estaria feito... de qualquer jeito!

Chegamos à Guarulhos. Me surpreendi por não ser uma cidade tão favelada, pelo menos no que corresponde ao Centro. Tudo arrumadinho. Fiquei seduzido por um fliperama que vi de relance. Certo que depois passaria por lá. Poucos minutos depois fui chamado pelo cobrador, que me indicou a rua e eu deveria soltar no próximo ponto, em frente a um banco.

Saindo do ônibus fui logo apunhalado pela chuva forte. Já sabia que aconteceria isso, claro. Só não sabia que seria puxado pelas costas por alguém. Logo, fiz a pior cara possível e quando me virei dei de cara com quem? “Achou que eu iria deixar você se virar sozinho?”, perguntou o Giovanni.

- Cara, não me dá mais esse susto de novo, porra – reclamei a ele, mas esboçando um sorriso meio sem jeito. - Achei que aqui era totalmente diferente, hein? Vamo sair daqui logo de uma vez!
- Calma, tem o tempo todo do mundo – disse ele, sorrindo. - Aliás, tem uma galerinha que quer te conhecer.

Ah, e qual novidade de alguém querer me conhecer? De 1 ano pra cá tá acontecendo direto, haha. Mas sou bem mais conhecido no circuito independente do Rio que de Sampa, entretanto, é questão de tempo deixar as coisas no mesmo nível. Como todo bom profissional, tava fazendo por onde... no momento, quando nós saímos debaixo do ponto de ônibus para seu apartamento – bem à frente da avenida que me esqueci o nome – saímos abraçados. Digo, ele me abraçava, o que dava imediatos maus pensamentos na cabeça alheia. Pior, ele estava com uma camisa de um lilás tão fino que parecia rosa. Cabelos negros ondulados e esvoaçantes, sorrisinho amarelo... pelo menos no sentido de “bem viver” ele era muito melhor que eu. Mais bonito também, por dentro e por fora. Eu ainda vivia me engasgando com minhas ambições e desejos. O sol costumava nascer pro lado dele, então...

Atravessamos a tal avenida e chegamos na porta de seu prédio. Não me molhei tanto, já que o maluco tinha um guarda chuva. “Esse momento me lembra 2004, quando você chegou aqui todo estropiado, sem um puto no bolso”, disse ele, sorrindo como um anjo. É, lembro bem daquele momento. Meu destino era incerto e tudo mais, saía do Rio com a quantia certa da passagem, mochila cheia e estômago vazio. Meio louco, não? Pelo menos até 2005 isso foi uma constante na minha vida, até eu me aprumar, só que não me acho tão vencedor assim.

Subimos até seu andar de elevador e ele voltou a falar.

- Tá tudo certinho com você?
- Não me trate como um deficiente, estou na boa – respondi. - Aliás, estarei ainda melhor quando concluir aquele projeto. Não o que você e o mundo sabem, mas o “outro”.
- Eu sei, vai conseguir concluir se ela te deixar vivo – disse ele, rindo. - Você é um cara jovem, só tem 27 anos, não arrume sarna pra se coçar. Tem certeza que não quer ficar só nos seus filmes?
- Você diz isso como se “meus filmes” fossem menos que nada, alguma brincadeira.
- Sabe que não disse isso, cara. Relaxa – disse ele. - Chegamos, faça uma cara bacana quando suas fãs te virem


O que significava “fazer uma cara bacana”? Logo, fui apresentado aos seus amigos, digo, suas amigas. Lá estava eu, à frente de 2 mulheres um tanto mais velhas que eu – deviam estar na casa dos 30 – e me cumprimentaram de forma bem feliz, beijando meu rosto, enquanto eu me desvencilhava, quis apenas apertar as mãos. Não é sempre que me mostro tão legal e receptivo com as mulheres, com o sexo oposto ou até mesmo com o mesmo sexo. Alguns momentos, súbita e inexplicavelmente sou muito arredio em relação ao meu trato com elas. Meu amigo já entendia, no entanto, estava curioso quanto ao meu modo de ser naquele dia. Os nomes dela eram Luana e Sarah, respectivamente loura um pouquinho acima do peso e morena magra. Vestiam-se muito bem, cabelos arrumados, mas pecaram pelo perfume doce carregado em seus corpos. Este tipo de perfume e merda, para mim eram a mesma coisa, mas tentei não surtar, já que estava na casa de um amigo querido. Fomos para a sala e nos sentamos.

- Foi muito bom você ter vindo hoje pra cá, como pedido de desculpas pela chuva, poderá dormir hoje, aqui – disse ele para mim, rindo. Eu estava sendo monitorado pelas duas mulheres, então, qualquer deslize em minhas expressões podia traumatizá-las por um bom tempo. - Pode dormir aqui sempre que quiser, sabe disso.
- É, eu sei – disse a ele, tentando disfarçar meu descontentamento. Não estava me sentindo à vontade ali. - Então, eu sei que vou ser o pivô dessa discussão, mas quero saber das duas moças...
- Ah, nós somos grandes fãs suas, digo, isso se não tiver uma fã ainda mais fervorosa que a gente – disse Luana, me fitando com seus olhos verdes e embaçados por seus próprios olhos oblíquos. Seu rosto era sardento, seus cabelos louros em rabo de cavalo e seu sorriso era largo. Seu sorriso parecia falso.
- Não sei, tenho poucos fãs, se bem que as coisas vão mudar de uns meses em diante... - disse a ela, sem olhar seus rostos por muito tempo.
- É, estamos sabendo que seu filme ainda não rodou por aqui, mas fomos no Festival do Rio desse ano, vimos e, como você sabe... amamos! - disse a loura, abrindo ainda mais seu sorriso. Agora que eu percebi, ela era vesga. - Já está resolvendo tudo quanto à distribuição aqui em São Paulo?
- Sim, andei conversando com a distribuidora, a mesma que passou o filme nas salas do Rio – respondi para ela. - Com calma as coisas vão se ajeitar.
- Espero que consiga, pois o Brasil precisa saber. Aliás, é um tema tão nacional que fico surpresa pelo povo inteiro não ficar sabendo – disse a morena, de belas pernas cruzadas. Esta tinha os cabelos extremamente curtos e soltos, vestido negro brilhoso e salto agulha, dando um banho de charme na lourinha, que trajava saia jeans e regata branca. Que clichê... - Se quiser, posso te ajudar nisso. Tenho um contato com um líder de uma grande distribuidora de filmes...
- Não se preocupa, eu posso resolver isso...
- Gil, nós estamos querendo te ajudar, não fique acanhado – interrompeu meu amigo, bem relaxado. - Fazendo minhas as palavras da Sarah, também fico surpreso pelo fato de até agora a película não ser conhecida pela maioria.
- Ué, não seria um complô natural? - indaguei. - E seria naturalíssimo, já que a maioria das pessoas são favoráveis ao meu objeto de critica.
- Tem isso também, mas só por aquela pessoa ser seu objeto de crítica deveria desde já tornar as pessoas curiosas e ávidas para ver seu filme – disse Sarah. - Fez um sucesso tremendo lá entre os indies cariocas, mas em São Paulo é onde se concentra a maior parcela independente do Brasil. Então, eu posso te ajudar.
- Gente, vou ver se os drinques já estão prontos, e o frango também – disse meu amigo, ao levantar-se.
- Aceite, já sabíamos que você seria meio arredio, cara – disse Luana. - E então, já deu um giro por São Paulo?
- Cheguei hoje, mas minha intenção é dar um giro, sim, não agora, pois estou realizando uma coisa importante, por isso uma coisa de cada vez – respondi a ela. - E vocês... estes sotaques não me são estranhos...
- Ah, eu sou de Volta Redonda, interior do Rio, e a Sarah também – disse a loura. - Estamos aqui apenas para lançar a filial da nossa lojinha no Brás. Sabe onde fica, né?
- O Brás?
- Sim.
- Sei – respondi. - Desculpem perguntar assim logo cedo, mas...
- Não somos lésbicas – respondeu Sarah, rindo. A guria era pálida como leite, seu cabelo curto tinha o corte da moda... dos anos 20. Saca os bonequinhos Playmobil? Então, era aquilo. Olhos azuis e parecia mais alta que eu. Por enquanto estava sentada, imagine quando levantar... - Aliás, uma coisinha que queria perguntar: por que os homens, ou pelo menos sua maioria, sentem o maior tesão por mulheres se pegando?
- Sinceramente eu não sei – respondi, sincero mesmo. - Devo ser um dos poucos que não tá nem aí pra isso, não sinto nada. Do contrário... sinto repulsa.
- Nossa, você é singular mesmo – disse Luana. - O que costuma fazer pra se divertir?
- Ah, eu ia ao cinema, – respondi – mas como é um programa que só funciona indo junto com alguém parei. Hoje em dia perco muito tempo acessando a internerd. Tempo até demais, e muitas vezes é inútil. Baixo filmes, alguns gibis traduzidos (já que meu inglês é uma merda) e por aí vai...
- Ah, mas você precisa sair mais, pode conhecer uma pessoa interessante... - disse Sarah. - Sempre tem alguém...
- Eu sei o que você vai falar, sem querer ser grosso, mas ouvir só esse tipo de coisa cansa. Peraí – disparei para elas, antes de levantar e rumar em direção à cozinha. Pude perceber os olhares frustrados das duas. Quando vi meu amigo, este terminava de preparar algo que parecia um vinho com rum, com suco de fruta, algo que mais tarde eu iria botar para dentro do estômago. - Agora, elas estão vomitando clichês.
- Cara, volta lá, você tem que se soltar mais um pouquinho – disse ele. - Não seja rude com as meninas.
- Se soltar mais um pouquinho? - indaguei. - Por isso que tá querendo embebedar a gente?
- Ué, é normalíssimo que em uma celebração a gente beba, ou até mesmo quando não tá celebração – explicou ele. - Vou dizer pela enésima vez: relaxa. Aposto que elas estão dando o possível pra serem gentis com você. Aproveita e leva um pouco dessa biritinha para elas, tá?
- “Biritinha”, cacete – resmunguei para mim mesmo, antes de pegar a garrafa de cachaça com limão e os três copos. Ele estava certo, eu tinha de ser um pouco mais apresentável para as gurias, sem contar que por conta do meu jeito muitas portas foram fechadas. Então, duvido que elas se arrependeriam se me rejeitassem. Cheguei lá e Sarah estava sentada, enquanto Luana estava em pé, observando a paisagem cinzenta pelas persianas. Tinha uma bunda redondinha e bem apetitosa. Já seus pneuzinhos pouco me incomodavam. - Aqui, peguem os copos.
- Não fica zangado com a gente, amor – disse Sarah, pegando seu copo e voltando a sorrir abertamente para mim. - Sempre faz essa cara de zangado?
- Só quando eu respiro – respondo a ela, quebrando um pouco o gelo. - Eu estou meio cansado, vocês se importam se seguir o dia sem mim?
- Ah, não faz isso com a gente, estamos muito bem aqui contigo – insistiu Sarah, tomando minha mão. A sua mão era bem leve e macia, eu podia ficar o dia inteiro tocando o corpo dela que não me enjoaria. Me dava vontade de mordê-la, de comê-la literalmente. Claro que não deixaria. - Vem pra cá, fica com a gente.
- Se estivéssemos sozinhos eu gostaria – disparei para ela. Logo, Luana virou o rosto para nós.
- Se o problema é esse, pode deixar, vou dar uma saidinha e depois eu volto... - disse ela, retirando-se delicadamente da sala. Disse para ela permanecer ali, quem sairia seria eu. Retornei à cozinha, Giovanni estava apagando o forno, agachado e cantarolando uma música que provavelmente não era de nossa língua.
- Tô saindo fora, desculpa qualquer coisa – disse a ele, e saí em disparada antes que ele pudesse virar totalmente o rosto para mim. - Semana que vem a gente combina alguma coisa melhor – emendei, fechando a porta principal de seu apartamento logo em seguida. Me senti melhor retirando o peso das costas.

O fato era que eu já estava começando a ficar fulo convivendo com aquelas garotas. Atraentes, sem dúvida, mas não me agradaram. Não que tivessem esse objetivo ou que fossem obrigadas a isto, mas não me aguentei, tive de sair fora, meu amigo que me desculpe, desculpe por fazer esta desfeita – até ligarei para ele depois - , mas não aguentei, mais um pouco enlouqueceria ali. Deu pra vocês perceberem como meu corpo e mente esquentam perante certas mulheres. Está mais do que certo: futuramente iria me arrepender por aquele ato. Não me senti intimidado, não estava com medo, a presença delas apenas chegou ao ponto de me incomodar, me aborrecer, e seus papos também. Depois dessa ele não me arranjará mais encontros com qualquer garota, porque o temor de passar um segundo vexame estará presente. Não que eu não estivesse pronto para zoar com duas gostosas ao mesmo tempo, mas simplesmente não era do jeito que eu estava acostumado. No momento em que saí daquele apartamento, decidi que não devia mais perder tempo com mulher alguma, fora as que eu me interessar e as que correspondem o meu tipo preferido, ou algo mais próximo disso. Já perdi tempo demais na minha vida, nessa porra.

Chovia ainda mais, o que atiçou meu arrependimento. Queria voltar, sei que não seria crucificado por eles por causa de tudo o que ocorreu – até porque o sujeito ativo naquele bolo todo era eu, ué – , mas fui orgulhoso e prossegui com meu caminho.

- Não faz isso, volte aqui – disse ele, do outro lado da calçada. Eu já estava me encaminhando ao ponto de ônibus. Disse mais umas 3 vezes, mas não ouvi, estava entretido demais tentando fugir da chuva forte. Poucos minutos depois o cara me aparece no ponto de ônibus, entoando meu nome de uma forma bem afeminada, chamando a atenção dos outros. Conseguia me deixar desconcertado, em alguns momentos, mas como eu não tinha para onde fugir, me rendi. – Não fique fugindo dos outros o tempo todo, isso só está fazendo mal a você mesmo, sabia?
- Que tal você dizer o que eu não sei? – indaguei a ele. – Não vou poder voltar pra lá nem pintado de ouro, impossível, eu não me dei bem com as garotas... mesmo se elas estejam realmente dispostas a me injetar uma grana.
- Eu queria que ao menos você tentasse. Vive fugindo dos outros, depois reclama que não consegue patrocínios, que não consegue bons amigos... há muito tempo sofre desse jeito, vamos dar uma chance...
- Me desculpa, não dá, não. Quero voltar pra casa agora – disse ele. – A gente tenta outro dia, valeu?
- Se você está agindo desse jeito imagine quando se deparar com a Sasha Green? – disse o Giovanni.
- Tá certo que é mulher, mas é uma mulher diferente, então não tem nem como comparar. E já faz um tempo que eu ando sabendo das coisas da Sasha, ela é acostumada a lidar com todo tipo de público, então eu me sentiria mais disposto a me relacionar com elas, mas com essas duas não rola.
- Não vai querer nem provar o meu frango?

Ele já sabia que tinha sido vencido pela minha teimosia. Não dava mais para ficar insistindo na mesma ladainha e eu também já estava me enchendo daquela chuva do cacete. O interior dos meus tênis estavam encharcados, andei tanto por aí dessa forma que peguei uma ferida no dedão do pé direito. Não tá ruim a ponto de mancar, mas incomoda com suas ardências. Falei disso sobre ele, acrescentando mais um motivo para voltar pra casa e dormir quentinho.

- Pelo menos, posso te levar ao ponto certo?

Ah, como inteligente que sou, estava no mesmo ponto onde tinha desembarcado da porra da condução. Isso que dá ficar perturbado com mulheres, haha. Brincadeira, não sou o tipo que se assusta com uma buceta, mas me assusto com pessoas chatas, e mulheres conseguem ser mais eficientes nesse quesito que os homens.

Mulheres descoladinhas. Ainda não consegui deixar de ter nojo disso. Mas foi o que eu disse, se tornará uma constante cada vez mais em que meus trabalhos se entranhem na cabeça da galera, cada vez mais que meu nome penetrará na mente dessas pessoas, algo muito natural. Enfim, não quero ficar ditando a mesma ladainha sempre, sei que isso pode encher o saco gradativamente. E eu já sou um chato de galocha, seria péssimo ser marcado por isso. Péssimo para os negócios.

Eu já estava bastante estafado de tudo isso. Queria correr para a casa, chegar na cama e dormir, sem ouvir qualquer tipo de música, seja um funk antigo – do começo dos anos 90, em que eles enfocavam mais as causas sociais que a putaria – ou uma ária da Cecilia Bartoli, eu não estava para ninguém, pelo menos até o dia seguinte, onde me entregaria de corpo e alma para o corpo da Sasha Green. Como se isso fosse tornar-se real. A quantidade de cuecas que babam para ela é imensa. Eu sou só um grão de areia na praia, mas ao contrário deles não coloco o sexo em primeiro plano. É essencial, faz parte, mas não sou tão fissurado a ponto de ser um pervertido. Bato umas punhetinhas aqui e ali – isto também é essencial para qualquer homem, aliás, creio eu que as mulheres se masturbam pouco – , mas nada digno de nota. Qual foi a última vez em que tive um orgasmo maravilhoso? Depois que eu vi o vídeo com o singelo nome de “Garganta Profunda”, protagonizado por uma guria emo meio gordinha e dois viados, de livre sotaque gaúcho. Não, não me masturbei pensando nos viados, mas sim na garota, que simulou um boquete chupando o dedo de um deles e depois, após muito papo dos dois moleques, mostrou o peito, salvando o dia. Até hoje me excito com isso, não adianta. O vídeo tava na minha conta antiga do Youtube – eu nunca consegui postar vídeo algum, especialmente no maldito dia em que eles solicitavam número de celular para abrir a conta – , onde eu postava como GardeniaKlaha (tinha o GardeniaMana, que era uma guria espanhola fã do pavoroso filme “Van Helsing”, com o Hugh Jackman, fã do Wonka do Tim Burton e de anime). Faz uns 2 ou 3 anos que larguei aquela fase, onde eu era um pouco mais feliz que hoje. Digo, foi o contrário, eu era tão falho que dava pena. Eu nunca fui feliz, para falar a verdade. Ainda falta muito para eu “colher os louros”. Veja como sou um moleque exigente.

Desci na estação Armênia e fiz o mesmo trajeto para voltar à casa, correndo – literalmente – a Pedro Vicente e cortando – não literalmente – a Cruzeiro do Sul, antes de andar mais alguns metrinhos e chegar no aconchego do lar. Qual é, que aconchego o que... já disse que a cohab era suja, já? Mas o interior do meu apartamento era mais o menos. Nem me preocupei com isso quando entrei, trazendo em mãos uma caixa de caquis e 2 litros de suco de laranja, deixei-os em cima do criado-mudo e desabei na cama, após tirar a roupa molhada, enxugar e botar estendido no chão, para o ventilador pegar. Eu estava na boa.

Mesmo assim fui perturbado por uns pensamentos bobos, mas terríveis. A mulher do “Acessa São Paulo” dizendo “eu sou descendente de alemães e poloneses” com o maior orgulho do mundo, ininterrupta, por exemplo. Não obstante era uma gordinha bem gostosa. Estou olhando para ela agora, nesse momento. Mentira. Logo depois caí na consciência e me arrependi de ter saído da casa do Giovanni. Com certeza ele deve ter ficado sentido com minha desfeita. Pensei logo em sair do quarto e ligar para ele, mas chovia forte o suficiente para me manter dentro de casa. Rapidamente a preocupação foi para o ralo quando me levantei, embebido de tesão. Fui ao banheiro descascar a banana. Enquanto me masturbava pensei na tal atendente gordinha e seus seios grandes batendo enquanto levava atrás , depois passei por Luana de pernas abertas enquanto eu a chupava e terminei com Sarah de pernas abertas e deitada no chão enquanto eu metia. Ela suava como um pouco, tanto que o suor injetou cor à sua pele pálida como o cal. Quando voltei à gordinha, gozei. Dei descarga, pus papel higiênico no meu pênis e deixei ali – a cueca segurava – e deitei, mais cansado ainda.

Meu sábado ainda não tinha terminado. Eu estava com fome... engraçado que na casa do Giovanni fiz um doce tremendo para comer. Eu só tinha frutas e mais umas coisinhas para colocar no estômago, o que podia fazer além de sair para fora e comer direito? Eu não tinha escolha. Foi o que fiz.

Cheguei numa lanchonete enxugando as roupas. Eles serviam sanduíche de peru por R$4,00, suco à R$1,50, mas meu bucho suportaria um bom prato de comida. Meu dinheiro dava para custear um rango destes. Ah, eu esqueci de pedir dinheiro ao Giovanni, depois eu teria de ligar para ele. Comprei um prato feito à R$7,00 e ficou por isso mesmo, eu ingerindo uma refeição com ovos e salada de alface além de guaraná natural, em um pé sujo padrão, sotaque nordestino – nada contra, acho bem melhor que sotaque de paulistano e boliviano – e empregadas com ombro de Schwarzenegger e sem bunda. Enquanto comia calhou que eu pensar em trabalhar, mas trabalhar de verdade, não com a baba que ando executando nestes últimos tempos. Combinei comigo mesmo que segunda-feira eu passaria em uma agência de emprego, tinha a certeza de que isto não prejudicaria o andamento das coisas. A coletiva com a Sasha Green era no dia seguinte, domingão boladão, sem problemas. Fora isso, tinha o encontro com a guria que eu gostava no mesmo dia. Eu fiquei surpreso por ela não enfiar um “tipo” em seu vocabulário, como todo jovem de merda. Já perdi um tempo extenso com esse tipo de gente – não como no tipo dela, mas de outros jovens – que não estava no gibi. Lembro que minhas tentativas desesperadas em estabelecer uma relação bacana com eles caíram por terra a partir da explosão de minha paciência, óbvio. Muita merda falada, se eu morasse com eles não aguentaria, então eu sairia fora de qualquer forma. Dignos de pena, como quase todo adolescente e jovem adulto. Eu recortava o ovo frito com a borda do garfo e pensava nos momentos maravilhosos que passara com esta espécie de ser humano.

Eu sempre tentava encurralar os coitados nas discussões, deixava-os sem argumentos, pois eles sempre defendiam o que podia ser facilmente arrebentado. Meninos geralmente eram uns bostas, eu sempre tentava chegar nas mulheres, mas elas conseguiam ser pior com suas crises emocionais – ou até mesmo quando não tinha crise alguma. Dos meninos fãs de rock japonês, pelo menos 80% tinham alguma inclinação homossexual, 100% inclinação otaku – os fãs descerebrados de animes – e as meninas se entregavam à otaquice com mais vemência. Gente fingindo ser japonês. Conseguiram me fazer sair do prumo quando uma guria postou “Sayoo Sayoo^^” (de “Sayonara”) depois de eu me despedir. Eu arrebentaria o rosto dela. Comeria ela primeiro, mas depois arrebentaria suas fuças.

Era tudo uma perda de tempo. Tá certo que ganhar alguém numa discussão dá certo prazer, mas com o tempo chateia. E eu não ganhava absolutamente nada com isso. São imbecis, alguns crescem e viram gente, outros não, mas e aí? A única opção é se livrar deles, se distanciar. São dispensáveis, tanto que eu nem deveria perder tempo com eles. Mas algumas pessoas só caem na real depois que fazem a merda, certo?

Pedi mais um copo de suco e dois ovos cozidos. Estava com muita fome. O atendente tirou os ovos cozidos do tabuleiro na vitrina – onde posavam mais tabuleiros com comida, algo bem normal nos botecos – e me deu. Paguei mais R$3,00. Logo depois pensei em Giovanni. Precisava estar perto dele, pelo menos naquele dia. Foi por isto que, logo após me empanturrar, fui ter com ele lá em Guarulhos.

“Cara, esperei que não iria voltar”, disse-me ele, espantado. “Elas já foram embora, se isso te preocupa”.

- Sim, me preocupa, queria falar com elas – menti para ele. Me deixou aliviado a notícia de que saíram fora. - Pedir desculpas, essas coisas. Engraçado que de uns anos pra cá deixei de ser coitado, mas parece que o andar original das coisas anda querendo que eu volte pro Lado Negro da Força.
- Lembro de você ter reclamado que os tradutores do “Episódio III” colocaram “Lado Obscuro da Força”, na época.
- Esse moralismo é o que me mata – disse a ele, sentando no sofá. - É “Lado Negro”, porra, “Lado Afro Negão da Força”!
- Hehe, isso mesmo – disse Giovanni, rumando para a cozinha. - E então, quer comer?
- Tô cheio, antes de vir para cá bati um prato lá perto de casa – respondi, cansado e de pernas abertas. - Elas foram embora e deixaram o perfume... então, o que ficou acertado entre vocês.
- Nada foi acertado, elas vieram por sua causa, queriam falar contigo, mas você foi todo arredio, como sempre – respondeu ele, sentando próximo. - Eu vivo preocupado contigo... você deixou de entrar em encrencas, o que é bom, mas ainda tem um tantinho de ira nesse coração, me preocupo ainda mais quando você vai se relacionar com uma pessoa perigosa e que certamente não terá a paciência e relaxamento que essas duas tiveram. Pode dizer que tal pessoa é mulher e mulher não te amedrontaria, mas existem mulheres e mulheres.
- Não vai acontecer nada, fica tranquilo, não sei quantas vezes terei que dizer isso. Aliás, eu já mantenho contato com ela.
- Sério? - indagou ele. - Contato de que tipo?
- Internerd, onde mais? Conversamos, foi pouco, mas conversamos.
- Mas ela sabe que você pretende...
- Não. E se saber ela vai fazer o que? Me matar?
- Ela poderia fazer isso com uma mão nas costas.
- Está me chamando de fracote?
- Não, mas ela o chamaria.
- Tá fantasiando demais. Só tenho medo daquele psicopata que matou o companheiro de cela porque ele roncava demais.
- Você mataria alguém que ronca demais.
- Sim, sinceramente, eu mataria.
- Estou te dizendo para desistir dessa loucura.
- Ahn... dão! Ah, qual é, ela vai render um episódio espetacular no meu futuro livro. Digo, no meu futuro filme.
- Sei que você quer ganhar o Oscar.
- Eu ainda não ganhei prêmio algum além dos chinfrins.
- Se é prêmio alguma coisa tem de significar.
- Então, são prêmios chinfrins.
- Ingrato. Tem gente penando para ser reconhecida.
- O Jabuti significa alguma coisa? Responda sinceramente.
- Não. Premiaram aquele cantor pelo tal livro dele, mas foi um jogo de cartas marcadas.
- Então.
- Quer comer?
- Pô, já comi.

Fiquei no sofá por alguns minutos, espreguiçado, mas não totalmente – mesmo na casa de um amigo não conseguia me soltar o suficiente. Eu já estava ficando com sono e sabia que ele iria me convidar para dormir, e eu provavelmente aceitaria, pois não teria saco e masoquismo o bastante para encarar uma nova remessa de chuva ao retornar para São Paulo. “Seus olhos estão cansados”, disse o óbvio para mim. É, meus olhos acompanhavam a calmaria progressiva de meu corpo. Me encolhi, inclinei a cabeça e dei uma cochilada.

Meu dia terminaria assim, caso não despertasse por conta de ruídos vindos da porta. Na verdade, não era da porta, mas das pessoas que se esgueiravam feito lagartixas na porta. Nem precisei levantar a cabeça, apenas meus olhos trabalhavam e eles trataram de se deparar com Giovanni e um moleque louro e de cabelos até o ombro, tão branco que parecia um albino, uma versão mais bem vestida e menos barbuda do Kurt Cobain – bom, o garoto visitante não ostentava o menor sinal de barba. Parecia ser tão delicado quanto uma menina. Pensei na hora que Giovanni teria dado um papo muito convincente nesse garoto para ele aceitar ter alguma coisa com o ele. Mentira, Giovanni era muito mais bonito que eu, dos cabelos negros, lisos e bem cortados, passando pela pele extremamente bem cuidada e terminando nos mocassins charmosos que colecionava. Tanto ele quanto o jovem me fitaram de cabeça para o alto e meus olhos observando-os como uma câmera indiscreta.

- Achei que você estivesse dormindo – disse Giovanni, rindo constrangedoramente. Ou pelo menos era o que parecia, pois ele nunca ficou constrangido de verdade pelos meus atos, parecia sempre levar as coisas na boa. Há muito o que aprender com ele, é certo. – Quer ficar lá na cama?
- Sem problemas, posso continuar aqui – respondi a ele, com a voz meio embargada. – Quem é o menino?
- Ele não é nenhum menino, tem quase a mesma idade que você – respondeu o dono da casa. – Gi, esse é o Gil, meu melhor amigo, veio passar uns dias em São Paulo e resolveu dar uma passadinha aqui.
- Eu lembro de você ter falado dele – disse o tal Gi, movendo seus pequenos olhos azuis claro para o meu rosto. Seus lábios carnudos moviam-se como um desabrochar de rosas, o moleque tinha uma cara de quem se besuntava de perfume – Só não disse que ele viria hoje.
- Ei, se o problema é minha presença, pode deixar, já estou saindo fora – eu disse, antes de Giovanni me impedir de levantar-se.
- Eu não tô chateado, cara, pode ficar na boa – disse o louro, sorrindo para mim. – Se quiser, pode ficar no quarto.
- Que nada, aquela cama é... é de vocês – disse eu, me recompondo todo no sofá. – Sabem que horas são?
- Quase 10 da noite, nós alugamos uns filmes e pretendo fazer umas pipoquinhas – disse Giovanni, sorrindo abertamente. E movia seu braço atrás do garoto, seu rosto quase colava no dele. – Tá afim, ou quer jogar um pouco ou quer dar uma volta com meu carro?
- Nossa, não sabia que você tinha carro, meu chapa – disse a ele. – Mas, não tenho carteira.
- Sem problema algum, Gil, a gente sempre anda com ele aqui nas redondezas, não vai dar galho, ninguém reclama, ainda mais agora à noite – disse Gi, me tranqüilizando. Segundos depois que eu levantei ele desprendeu-se do meu amigo e me deu um abraço e um beijo no rosto. O moleque cheirava bem de verdade. – Minhas colegas estão torcendo pra você, estão reclamando do porquê que o filme não desembarcou por aqui ainda. O que você gosta de fazer à noite?
- Ah, não curto noitadas, pra mim noite é feita pra dormir – respondi a ele. – Se bem que agora vai ser difícil para dormir. Não quero tocar no carro, pois não confio bem no meu senso de direção. Vou dar uma voltinha a pé mesmo.
- Não vai ficar pra ver os filmes? – indagou o lourinho, dizendo como se implicasse com o amigo. Giovanni mexeu uma sobrancelha.
- Não hoje, não quero atrapalhar, a noite é de vocês – disse a ele. Arrumei o sofá e me movi para a cozinha. “Pode ver se tem alguma coisa na geladeira, a casa é sua”, me disse o anfitrião. Claro que é. Tomei um gole imenso d’água. Tive vontade de tomar banho, mas me sentia levemente incomodado por ser minoria hétero naquele apartamento. Eu já sabia que sentiria ciúmes do meu amigo caso o visse se pegando com esse moleque mais que delicado e que parecia com uma menina, uma pré-adolescente, Jailbait. Mas teria de me acostumar, já que a casa não era minha.
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Mensagem  Admin Sex Fev 04, 2011 6:58 pm

REVERIE: COMEÇO DA PARADA 342434

A verdade era que eu estava levemente incomodado com o fato dos dois terem um romance. Não sei porque, eu não conhecia o moleque, era amigo de Gil, não tinha ciúmes por ele estar de beijinhos com alguma pessoa, ou pelo fato de serem duas bichas. Eu queria sair dali, mas ao mesmo tempo estava curioso, não com o futuro ato sexual deles, mas curioso com a fisionomia do moleque. Algo naquela merda me atraía, mas exatamente o que?

Eu tinha terminado de comer alguma coisa, e quando passei pela sala de estar para me despedir – e obviamente, para sair do apartamento – eu vejo os dois se pegando no sofá, com Gi deitado em cima de seu parceiro, tendo suas línguas entrelaçadas, como se alguém invisível estivesse fazendo uma cirurgia para uni-las em definitivo. Pôde-se escutar ruídos quase imperceptíveis de carne passando por outra besuntada de líquido, aquele barulho irritante que costuma ser tão tosco como o do órgão masculino penetrando na vagina de alguém. Ploc, plost, plosc. Isso aí. Não fiquei parado observando, apenas passei pela sala e vi e ouvi isto. Prossegui com meus passos até a porta, e quando passei por ela bati com toda a força possível, unicamente para provocá-los. Sabia que Gi não me repreenderia, estava ocupado demais despejando todo seu desejo sexual para cima daquele adolescente. Situações como essa me irritam tanto que, se eu tivesse um revólver ou fuzil, não hesitaria em crivá-lo de balas naquele momento. Não o moleque, mas o Gi. Enquanto o seu parceirinho me enchia de curiosidade, Gi me enchia da mais completa e verdadeira raiva.

Ainda chovia, é claro, mas dessa vez levei meus olhos a frente, para o ponto de ônibus. Ainda ecoava no meu ouvido o ruído viscoso das línguas – eram as línguas, certo? - dos dois namorados brigando. Olhei para o céu e vi novamente que o sol, aquele covarde, estava sendo subjugado pelas nuvens cinzentas que me acompanhavam desde São Paulo. Entrei na condução mais encharcado que nunca e tentei secar meus documentos, que se mantinham na parte mais sensível da mochila, onde entra qualquer tipo de líquido. Talvez, se eu deixasse no fundo desta não seriam molhados, mas seriam esmagados por minhas outras coisas. Eu tinha um livro para ler e uma revista, mas quase vomitei quando vi que esta mesma revista enaltecia um apresentador brasileiro que, desde os anos 90, tem o costume de “cafetinar” gostosas em seu programa de tv. Ganhava quando elas posavam nuas, ganhava quando elas davam a perseguida – e o cu – para clientes endinheirados – óbvio, já que uma noite com elas demandava muito dinheiro. “Odalisca”, “Sogrinha”, são só duas das personagens mais famosas e gostosas de sua marca. O cara é descendente de judeus, paulistano da gema – que não perdeu o sotaque nem quando foi para uma enorme emissora de tv carioca. Dono de um nariz avantajado, e que se achou no direito de reclamar nessa mesma revista quando o assaltaram e roubaram seu bracelete favorito. Do outro lado, sua mulher também foi enaltecida, uma apresentadora de São Bernardo do Campo, sem graça toda a vida, que era gostosa nos anos 80 – QUEM não era gostosa nos anos 80? - e que apresenta um programa de variedades no mesmo canal do marido. Esta revista vive cometendo cagadas, mas mesmo assim eu alimentava o desejo masoquista de comprá-la sempre – só não assinei, pois sou um sem grana. Mas, essa foi a gota d'água. Já não basta a imbecil da crítica de cinema deles?

Soltei no metrô Armênia, ainda chovia. Já estava de saco cheio de tanta água caindo na minha cabeça. Mesmo assim retornei à pé para casa, pensando na mulatinha que me encontraria no dia seguinte. Minha vontade era de não retornar ao meu quarto, apesar de estar sendo acossado pela chuva, mesmo assim, não queria voltar, só que era aquela coisa, não tinha para onde ir, eu não poderia ligar para a mesma mulatinha pedindo que me visse hoje – já que a gente marcou para o dia seguinte, e mesmo se não tivesse marcado ela não aceitaria me ver hoje – essas merdas, então, ou eu voltaria para o quarto, ou eu ficava zanzando por aí até cansar. Resolvi voltar.

De volta ao laptop, fiquei em um chat de bate papo por 2 horas ininterruptas – como se fosse muito – enquanto atualizava meu perfil em uma rede social e no Twitter, onde novamente, mendiguei a atenção de duas gurias que gostava. Digo, eu gostava delas, mas elas nunca falaram comigo diretamente, seja na internerd ou pessoalmente. Tudo isto me desanimava, pois há muito tentava alguma conversa completa com as meninas. Bom, elas nunca falaram comigo mesmo, não emitiram uma coisinha sequer para mim, mas sabem que se eu as xingasse a possibilidade delas falarem comigo – obviamente devolvendo os xingamentos ou dizendo “nossa, ainda bem que eu não falei contigo até hoje, pois você não merece” ou até mesmo “não vou me rebaixar ao seu nível” - seria imensa. Mas, não costumo despirocar assim, a troco de nada. É preciso de fogo para eu explodir. E algo me dizia que era total perda de tempo insistir em conversar com quem não estava nem aí para mim. Depois disso, deletei as duas atrizes de segunda linha do meu Twitter.

Eu não tinha mais nada para fazer naquele dia. O barulho da chuva me entorpecia de prazer, então, eu dormi . Deitei de bruços na cama e dormi. Nem liguei que a porta do quarto estava entreaberta, mas, fora um ladrão, quem entraria mesmo?

Não acredito em sonhos que dizem alguma coisa, que prevem o futuro ou algo do tipo, mas sonhei com minha despedida de São Paulo e minha volta ao estado do Rio, chegando na cidade de trem, descendo na estação da Leopoldina – perto da prefeitura – , falando com alguns fãs que me paparicariam e depois rumando ao desconhecido mais uma vez de trem, interior do Rio adentro, com uma graninha que daria para financiar uma casa própria no cu do mundo. Minha felicidade viria daí. O que esse “senhor Sonho” não sabe é que não serei feliz de forma alguma enquanto estiver no Brasil. E sem dinheiro ou com uma quantia irrisória no banco. Às vezes tenho uma inveja tremenda de quem consegue ser feliz na pobreza, ou até mesmo na miséria. Se eu pudesse roubar ou pelo menos pedir uma fatia dessa felicidade eu roubaria ou pediria. O “senhor Sonho” se esqueceu que eu não seria feliz sem ter o trem por perto, porque primeira paixão são os trens – o segundo é o cinema. Meu estado é tão pequeno e teve tantas ferrovias desativadas e abandonadas que, se eu tivesse poderes em amaldiçoar e fazer voltar a vida governantes de merda que detonaram as estradas de ferro eu faria. Desde Juscelino estamos fodidos neste aspecto. Mas como seria melhorar as ferrovias e sair do Brasil e mesmo assim, ver que tudo correria bem se eu estivesse fora? O jeito seria virar político, ter poder suficiente para controlar as ferrovias com mãos de ferro e permanecer aqui, pois se eu estivesse lá fora alguém faria merda, já que não se pode confiar em ninguém. Então, eu teria de ficar mesmo no Brasil para ser feliz? Que droga.

Sábado.

Eu estava muito confuso quanto ao meu sonho e quanto a conclusão superficial do que eu faria para ser feliz. Estradas de ferro, políticos falhos, sair do país... tinha a certeza de que aqueles pensamentos iriam caminhar na minha mente pelo dia inteiro. Tive uma vontade louca de voltar para o Rio, cansei daquela chuva. Digo, naquele momento chovia bem fininho, dava para andar na rua numa boa. Depois me encontraria com a mulatinha. Queria ficar no quarto até chegar a hora, mas não consegui. O sol, aquele covarde, resolveu me torrar a paciência esquentando minhas costas e minha cabeça. Até mudei de lado na cama, mas desta vez as vítimas foram meus pés. Levantei, tomei um banho rápido, mas não troquei de roupa. Ainda não sabia onde lavaria as roupas sujas... até que dei uma olhada no pátio pela janela e vi um tanque sendo usado por duas mulheres, enchendo-o de sabão, pondo as roupas enxaguadas em um balde furado azul, enquanto as criancinhas corriam em volta delas, brincando. Depois, subiram as escadas. Já começava a me coçar por causa do sol, o que me fez sugerir tomar banho de novo. Tirava a camisa de novo, quando bateram na minha porta – e bateram baixinho, como se batessem pelo rodapé. Abri.

“Bom-dia”, disse a menininha à minha frente. Era uma guriazinha mesmo, cabelos louros desgrenhados, short azul todo surrado e camiseta amarela, magrinha. Queria arrumar tudo na hora para que ela não se assustasse com o estado do quarto, mas não tive tempo. E era uma criança, não teria uma cabeça crítica com 8, 9 anos. “Minha mãe disse se o senhor quer tomar café com a gente”. Seria ótimo, não? “Claro, deixa eu colocar alguma coisa”, disse a ela, calçando meu sapato e pondo uma roupa de cima melhor. Mesmo estando num canto pondo uma camisa mais limpa, percebi que ela me fitava, olhos castanhos e imensos fitando minhas costas nuas.

“Já vou, peraí”, disse a ela. Certo que se fosse uma pessoa adulta já me aborreceria, mas sempre relevo o que crianças fazem pela inocência e curiosidade natural. Terminei por trajar a mesma calça, uma camisa pólo amarela e só. Peguei a chave em cima do criado mudo e saí para fora, fechando a porta. Eu não estava sendo observado por mais ninguém – por ora – e o calor daquele sol safado e desgraçado queimava meu peito como brasa, dando novamente aquela reação alérgica que fez me coçar, mas não me cocei tanto para não assustar a garotinha... seria ruim se ela fuxicasse “mãe, ele vive se coçando” para a mulher, fazendo a galerinha ficar com o pé atrás, e no momento, tenho que mais acrescentar que diminuir minha lista de amizades descartáveis. Porque eu PRECISO destas amizades descartáveis.

Tive de andar mais devagar para a guria me acompanhar – usava chinelos tão surrados que, puta merda – e quando chegamos na escada optei por pegá-la no colo, e ela assentiu: envolvi minhas mãos magras em suas pernas e costas e assim descemos. Tive vergonha em ser flagrado por algum morador, mas já era, não podia descer a menina enquanto não chegávamos ao fim dos degraus. Enquanto descíamos esperei por alguma reação sua, mas nada, continuou a olhar minha fuça, dessa vez com naturalidade, a boca fechada – com um batonzinho fraco passado. Obviamente, a desci do meu colo, já que não queria que pegasse mal para mim. Chegando lá, me deparei justamente com o pai dela, um magro barbudo de calça jeans e blusa vermelha. Tinha um semblante miserável e altamente receptivo. Novamente, senti-me invejado por sua simplicidade. Me convidou para entrar.

Logo entrando, senti um calor intenso vindo da sala de estar. Suas 3 outras filhas estavam vendo desenho – uma adolescente e outra quase da mesma idade que a lindinha que peguei no colo – e a mãe estava na cozinha, preparando o café. Sala de estar bem pequena, uma prateleira enorme com inúmeros cds de bandas de forró, daquelas que costumam fazer versões de sucessos internacionais sem pagar por direito s autorais, hahaha. Tudo isso me lembrou o passado, onde eu morava em um cubículo até menor que este com minha mãe. Aaah, que saudade... o caralho, haha. Mas, de vez em quando voltar ao passado é legal. Sem isso eu nem teria paixão pelos trens abandonados, é sempre necessária uma carga de nostalgia. Naquele momento me senti um tanto tímido para sentar no sofá e aguardar o café e enquanto isso, pensei comigo: “Por que estão sendo tão receptivos comigo?”. Estavam assim naturalmente ou almejavam algo em troca? Bom – por enquanto – eu não tinha nada em troca para oferecer aos cabras. Meus equipamentos, meu laptop, grana? Sem os dois primeiros, eu nã trabalho. Sem o terceiro eu viro um mendigo e passo ainda mais a depender dos outros. E eu apareci todo simplezinho na Cohab, não acredito que tinha nego pensando que eu era um endinheirado. Nem cara de endinheirado eu tenho, sou um mulato de merda, que usa roupas de segunda mão e que sempre compra em brechó porque é mais barato. Mentira, é porque eu tenho medo de lojas. Mais que medo, asco. Eu não tinha nada.

Minutos depois a mãe se desocupa da cozinha e me cumprimenta. “Tudo bem com você? É carioca, né? Quanto tempo pretende ficar em São Paulo?”. Respondi tudo, mas iria dizer “não está tudo bem, não”, o que obviamente configuraria em perguntas como “por que?”, eu não responderia e passaria por mau educado com todo mundo. Seria questão de tempo até alguém fofocar e todos da Cohab me tomarem como mau educado, e como quero fazer amigos, seria uma merda ser mal falado. Mas, desde quando é bom sem mal falado? Eu, hein? Depois daquilo as meninas foram até mim e apertaram minhas mãos, me deram beijos no rosto e tentei sentir os seus odores naturais, mas não deu: passaram rapidamente por mim, menos quando nos sentamos à mesa – obviamente não nos sentamos na mesa, animal. Já a menina, sentou-se do meu lado, balançando a bundinha enquanto cantava, o que me fez cair para trás de tanto rir – bom, não caí para trás verdadeiramente, mas meu desejo era esse, se estivesse tão familiarizado com eles.

Eu tenho uma coisa pra fazer agora de manhã, então, não vou ocupar muito o espaço de vocês – falei para eles. Não estava tão apressado, disse para pensarem que não estou tão à vontade no lugar.
- Ih, você mal chegou, fique à vontade – disse o pai, que depois se dirigiu à mulher. -Amor, eu vou sair agora, volto à tarde, tá bom? - e ela assentiu, enquanto a guriazinha olhava para mim enquanto comia.
- Então, me disseram que você trabalha com cinema, é verdade? - disse a irmã mais velha, enquanto me servia com café com leite. - Que faz filmes.
- É, acabei de estrear um filme, mas ele é independente, foi pra poucos cinemas, mas fez um sucesso bacana. O problema é que fez sucesso no tipo de gente que eu não queria. Mas mesmo assim, rolou uma graninha, comprei meu laptop e tudo mais.
- Mas, laptop todo mundo pode ter hoje – disse a mais velha. - Quer dizer que rendeu pouca grana, então? Huehe, desculpe eu ser assim tão direta, tá?
- Tranquilo – respondi. - Rendeu uma grana decente. Só que é aquela coisa, não fiquei rico por isso.
- A gente sabe que você não ficou, hehe – me disse a do meio, escondendo as risadas e me pedindo desculpas logo depois. - Vai ficar pouco tempo aqui na cidade? Tem um monte de coisa boa pra fazer, não sei se você percebeu, mas o Rio é meio fraquinho para a noite.
- Concordo contigo, mas eu tô nem aí pra curtir a noite, meu negócio é com o dia – disse a ela. - Bom, eu não faço muita questão de diversão, se eu quiser posso ir ao cinema ou então ficar na internerd baixando algum filme, série, desenho, escrevo minhas coisas... deixei de ir ao cinema porque cansei de fazer isso sozinho, se é que me entende.
- Eu entendo... mas, se você quiser a gente pode ir ao cinema, algum dia desses – disse a do meio, chamando atenção da mais velha e a da pequena, que começou a entoar “eles vão namorar”, para todo mundo. Me senti meio constrangido, não por isso, mas pela garota ser tão direta. Eu poderia cair no clichê de que, sendo tão direta assim devia ser uma piranha, mas poderia me enganar. Eu nunca fiz essa associação.
- Hum... é uma boa – disse para ela. Não tinha muito o que dizer. Queria tomar café com leite.
- Então, tá – disse a do meio. Parece que realmente queria alguma coisa comigo. Como se ela agisse daquela forma com todos os caras de passagem que apareciam ali na Cohab.
- Mais um pra ela – disse a mais velha, de imediato provocando a ira da outra, que discutiu e tentou enforcá-la na minha frente. Parecia que a mais velha estava certa. Não assisti, nem a guriazinha, como se considerasse aquilo o acontecimento mais normal do mundo.
- Ei, dá pra se aquietar, por favor? - repreendeu a mãe. - Não liga, elas costumam brigar assim, mas no fundo se amam.
- Ninguém ama ninguém aqui – disse a do meio.
- Beleza, vocês são uma família muito amistosa – disse a elas. - Eu gostei de vocês, e obrigado pelo café. Tô indo.
- Ah, já? Ele ficou assustado com a gente, é claro – disse a irmã mais velha. - Mas, eu sei que você vai aparecer aqui mais vezes, por isso que disse que gosta da gente.
- Eu gostei de vocês mesmo – insisti na mentira. - Eu preciso ver uma pessoa agora, então, vocês me deem licença, por favor.

Então, como sou burro demais, invés de eu manifestar meu desgosto por eles – sim, eu realmente estava desgostoso de passar aquele momento – fiz o contrário, o que obviamente trará mais consequências para mim. Eu não queria ninguém no meu pé, gente batendo a porta do meu quarto o tempo todo, pedindo um pouquinho disso e daquilo, queria me manter quieto, sozinho na minha. Eles sacaram de início que este era o meu objetivo. Para voltar à programação normal novamente teria de fazer uma pirraça pra cima deles, mas em contrapartida podia perder pessoas que seriam especiais pra mim no pouco tempo que eu estava em São Paulo. O negócio é que eu comecei a ficar confuso. Eu só penso direito quando estou longe dos outros, de qualquer pessoa. Por isso mesmo, sair dali configurou em mais um motivo pra voltar à solidão. Era assim no Rio de Janeiro, seria assim em São Paulo também – evidente que mudaria um pouquinho quando pegasse as meninas que eu queria, mas depois voltaria a ficar sozinho. Então, a “Grande Família” que me desculpe, mas...

Então, resolvi me preocupar com a quantia que tinha no banco. Não lembrava bem, acho que tinha uns 400, 500 paus guardados ali, e eu comecei a me preocupar mais ainda com o que eu gastaria durante minha estada em São Paulo. Eu nunca fui de excessos, de gastanças, até porque, até os dias atuais, nunca tive condições para fazê-lo. Nunca fui rico e sempre prezei em valorizar o pouco que tinha, a comprar coisas baratas, tanto que em lojas – quando raramente as frequentava – dizia “qual é a mochila mais em conta? ou “pode me mostrar as camisas mais baratas?”. Falando em mochilas, deixei as de 2 braços simplesmente por serem “geradoras de cecê”, e como eu usava a mesma camisa por muitas horas uma mancha formava naquelas áreas, mesmo lavando-a trocentas vezes. Aprendi a gostar das mochilas de um braço só.

Saí da Cohab carregando nada. Tinha de dar umas “vacaciones” às minhas axilas – qual é, não vou ficar falando delas o tempo todo, certo? - , então coloquei os documentos necessários nos meus bolsos da calça, saí trajando um casaco vermelho, minha camisa da seleção alemã por dentro – evidente que não seria por fora – , minha calça preta e coturnos. Não tinha absolutamente nada para resolver pela manhã, então, eu poderia voltar para o quarto e ficar acessando a net enquanto não chegasse a hora de ver minha pequena, mas o problema é que odeio ficar a manhã inteira em “casa”. Seja no quarto da Cohab, ou na minha própria casa – nunca tive uma casa para chamar de minha – , e cada vez mais pensei nos meus gastos e pensei que não deveria despirocar o cabeção só porque recentemente meu filme estourou entre o público independente e que com isso depositei centenas de reaizitos na minha conta. Tava acabando. Tive de tirar o dinheiro para pagar a passagem do meu próprio bolso. Estava pagando o aluguel no quarto da Cohab sem a ajuda de ninguém.

Não demorou muito para perceber que eu estava sendo seguido. Era a irmã mais velha, que caminhava em minha direção enquanto verificava não sei o que de sua bolsa. Simplesmente eu andava no seu caminho normal para se sabe onde – trabalho, faculdade ou o que?. Repentinamente, fiquei com uma vontade louca de conversar, mas me contive. Ela até poderia me ser útil dizendo os podres da sua irmã do meio... isso é, se eu fosse chegado numa fofoca.


Saí dali e fui a pé até a estação de metrô Armênia. Fiquei aborrecido com a quantidade de gente que esperava comigo na plataforma. Não sei porque algumas pessoas têm ânsia em estar mais próximo dos outros, seja sentando num banco próximo a alguém ou aguardando o trem na plataforma, e como nas plataformas de São Paulo existem placas adesivas fixadas no chão pedindo para que as pessoas aguardem o veículo ali – onde estariam exatamente de frente para as portas dos vagões – inevitavelmente as pessoas ficam perto de você. Mas, entendi que, mesmo com a ausência do trem ou metrô as pessoas querem ficar perto de ti, mesmo se não tiver placas adesivas na plataforma. Pensei em me chapar para atuar este tour, mas não conseguia, estava mais do que na hora de me acostumar com aquelas pessoas. Algo me dizia que as coisas seriam piores caso eu passasse na Liberdade. Bom, eu estava mesmo rumando para lá.

Então, o metrô estava cheio. Enquanto passávamos pela estação Tiradentes comecei a me incomodar – mais uma vez! Vejam só como sou um sujeito mui frouxo! - com a quantidade de gente revezando seus olhares para mim e para outras pessoas. Eu já tinha um histórico de aborrecimentos contra pessoas que me fitavam, mas eu também fazia isso com algumas mulheres, eu era um grande hipócrita nesse sentido, mas mesmo assim, se achava no direito de protestar. Não poderia prometer que não fazia isso, uma porrada de gente enfurnada em um espaço só, o que eu poderia fazer? Bom, este motivo podia ser usado perfeitamente por eles, também. O problema deles é que se fixavam demais na minha lata, como se eu fosse alguma anomalia ou algo parecido. Não era. Não me considerava bonito – nem um tiquinho – , era feio, mas não muito – já que tive relatos de meninas que se apaixonaram por mim, não apenas meninas, mas mulheres feitas, MILFS gostosonas mesmo, pessoas com personalidade própria e opinião idem. Ou seja, uma pessoa que podia ser mais uma na multidão com extrema facilidade. E mesmo assim, isso não acontece. Nós já passamos pela estação da Luz (onde desceu um bocado de gente) e São Bento. Quando paramos na Sé entrou mais gente, vinda da Linha 3 do metrô (chamada de linha Vermelha: tanto linhas do metrô quanto as de trem têm identificações por cores e pedras preciosas, uma viadagem só). Logo depois soltei na próxima linha, a Liberdade.

Lembro do tempo enorme que perdia vindo para cá e rondando suas ruas sem destino e sem objetivos. Na época em que eu era um adolescente fissurado por desenhos japoneses, e que tinha pelo menos 80% da minha mente focada nisso. Um passado que só não é tão vergonhoso por eu ter sido... um adolescente (!), a pior fase da vida, uma fase na qual a gente quase sempre faz merdas que servem mais para ser lembradas com pesar no futuro do que para qualquer outra coisa. Naquele tempo eu não agia como imbecil apenas na minha estada naquele bairro, mas em toda São Paulo, já que eu era um menino “perdido”, e que quando saiu da cidade com uma mão na frente e outra atrás – além de não ter angariado amigos ou colegas – carreguei uma opinião formada pela Terra da Garoa. Acontece que aquela estada não quis dizer nada em relação a conhecer a cidade. Não a conhecia, estava conhecendo era naquele momento em que voltei a ela com mais maturidade. Mas, eu tive de aparecer por lá rapidinho, né? Estava com saudades, queria ver a lata dos descendentes de orientais – antigamente eu os adorava pelo simples fato de estar ligados ao Japão, e eu amava o Japão, como já deve ter ficado claro – , mas atualmente esse sentimento rolou de forma diferente. O que eu sentia por eles? Podia seria qualquer coisa, menos a adoração burra de antes.

Eu estava em um clima bastante enjoativo, totalmente diferente do Gil de antigamente, que adorava o bairro da Liberdade e que desejava ser habitante daquele lugar custasse o que custasse. Acabei me fodendo, já que não tinha qualquer condição de me fundir ao bairro – de condições financeiras até familiares, passando pelo fato de eu não ter amigo nenhum que tivesse um lugar ali onde eu pudesse recomeçar a vida, seja um quartinho onde eu pudesse ficar enquanto trabalhasse em um sub-emprego. Já saí da estação de metrô de cara para a praça, onde, à primeira vista, dei de cara com uma das tribos que eu mais detesto: os otakus. E digo isso porque sei como eles são, já fui um, conheço os dois lados da moeda. A pior sub-divisão dos otakus são os metidos a jrockers – integrantes de banda de rock japonês, ou então simplesmente um fã “verdadeiro” de rock japonês – com toda a indumentária característica. Quando se é descendente de japonês fica mais fácil “incorporar” os modos de jrocker, quando não se é e implanta a si mesmo um nickname japonês a coisa fica ainda mais vergonhosa. Os otakus são malucos, fissurados em animes e mangás – são otakus por isso – e mal vistos no Japão, mas mais tolerados aqui. Morro de rir só de pensar em um negão ter um nick de “Kyuketsuki-san” ou “Akira-kun”, HAHAHAHA! Tenho o direito de rir à vontade, pois, como eu disse anteriormente, conheço os dois lados, sofri um pouco, insisti em participar de algo que não me divertia nem por 1% e por aí vai. Hoje estou “limpo” e se eu desembestar em contar tudo o que passei enquanto otaku daria para escrever um bom livro.

Enquanto subia as escadas e tentava desvencilhar meus olhos daquele tipo de gente um calor filho da puta esquentava minha cabeça – e já que eu subia – e descia tomando todo o meu corpo. O sol resolveu sair, enfrentou as nuvens, não sei se rio ou se choro, pois já estava habituando-me ao nublado, voltei a me coçar, mas me segurei a duras penas, não podia me coçar na frente de japinhas tão bonitinhas, mesmo que não me vissem novamente eu passaria vergonha ali, do mesmo jeito. Pernas cruzadas, ou eram magrelas ou eram gordas, e eu com meus olhos, procurando “algo gostoso” em seus corpos. Acima de mim, uma quitanda, eu estava doido para beber alguma coisa, então, quando terminei de subir as escadas comprei um refrigerante e uma garrafa d'água, e como não tinha nada pra fazer mesmo me sentei em um dos bancos de concreto da praça. Estava na sombra, então tudo beleza.

Arqueei minhas costas, olhei para a avenida enquanto tomava o suco, então demorou para perceber que um casal de nisseis estava andando em minha direção. Pararam na minha frente. Foi quando eu percebi e ergui minha cabeça para ver seus rostos espinhentos e pálidos. “Oi, a gente estava sentado aí, pode nos dar licença, por favor?”, perguntou a japinha – trajava uma bermuda jeans curta, camisa branca com estampa de anime (desenho japonês) e uma botina preta. O namorado era um magrelão de jaqueta e calça jeans, camisa de banda de jrock – acho que era Dir em Grey – e calçava All Star preto. Tinha os cabelos longos e óculos sem grau. Fiquei olhando para as caras inexpressivas deles e disse: “Desde quando tem lugar marcado aqui? É uma praça pública”. Neste momento, minha adrenalina ativou e eu esperava que o namorado dela fosse comprar briga comigo. Sabe como são as pessoas hoje em dia, compram briga por nada. Enquanto eu manifestava meu desagrado na minha expressão facial – aparentava estar pronto para brigar – a guria disse: “Ah, a gente sempre usa esse lugar”. Não disse mais nada, mantive a expressão. Senti um pouco de pena dela, até por ser uma baixinha bem gostosinha e evidente que ela combinaria melhor comigo que com ele, o sujeito parecia uma lampreia. Segundos depois eles se foram, resmungando. Relaxei. Um outro japa, mais gordinho e de cabelos desgrenhados, olhava para mim de soslaio, mas quando devolvi o olhar, deixou de me fitar. Fiquei meia hora sentado preguiçosamente naquele canto, até que levantei a bunda dali, atravessei a praça, a avenida e entrei em um fliperama. Já conseguia ver claramente quem era nissei, quem era japonês e quem era chinês.

Logo ao entrar dei de cara com um chinezinho vibrando e gritando diante de um pinball. Ele podia me ensinar alguma coisa sobre este tipo de jogo, sempre preferi os flippers comuns, sempre jogos de luta, sempre fui uma negação no pinball, ridiculamente ruim, vergonhoso. Parecia que eu já tinha frequentado aquele lugar, mas lembrei que, na época em que apareci em São Paulo todo fodido não tinha fliperama no bairro. Bom, pelo menos onde eu tinha passado. Momentos tão desprezíveis, aqueles... eu devia ter condições de fazer crescer uma capa que pudesse ocultar estas memórias de merda, mas tinha lembranças piores que esta, então, o que seria uma passada totalmente despreparada em São Paulo, quando tinham acontecimentos passados bem piores dormindo na minha cachola? Podia ser de consenso geral que eu estava me penitenciando demais com estas lembranças.

Quase caí para trás com o preço da ficha, R$ 0,75. Estava acostumado a comprar fichas com o preço duas vezes menor, mas até no Rio de Janeiro a quantidade de fliperamas com esse preço – ou maior – crescia cada vez mais. Comprei 4 fichas. A máquina Multi Fliper – com dezenas de jogos diferentes em um lugar só – à minha frente, o Super Street Fighter IV atrás de mim e a disposição para arrebentar alguns adversários controlados pelo CPU. E foi isso que houve. Como sou um cara “transformado” quando joga flipper gritei, esbravejei e bati palmas em toda a trajetória. Terminei a terceira ficha – Street Fighter Zero 2, tinha tomado um pau do Zangief e xingado o mesmo de filho da puta, entre outras coisas – e quando fui colocar a terceira no Super Street Fighter IV vi duas meninas jogando Guitar Hero com dois caras, certamente não eram seus namorados. Uma guria baixinha e de short rosa e camisa branca e outra guria testuda, espinhenta de cabelos longos e óculos fundo de garrafa, mas com um sex appeal: peitões. O tipo de guria que quase qualquer sujeito da minha idade não tão exigente comeria (no caso dela é “faria amor”), até namoraria, mas nunca andaria de mãos dadas na rua. Eu já estava relaxado do jogo anterior, poderia pôr a ficha no Super Street IV, mas... a garota me atraiu. Muito. Os peitões foram só a porta de entrada, eu estava atraído também por seu jeito “inocente” e assumidamente virgem. É isso, estava na cara que a guria tinha pouca ou nenhuma atividade sexual por anos e anos, acho que nunca tinha namorado. Se eu investisse numa relação e fosse o primeiro a transar com ela não a deixaria de lado, depois. Ela se dava ao respeito – pelo menos aparentemente. Certo que era uma guria que se guardava para o sujeito ideal. Bom, eu nunca fui ideal para nada, só para vivenciar o fracasso. Mas, poderia formar alguma coisa com ela.


- Oi, mocinha - disse a ela, tentando sussurrar em seu ouvido. Isso, "tentando", pois a outra menina tentava barrar minha proximidade, mesmo inconscientemente. - Eu costumo jogar isso, mas sempre perco antes de chegar no final.
- Peraí, você vai acabar fazendo ela perder - disse a mesma garota que embarreirava minha passagem para a garota com seus ombros pequenos, mas decisivos.
- Ok, ok - respondi, um tanto sentido com a repreensão. Logo depois saquei que a guria na qual eu queria alguma coisa estava realmente muito ocupada com o jogo. Não olhava para mim, mas toda vez que aplicava uns solavancos seus peitões balançavam, e seus óculos também. Evidente que isso me excitava, mas a presença de outras pessoas me deixava mais inibido. Sempre foi assim, pessoas quase sempre me inbiam em momentos em que eu poderia explodir. Eles deviam me deixar explodir ficando sozinho com as garotas. Uma hora isso vai voltar a acontecer. Comprei mais uma ficha, pois achei que iriam tomar mais tempo da garota (digo, todos estavam tomando tempo de si mesmos). Comprei, mas não a utilizei, guardei no "borso". Prossegui na minha observação, recostado a uma máquina de SVc Chaos e tão convincentemente compenetrado que chamei a atenção dos amigos dela. Ela me olhou. Demorou para eu sacar que estou assustando a garotinha. Hah.

Bom, depois disso deram pinote. Foram embora. Minha vontade era de correr até eles, cercar a guria que impediu minha abordagem na peitudinha e sentar umas porradas, mas só pioraria as coisas. Os miguxos dela me baterem? Impossível, enquanto eles dariam um soco levariam 3, 4. Uns bichinhs, seu corpos assumem sua viadagem. Mas, mesmo assim, aparentando "vencer", ficaria mal com o moço do flipper e com os frequentadores assíduos dali. Eu já estava de saco cheio de deixar uma má fama em todos os lugares que passava. Talvez, se bobeasse, deixaria esta "marca maligna" na Cohab, eu era um encrenqueiro nato, pelo menos na arte de encrencar até "a boca do caixa" - ou seja, não necessariamente arrumando porradaria, mas discutindo quase até eu bater em alguém, me baterem, etc. Aliás, por que estava me dando ao trabalho disso mesmo?

Já estava de saco cheio do calor do flipperama. Nem os gritos histéricos do chinezinho maluco me deixavam mais animado. Eu estava oficialmente cansado, e suando, não poderia me encontrar com uma menina dessa forma, se a primeira impressão for ruim a gente se fode, já que quem iria à escanteio seria eu, não a garota. Garotas sempre dão a palavra final em relacionamentos. Eu começava a retirar o suor da minha testa enorme quando pensei na garota que iria me encontrar hoje, na decepçõa e no banho, no maldito banho. Precisava comprar uma roupa nova ou então tomar um belo banho, já que minhas roupas não fediam. Tinha ainda uma grana para torrar, mas não pude mais priorizar a diversão. Que "diversão" mais falha e fraca, não? Se uma garota me perguntasse: "o que você faz pra se divertir?", eu responderia: "Jogar flipper!"? Puta que me pariu. Sou uma pessoa que deve ter uma série de qualidades, coisas boas que o destino poderia me proporcionar e eu fico nessa mesquinharia de jogar flipper. Qual seria a segunda diversão? Ir ao cinema? Acessar a internerd? O primeiro é algo raro. O segundo é tão corriqueiro que nem devia se encaixar na categoria "diversão". Coisa normal. Não me considerava um moleque muito limitado, ainda tinha um monte de coisas para descobrir e apreciar, mas tinha ciência de que não era mais um adolescente. Também não queria dizer que deveria me apressar, também não relaxaria. Só que eu sempre relaxo, né? Deve ser o motivo de eu estar tão atrasado e ter uma vida tão monossilábica. Só não vou dizer "insípida" porque aí é demais, quantas coisas eu vivenciei...

Saí do flipper sacudindo a borda do casaco, de tão quente que estava lá dentro. Forno do caralho. Depois disso pensei em voltar ao Pari, à Cohab, para tomar uma boa ducha, mas tive preguiça. Pô, me deslocar da Liberdade ao Pari, mesmo que seja de metrô? Mas, qual a minha escolha? Acabei fazendo-o, já que não tinha conhecimento de lugares que proporcionavam banhos de graça, ou pagos. Fiz isso, retornei. Fixei meu rosto no chão do vagão, minha vontade era de arrancar as gargantas dos nisseis a dentadas, caso olhassem para mim, não só eles, mas as lourinhas também. Mais uma vez manifestei minha vontade de permanecer sozinho. Eu sabia que, mais cedo ou mais tarde essa privacidade se quebraria, a não ser no maldito conforto de minha casa. Bão, viria uma futura namorada aí, então eu só teria privacidade - e talvez quietude total - dentro do banheiro.

Terminei a ducha, pus minha roupa e saí de novo. Tinha exagerado no uso do desodorante "rolão", mas não se tratava daquele produto doce pra caramba, de aroma cítrico, não sou louco. Então, fui ao telefone público e liguei para a minha princesinha (haha, eu já estava tão confiente assim?).

- Oi, doçura - disse a ela. - Não direi "tudo bem", pois é um clichê tremendo.
- Tudo bem comigo, sim - disse para mim, meio rouca. - E então, ainda está de pé?
- Claro, claro que sim, tanto que iria perguntar isso a você - disse a ela, quase bradando, surpreso por ela ter perguntado, quando normalmente sou eu que pergunto.
- Sinto que as coisas estão muito boas pra voce, huehe.
- Mas sempre foi assim. Pelo menos a maior parte do tempo, mas tem uma coisa que eu preciso dizer, senhor.
- Pois diga, senhorita.
- Aconteceu um imprevisto aqui e...
- E você vai mudar o horário, o dia, etc.?
- Não, só mudaremos o local de encontro. Pode ser lá na Pinacoteca da Luz?
- Pode, mas não sei onde isso fica. Claro que posso sair perguntando, né?
- Claro que pode, está autorizado a fazê-lo - disse ela, abafando o riso depois. - Ah, o horário também. Pode ser 2 horas da tarde? 2 horas estarei lá, eu te juro.
- Ótimo, pois eu iria te fazer jurar mesmo, hehe - disse a ela. - Então...
- Então...?
- Até lá, beijocas no cangote. Falando nisso, vai me deixar beijar seu cangote quando eu te ver, certo?
- Certo. Mas, vai me deixar beijar o seu também, hehehe.
- Fechado.
- Beijocas, então.
- Bei- - Mal me despedi e ela desligou. Apesar da guria ter me injetado ânimo por este encontro, tinha uma sensação de que as coisas não sairiam exatamente como o planejado. Ora bolas, quase nunca saem. Tinha uma boa experiência nisso.

Eu ainda estava prostrado no Pari, e me acostumando com aquela leva de imigrantes peruanos, bolivianos, eu ainda não conseguia diferenciá-los. Além disso, voltei a me coçar, como se eu estivesse exposto ao sol, mas não era isso. Eu estava na sombra e mesmo assim me coçava, mas por algo diverente. Sentia algo pulando em minha pele, andando rapidamente, como pulgas. Depois do encontro eu teria o tempo to mundo, todo o tempo para procurar um posto de saúde. Depois do encontro.

Fui ao jornaleiro comprar um jornal da cidade, pois os reputados nacionalmente eram caros - especialmente por ser sábado. A coceira me marcava como alfinetadas extremamente rápidas e quase indolores, mas não eram insuportáveis, eu só teria de responder às picadas me coçando, mas nunca encontrava um fim definitivo nisso. Só coçar não adiantava. Me sentei em uma praça e pensei, "quando caralhos começou isso e o que eu poderia fazer de paliativo, já que com certeza teria preguiça para procurar o posto de saúde?". O melhor seria resolver isso logo para não deixar que a coisa ficasse mais insuportável que aquilo. Lembrava que há uns tempos tinha dormido em uma hospedaria bem porca há 3 anos atrás, quando lancei meu livrinho de contos na cidade de Paraty, Sul do meu estado do Rio de Janeiro. Tinha saído da cama já me coçando, especificamente no início das canelas e na barriga. Só bem depois que me disseram: "isso é 'murrinha'". E eu estava sofrendo um "revival" do que aconteceu naquele lugarzinho, no cu da estrada Paraty - Cunha. Poderia dar uma pesquisadinha básica na internerd - para confirmar - e pronto, voil"a. E depois disso, ir direto para o posto de saúde. Entretanto, a preguiça...

Aprendi onde situava-se a pinacoteca do estado. Ao lado do Parque da Luz, que era atrás da estação de trem (não sei se era atrás ou na frente). Não tinha almoçado, apenas fiz um lanche em uma daquelas lojas, restaurantes caros de Fast Food que pululam por aí. Jurei nunca mais gastar 1 centavo para comer uma comida tão insípida, tão insípida que eu ainda estava faminto. Já me dirigia à pinacoteca, quando tive de atravessar a avenida Tiradentes, e cheguei até lá. Fazia sol e tinha tudo para dar certo. Ela ainda não tinha chegado, então, me sentei em um banco para ler o jornal e esperar, então, fui direto à seção de cinema. Meu filme ainda estava sendo exibido, mas em um canto aparentemente obscuro em São Paulo. Eu nem lembrava que aquela coisa era exibida aqui. "Augusta". Já ouvi falar, mas nunca passei por ali.

"2 primos de nacionalidades diferentes sofrem de uma doença misteriosa, enquanto um procura a cura o outro aproveita dos benefícios dela". É isso mesmo. Eu estava tão cansado dessa sinopse que nem sinto mais nada ao lê-la pela enésima vez. Pena que não vi uma crítica relacionada ao filme. Gostaria de saber o que os críticos paulistanos acham de um filme feito para poucos.

Fechei o jornal quando dei de cara com uma guria esperando na saída da pinacoteca. Uma mulata de estatura mediana vestindo uma bermuda (até o joelho) preta com bolinhas brancas, camisa amarela, uma azul de manga comprida por cima, tênis All Star vermelho com um cadarço preto e outro branco. Parecia ter unhas pintadas de azul. Seu cabelo era um moicano jogado pra baixo em um dos lados, enquanto que o outro ostentava pouquíssimo cabelo. Um cordão daqueles de macumba e pronto. Estava lá a guria que eu desejava há um bom tempo.

- Oi, tudo bem? - disse a ela, pegando-a de surpresa e com isso, assustando-a. Esperava que desse um salto para trás, mas não deu. Logo, botou sua mão direita no peito, reajustando a respiração. Tive de ser idiota demais para fazer isso, e olhem que não estava muito empolgado com o encontro.
- Tudo bem, mas por que fez isso, idiota? - perguntou ela, socando meu peito enquanto ria. Mais uma injeção de ânimo. Não sabia que ela tinha sardas, é difícil ver uma mulata com sardas... lábios carnudos, dentes bem alinhados, ombros fortes. Acho que ela poderia me dar uma surra, se bobeasse. - Cheguei atrasada?
- Não, foi na hora – respondi a ela. Depois disso, beijei seu rosto e a abracei gostosamente. Ela tinha peitões, peitos grandes e firmes. Me senti surpreso. - espera aí, você... achei que fosse uma pessoa totalmente diferente.
- De qual tipo? - perguntou ela, sorrindo no canto da boca?
- Cabelos encaracolados, magrela, sem peito – disse a ela, constrangido. - Foi mal, devo ter confundido as coisas.
- Normal, vamos sair daqui – concluiu a guria, por hora. Pôs a mão no bolso enquanto saíamos da entrada da pinacoteca, cortamos a mesma em direção ao parque, que como eu disse, do ladinho da pinacoteca. Tirou do bolso a sua carteira de identidade, e eu fiquei curioso para ver o que ela iria fazer. Olhou para seu próprio retrato (ela de cabelos longos e soltos) e pôs no bolso de trás novamente. Como todo bom pervertido, ainda estava tocado com a pressão dos seus seios no meu peito, ao nos abraçarmos. Mas eu era realmente um pervertido? Não, acho que não. Nem na minha adolescência.
- Achei que você curtisse museus ou coisa parecida – disse a ela, enquanto caminhávamos no parque. Percebia que diversos homens olhavam para nós.
- Pinacotecas... - corrigiu ela, sem olhar para mim. - Estes caras são seus amigos? Estes merdas?
- Por que?
- Porque estão olhando pra gente o tempo todo – respondeu. Isso incomodava tanto a mim quanto a ela. Homens maltrapilhos ou razoavelmente vestidos, barbas malfeitas, olhos cavados, homens andando, sentados nos bancos, observando nossas latas como se fôssemos aberrações ou algo do tipo. Cerrei os punhos, ameaçando os cabras, mas minha companhia interrompeu tudo, envolvendo sua mão na minha. - Já sei que lugar é essa, vamos embora.

Saímos do parque, atravessamos uma pequena avenida – que dava para a Tiradentes – e a estação de trem da Luz, damos no outro lado do bairro, onde aparecia mais homens parecidos com os do parque. E putas, prostitutas, as piores possíveis: gordas, obesas, umas com crostas de sujeira em todo o corpo e cabelos desgrenhados. Tem quem goste, o mundo é bastante diversificado em relação a gostos. Não sabia que a visão do inferno tinha assustado da menina, mas ela deu meia volta comigo e foi para a bilheteria do trem. Queria sair dali a qualquer custo. “Vai se importar se ir pra minha cidade comigo?”, perguntou para mim, que respondi que não na hora. Lembrava que ela não morava tãão longe da capital. Comprava as passagens mordendo os lábios, manifestando seu nervosismo e atiçando minha curiosidade... como se tivesse sido traumatizada, como se aquele bando de trastes e prostitutas – que também não deixam de ser trastes, só sendo mesmo uma traste para chegar àquele ponto, aqui eu estou sendo bem ingrato – tomando toda a área. Paguei meus R$ 2,65 e descemos para subir à plataforma, mas não lembrava exatamente onde ela morava. Tinha me esquecido.

- Qual trem você pega pra casa? - perguntei a ela, enquanto descíamos a escada rolante sem pressa. Não perguntei onde morava, pois não queria passar mais vergonha.
- Rio Grande da Serra – respondeu ela. - Eu moro em Santo André, não te disse antes? - ao perguntar para mim, acabei engolindo as palavras, o que foi bom, já que iria me foder de qualquer forma. Ela olhava para mim, como se vasculhasse algum erro que poderia sair de qualquer cavidade do meu rosto, do nariz, da boca, das orelhas... eu sabia que algumas mulheres se sentem decepcionadas com um errinho que seu então namorado em potencial poderia fazer. Estou acostumado a lidar com as que têm dificuldades em perdoar. Não queria ficar puto com ela por causa disso. - Você é meio desligado, que bonitinho.
- Nem tanto, eu vivo cobrando responsabilidade dos outros...
- Mas é irresponsável ou apenas esquecido. É esquecido – definiu ela, com um sorriso quase imperceptível. - Lembra do meu nome? Eu lembro do seu nome... Gil.
- Llllllll...
- Laya – respondeu, sorrindo abertamente, mas sem abrir a boca. Terminou a escada rolante, atravessamos o pátio e, no canto deste, subimos mais uma escada para a plataforma 1. Enquanto caminhávamos e parávamos na escada notei que Laya talvez poderia estar fazendo caretas, eu estava 1 degrau abaixo dela, revezava meus olhares na sua nuca, sua bunda e suas panturrilhas, suas costas... o trem já estava lá, entramos nele e escolhemos um local no canto. Ela preferia ficar ali, só a segui, ficamos num canto onde ninguém podia olhar para nossa cara, o que achei perfeito.

Ah, o sol. Este iluminava a minha cabeça – eu estava sentado em uma das cadeiras do corredor, enquanto minha mufa esquentava literalmente os raios solares apenas pegavam uma parte das coxas grossas da Laya, que nem se preocupava com isso. Mas qual ser humano se preocupava com isso, a não ser eu? Vários, muitos. Me curvei, mas não de uma forma estranha. Minha barriga ficou pressionada na mochila, que repousava no meu colo. Laya me olhou, como se questionasse meu ato. Pude ver a caralhada de penducarilhos que seus dois pulsos portavam, cada pulseira e bracelete esquisito e variado, que me fez pensar em não estar na pele dela quando fosse à balança. Ela poderia retirar aquelas coisas e botar pra pesar, daria uns 5 ou 7 quilos. Igual a bolsa de 7 quilos que eu levava na mão quando circulava em Macaé, uma cidade da Região dos Lagos – estado do Rio de Janeiro. Foi só recordar disso que olhei os calos de minhas mãos. Resultado dos pesos que peguei. E da punheta.

- Você nunca foi de relaxar, né? - me perguntou. Ela estava relaxada, com o braço direito nas minhas costas e o outro na borda da janela.
- Só quando criança, quando cometi alguns erros, espadinha do He-man, mas que ia pra laje gritar “EU SOU SHE-RA!”
- Hahahaha! - Laya gargalhou alto. Não precisei me preocupar com gente nos olhando, já que estávamos de cara para a parede do vagão. - Você era criança, dá um desconto. Quantos aninhos?
- Uns 3, 4...
- Então, relaxa. Opa, você odeia que te digam para relaxar. Mas faça isso pelo menos comigo... vai – disse ela, que acariciava minhas costelas, me olhava com um sorriso sereno, mas bastante seguro. Me excitei.
- Ok – Se queria que eu relaxasse, então fui relaxar do meu modo: ergui meu tronco e me aproximei dela, que por um momento cresceu seus olhos. “Puta merda, estou assustando ela”, pensei, ao envolver meus braços em suas costas, até que ela moveu seu braço e envolveu as minhas. Não me aproximei tanto de seu rosto, parei há centímetros de sua boca, pude sentir sua respiração, algo quente que invadia até meus ouvidos. Laya moveu sua outra mão e tocou minha testa, passou com o indicador na minha têmpora e desceu até o queixo. Sorriu, como se dissesse “ah, esse danadinho...”. Movi minha mão direita e acariciei seu tórax, uns 30 centímetros acima dos seus peitões. Desci minha cabeça em seu pescoço e o beijei, cheirei seu cangote, e ela me abraçou, desceu um tanto suas costas para sustentar uma parte do meu peso. Fiquei com o rosto cavado ali no seu pescoço e cochilei. Beleza, campeão! É assim que se faz! HAHAHA!

Laya me acordou quando chegamos na estação Prefeito Celso Daniel - Santo André. Estava rindo como uma hiena. “Não vou deixar mais você beijar meu cangote, babão”, disse ela, às gargalhadas, atraindo olhares para a gente, mas tudo bem. Levantamos e saímos do vagão. Tive que limpar o restinho de baba no meu beiço inferior, me senti mais envergonhado que nunca. “Espero que você não pense que vou dormir cada vez que eu te beijar”, disse a ela. Já estava esperando uma resposta do tipo “Mas quem disse que vou deixar você me beijar de novo?”, só que ela não disse nada. Iria contar desse momento para sua mãe, sua irmã, suas primas, suas amigas de escola... dei bola fora, mas porque seu corpo era tão aconchegante que, puta merda. Eu deveria tê-la beijado de uma vez por todas, né? Queria fazê-la rir, mas não desse jeito. O que poderia fazer para compensar esta bola fora?

Enquanto saíamos da estação fitei o rosto dela como se procurasse alguma coisa, mas na verdade não consegui achar porcaria alguma além da sua expressão de escárnio. Certamente seria objeto de suas risadas por um longo tempo, mesmo se eu não estivesse presente. Mas, eu já estava bem habituado a isso, desde o começo da adolescência tinha sido objeto de escárnio das demais pessoas – engraçado que na minha infância isso não foi uma constante. O que eu poderia fazer, além de suplicar, dizendo para ela dar um desconto, já que achei o seu cangote tão quentinho e aconchegante? Hah. Vai me dizer que o corpo dela é todo daquele jeito? Se eu a abraçar, ou coisa maior, se eu transasse com ela, depois do gozo terminaria com minha cabeça de cima enterrada no meio dos seus seios?

Eu poderia divagar sobre isso o dia inteiro, mas me surpreendi quando ela passou a olhar para mim, como se me preparasse algo. Então, fomos para próximo de uma pilastra, um tanto longe do burburinho, quando ela me imprensou no concreto, avançou sobre mim com a maior sutileza do mundo e me beijou. Aí sim, pude sentir os seus lábios grossos devorando os meus, sua língua enrolando na minha e querendo roçar no céu da minha boca. Eu não estava totalmente preparado psicologicamente para aquilo, só que eu não era estúpido e viado o suficiente para me desvencilhar daquela boca! Eu queria era mais! Então, em pouquíssimos segundos Laya me beijou e se afastou um pouco. Eu estava tão afim que minhas mãos, estimuladas, tocavam sua cintura e desceriam até sua bunda – e, até onde vi, era uma boa bunda – , isso se ela não parasse e dissesse: “Promete que não vai contar para ela?”. Caramba, “ela” quem?

- Promete que não vai contar, prometa agora – impôs a menina. Beleza, disse “prometo”, só que eu não sabia exatamente o que aquela gostosa estava falando. Até porque estava meio compenetrado passando a língua na saliva que ela deixou na minha boca.
- Me dá mais um beijo – pedi, e ela não me atendeu. Enquanto andávamos olhei para os movimentos das suas coxas e da sua bunda, puta merda, o quão eu queria tocar ali, apalpar gostoso. De mãos dadas Laya e eu saímos da estação, até que vi ela acenando para uma garota, que estava do outro lado da avenida, exatamente do lado de fora do terminal rodoviário. Era sua irmã, ou algo semelhante?

Fiquei olhando para Laya, enquanto revezava na menina, que esperava os automóveis passarem para atravessar a avenida. Iria ter com a gente, e qual cara eu faria, além da de pânico – pânico por eu ter reservado aquela tarde apenas para ficar com Laya, e não com outra menina - ? Eu olhava para ela, ela também revezava seus olhares na menina e em mim, sorria como se eu fosse uma piada ambulante, e eu me sentia totalmente impotente. Não podia fazer nada, além de seguir seus passos e fazer quase tudo o que me pedisse. Apertei minha mão na de Laya, não me deu resposta alguma até vermos a guria atravessar a rua, aparentemente feliz por dentro e por fora, e logo se aproximou da gente, sorrindo com sua boca pequena, mas bonita e de lábios grandes. Tinha os cabelos negros trançados para trás. Eu estava me sentindo de fato, como vítima de uma peça. “Boa-tarde, pessoal”, disse a menina, toda alto astral, acenando para nós, mesmo estando há pelo menos dois palmos de nossos corpos. Muito graciosa e muito esquisitinha. “Boa-tarde, Gil... eu sabia que você não tava lembrado de mim”.

- Quem é ela? - perguntei confuso à Laya, que sutilmente largou minha mão. - O que tá acontecendo aqui?
- Hah, ele realmente não lembra – disse ela para a baixinha (a guriazinha media 1,60 e pouco, talvez), rindo abertamente e me cobrindo de vergonha e dúvidas. Já estavam olhando para nossas caras, exatamente por causa da gostosura que abria a boca por minha causa.
- Claro que não, já previa isso – disse a baixinha, e eu já estava me aborrecendo por não dizer logo o que estava havendo ali. - Não lembra mesmo de mim, fofuxo?
- “Fofuxo”? - indaguei mais para mim mesmo que para ela. Laya se afastava vagarosamente, saía de fininho, eu já me sentia pelado e desamparado sem ela no meu lado. Que exagero, não? Mas eu estava realmente gostando daquela garota, e compensaria aquele cochilo no seu cangote com um beijo gostoso na boca, se continuasse a ficar comigo. Onde ela estava indo, afinal, cacete? - Não, sinceramente não lembro.
- Você é um cara esquecido demais, devia levar umas palmadas no lombo por causa disso – disse a baixinha, rindo e segurando minha mão. Tão pequenas, mas emanavam uma quentura que me deixariam petrificado... em pouquíssimo tempo concluí que dormir com ela seria melhor que com a Laya, apesar desta provavelmente ser mais selvagem. Não pude me desvencilhar do seu toque. - Eu sou a Graça.
- Graça? - perguntei, como um débil mental. É, “Graça”. Foi o suficiente para revolver o fundo do baú de minha mente, de pouquíssimas semanas atrás, e ver que eu tinha conversado (por um bom tempo) na internerd com uma guriazinha desse nome. Uma guriazinha que quase nunca mostrava o rosto, nada além do peito (geralmente coberto com uma roupa estilosa e que você nunca viria por aí) e... dos lábios grossos numa boca pequena.
- Lembrou, esquecidinho? - perguntou ela. Foi aí que comecei a me “apequenar”, a me abaixar gradativamente, quase me ajoelhar, enquanto ainda tinha as mãos seguradas graciosamente por ela. Fechei os olhos, fiz caras e bocas para o chão. Ouvi Laya dizer: “Já que tá entregue, tô indo”, e quando a vi estava rumando para dentro da cidade, atravessando a rua e rindo como não houvesse amanhã. Graça, uma cheirosa e feminina garota, pediu para que eu levantasse. - Tive que fazer isso, me desculpa, tá?
- Tudo bem – respondi, trincando os molares. Me senti sendo moeda de troca, passei por uma mulher que certamente poderia ser chamada de “demônia” para uma anja, pelo menos visualmente. Também dei bola fora ao não me lembrar duma pessoa que eu conversava na internerd, no maldito MSN por meses a fio e que tinha prometido um dia especial quando chegasse a São Paulo. Lá estava ela, pertinho de mim, segurando minha mão, e eu demorei para me recompor. Tinha de ser frouxo demais para ficar do jeito que fiquei. Parecia que Graça compreendia tudo. Me olhava com serenidade, e por um minuto senti inveja do seu bem estar. Não parecia aparentar sacanagem e zombaria, como Laya. Desta vez eu estava mesmo seguro? - Eu que tenho que me desculpar, foi besteira e descuido eu não ter me lembrado da senhorita.
- “Senhorita”? Ah, que saudade de ser chamada assim – disse ela, sorrindo ainda mais. Eu estava sendo ofuscado por aquilo. Ainda não me sentia à vontade. - Não fica assim, me dá um abraço.
- Hum... - A guria me entorpecia com seu cheiro gostoso. Me inclinei, envolvi meus braços em suas costas pequenas, não estava mais nem aí para as pessoas. Eu podia chorar, mas não, não era tão babaca e sentimental a este ponto, mas ela deixou, como deixou eu repousar minha cabeça no seu ombro. Não me dava tapinha nas costas, apenas as alisava. Quando ergui minha cabeça e olhei para ela diretamente, Graça alisou meu rosto.

Graça trajava um vestido cinza com final 4 centímetros antes do joelho, casaco de pura lã azul marinha, além de uma camisa preta por baixo daquilo tudo. Calçava meias amarelas-ovo, + umas meias pequenas brancas e azuis, além de um par de sapatilhas preto e branco. Tinha diversos braceletes dourados nos dois antebraços, mas menos espalhafatosos que os de Laya. Uma insígnia dourada no casaco. Inspirava confiança e boas intenções. Como seria se Laya fosse a garota que conversou comigo por meses na net, e não Graça?

- Não se preocupe, eu não vou ficar assustado o dia inteiro com isso, tem que ser muito boiola para tal – disse para ela, ainda envolvido em seus bracinhos. Eu adorava aquela intimidade toda, tinha a certeza que teríamos muito mais que isso futuramente, entretanto, queria sair fora dali o quanto antes, já não aguentava mais as pessoas olhando para as nossas fuças. Do outro lado, a ferida no meu coração (aberta pelo fato de Laya ter me ludibriado, passando-se por Graça) estava curando. Tão cedo assim? Sim, eu já estava sob os cuidados de outra menina, aparentemente mais bem estruturada, sensível e decente. Não que Laya não fosse uma pessoa decente, mas com certeza eu combinaria melhor com Graça que com ela. Afinal, se eu estava gozando de uma companhia excelente naquele momento, por que ainda pensava em Laya?
- Ah, lembrei que você quase sempre jogava a culpa nos homossexuais em cada acontecimento ruim ou coisa parecida – disse Graça, olhando para mim de baixo para cima. - Você é um tipo único em muitas coisas, sabia?
- É, minha intenção era me diferenciar da maioria dos humanos em outras coisas, eu sei que tenho capacidade para isso, mas vamos dar tempo ao tempo, porque eu também não sou uma criatura sobrehumana – disse a ela, me achando. Ao mesmo tempo em que achava estar fustigando-a com o meu papo chato e deveras arrogante. Não queria assustar a menina por nada desse mundo, poderia deixar ser devorado por ela ali, que eu acharia a melhor coisa de todo o universo. - Ah, vamos sair daqui, não aguento esse pessoal nos olhando.
- Ah, vamos pro shopping, é aqui pertinho, ali! - disse Graça, apontando para o shopping cor de salmão há apenas 30 metros do terminal rodoviário e da estação ferroviária. Ah, bem que podíamos vagar por aí, em ruas solitárias (isso é, de Santo André pudesse nos fornecer isso naquele dia), abraçadinhos, se beijando, respirando e sentindo o cheiro natural um do outro. Eu teria o dia ganho se fizéssemos isso. Mas como eu deveria ter mais paciência, assenti de imediato o que ela queria. Apesar de saber que eu não suportava shoppings (e especialmente os cinemas destes) achava que os estabelecimentos do estado de São Paulo, em especial da Grande São Paulo e interior, pudessem ser diferente dos shoppings com cinema do Rio de Janeiro. Sabe como é, carioca é um povo bem legal, prestativo e tal, mas que quando irrita consegue ser pior do que qualquer outro povo. Eles eram extremamente superficiais e emotivos, isso eu já não via em São Paulo, mas também não pode ser 8 ou 80, não gosto de pessoas muito emotivas ou muito racionais. Rio e São Paulo. Parece que eu só encontraria a felicidade nos demais estados do Brasil. Com aquele governo federal de merda? Ah, menino, aqui nóis vai!

Eu e Graça nos descolamos um pouco para mover nossos corpos com total liberdade. Acho que, andando colado com Graça era como se eu tivesse de caminhar com 3 mochilas no corpo. Desconfortável, mas desde quando mochilas são tão macias e cheirosas? Haha. Andávamos de mãos dadas, com Graça olhando para mim e sorrindo, tal qual uma criança, a minha filha. Eu devolvia aquele sorriso de um jeito não convincente, achei que devia me equiparar a ela, mesmo se fôssemos opostos em personalidade, mas ela não merecia as minhas turras, o meu mau humor, mesmo tendo ciência de que eu era um cabra pavio curto. Continuei decidindo o que fazer – em pensamentos – e entramos no shopping. “Plaza” não sei o que, não lembro o nome completo.

Eu tomava nojo dos shoppings desde a adolescência. Achei que não precisava frequentar um lugar na qual poderia “apreciar” lojas em que nunca compraria – e nunca entraria – e muito menos frequentaria suas lanchonetes e restaurantes. Tinha raiva daquela gente fútil que costuma pulular nestes locais, pessoas em sua maioria branca – ou morenos-claros, mas meu racismo não é direcionado exatamente a eles – que podiam ser facilmente rejeitadas em uma pequena conversa de 2 minutos. E como na adolescência eu já estava de saco cheio das pessoas e do mundo para rejeitar esse tipo de gente era um pulo. E minha adolescência foi a pior fase da vida e não precisei chegar à velhice para concluir isto, mas disso a gente fala depois. Como disse, parte de meu ódio por estes estabelecimentos veio daí. Como todo bom candidato a ermitão aciono um modo de defesa que me faz ficar totalmente fora deste item, o frequentar de shoppings, mesmo se tiver uma coisa bacana, como cinema. Aliás, a quantidade de cinemas instalados em shoppings era absurda nos dois estados. Os cinemas MESMO estavam sendo extinguidos, especialmente na minha cidade do Rio, onde transmutavam-se em igrejas evangélicas – necessariamente do ramo neo-pentecostal e pedinte-mor do dinheiro de desempregados e gente facilmente iludível – e quando deveríamos salvar os cinemas seus responsáveis davam por encerrado a trajetória, só pelo fato de não ter dinheiro. Dinheiro é tudo, mas vai saber se algum endinheirado está interessado em tomar la administración de um cinema decadente e sustentá-lo? Infelizmente, apesar de ter mais grana do que há 5 anos atrás, eu ainda não tenho onde cair morto. Nem tenho quem me auxilie. Eu preciso me casar! Preciso formar alguma coisa, enriquecer para poder gerenciar os cinemas cariocas ao meu gosto! Mas, talvez meu destino não poderia ser esse. Sei lá, daqui há 5 anos eu posso continuar fracassando no cinema, então eu saio do Rio de Janeiro e passo num concurso público para montar linha férrea em Petrópolis ou no interior do Brasil, ou que até mesmo trabalhe no trem Barão de Mauá – Três Rios. Nada ainda era assegurado na minha vida. Muito menos a minha vida com aquela lindinha que estava ao meu lado, de mãos dadas comigo, passeando pelo shopping. Eu realmente estava preocupado com o destino das salas de cinema do Rio. Não era o único.


Última edição por Admin em Qua Fev 16, 2011 2:51 pm, editado 18 vez(es)
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REVERIE: COMEÇO DA PARADA Empty Re: REVERIE: COMEÇO DA PARADA

Mensagem  Admin Sáb Fev 05, 2011 4:55 pm

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- Ah, eu gostei daquela bolsa – disse ela, apontando para uma bolsa quadriculada na vitrina de uma das lojas. Fomos até lá para ela observar direito, quando percebi sua expressão esmorecer – É bem carinha para mim...
- Você me disse que trabalhava, não? - perguntei a ela. - Mas faz um tempo que me respondeu. Foi despedida?
- Sim, mas por causa de faltas – respondeu ela. - Faltei porque eu estava na experiência, então eles não toleram.
- E por que faltou, coração? - perguntei, enquanto caminhava com ela pelo corredor apinhado de gente.
- Tive que ajudar mamãe na minha mudança, mas por imposição dela, ela sabia que eu teria que trabalhar, mas veio com essa de “você é jovem demais, tanto faz se for despedida ou não, ainda tem uma grande vida pela frente”, mas eu penso no agora, e não no futuro. E ganhar dinheiro é muito bom, é claro.
- Que bom que pensa como eu – disse a ela, tentando confortá-la da forma errada – Não relatou isso à chefia?
- Eles nem ligaram, disseram que foi pior por ser culpa de mamãe. Fiquei sem poder fazer nada e agora, estou procurando outro trabalho. Ontem fiquei a tarde inteira fazendo entrevista... tive que participar de uma dinâmica...
- Desculpe dizer, mas dinâmicas são uma merda. Fazer polichinelos, arrumar grupinhos, já acho que contar a história da sua vida para todo mundo ouvir é de uma vergonha filha da mãe – tentei não xingar para não abalar minha queridinha, haha – eu sempre passei por uns maus bocados nas entrevistas. E sempre ouvia o mesmo resultado, no final das contas.
- Isso porque você não se esforçou bastan... talvez não era a melhor coisa para ti.
- Ah, é mesmo? Não existe “a melhor coisa”, “a hora ideal” ou coisa parecida – disse a ela. - Pelo menos não para mim. Tá certo que nego sofre pra caramba pra conseguir emprego, mas imagina alguém que tenha a obrigação de sofrer pra conseguir um cargo, mesmo se for um cargo menor, como contínuo, auxiliar de serviços gerais ou estoquista?
- Não diga que são cargos menores, tem gente que faz carreira nestes serviços...
- Só se for otário e conformista, ou até mesmo alguém limitado – disse a ela, sorrindo de jeito sarcástico. - Você sabe que o que não falta no mundo é gente com essas... “qualidades”. Não sou melhor que ninguém, mas se a pessoa se sujeita a permanecer anos a fio nestes trabalhos pequenos é porque não tem muito a acrescentar mesmo. Eu lembro de um cara que ficou por quase 10 anos como ajudante geral numa cooperativa de reciclagem: todo dia ele estava lá, 8 horas da matina retirando materiais no entulho, fodia o corpo, fodia a mente, a idade pesava, mas ele estava lá, todo santo dia. Talvez tenha achado que, se pedisse as contas amargaria o desemprego absoluto por causa da idade, mas ele nem tentou ver outro trabalho!
- E ele estava certo – disse Graça. - Hoje em dia quem daria emprego para um velho? Ele tinha quantos anos?
- Estava com 60 e tantos, bigodão, baixinho, nordestino... sinto pena dele.
- Mesmo em São Paulo, quem daria emprego para um idoso? - reiterou ela, me fitando com seus olhos grandes e muito expressivos. - Mas ele também devia ter se preparado melhor na sua juventude. Claro que pode ter ocorrido muitas coisas para ele ter chegado ali...
- Existem pessoas e pessoas, mas tem nego que gosta de sofrer e que faz de tudo para permanecer atolado na merda – disse a ela.
- Vai me dizer que é culpa da “mente limitada” deles?
- E por que não? Acha que todo mundo consegue acordar pra vida e mesmo se acordar, faz alguma coisa boa? Eu sou o exemplo vivo de que acordei pra vida e estou rumando ao sucesso... desde pequeno queria fazer algo bom. Antes eu curtia quadrinhos, tentei e vi que aqui no Brasil você não consegue viver disso, não consegue publicar porque tem que competir com os quadrinhos estrangeiros, tem desenhista dando aula de quadrinhos aí. Então, investi em outra paixão, o cinema. A duras penas consegui fazer meu longa metragem, ele se pagou, virou “cult” e estou colhendo os louros dele até hoje... agora, a intenção é exportá-lo.
- Nem todos tiveram a sua oportuni...
- Querida, eu também não tive, mas cavei e achei!
- Olha, vamos comer alguma coisa? Que fome... - Graça disse, tomando a minha frente e rumando a uma pequena lanchonete. Minha vontade era de esganá-la ali mesmo, pelo fato de não ter prosseguido com a discussão. Hah, eu provavelmente a coloquei contra a parede, por isso que mudou de assunto. Senti um prazer enorme em concluir que a venci na discussão, por isso que tomou a atitude covarde. Não fora a primeira vez que fez isso, mas o que podia esperar da maioria das pessoas? Venci, venci essa porra. E agora vai, vai lá comer para engolir a minha vitória, vai. E eu fiquei sentado em uma cadeira da Praça de Alimentação enquanto via a pequena pedir nosso lanche. Pude sentir uma certa inquietação vinda de suas pernas, que vibravam quase imperceptivelmente. É, realmente eu venci.

“Eu quero um cheeseburguer, o número 3”, disse para ela, de longe, embora detestasse gritar, só que eu não tinha a mínima vontade de me levantar, de quase me embrenhar na fila para falar com ela. Não queria filho da puta nenhum olhando para mim e detestava que me gritassem quando estivesse longe, mas acabei fazendo a mesma coisa. Sorte dela que entendeu de pronto o que eu queria, não suporto quanto as pessoas perguntam “o que?” e tenho de dizer novamente. Eu estava chateado, não com Graça, mas com a sensação desconfortável que sentia. Muita gente, muita coisa artificial, seríamos melhores se nós 2 estivéssemos sentados numa praça, abraçados e conversando, já passei por esse momento delicioso e queria passar de novo. Tinha a certeza de que eu poderia interagir melhor com ela em ar livre nos nossos encontros, vir para shopping foi de uma estultice tremenda, e... seria pior ainda se fôssemos ao cinema. Por que? Porque primeiro encontro foi feito estritamente para as pessoas se conhecerem, não de ir ao cinema e ficar fechado num ambiente em que temos a obrigação de ficar quietos – e com razão, eu odeio quando as pessoas conversam e insistem em ter seus celulares ligados ali. Logo, decidi que não deveríamos curtir o escurinho do cinema naquele dia. Eu teria de me esforçar para agradá-la – não demonstrando ser outra pessoa além de eu mesmo, óbvio – , porque com certeza ela estava se esforçando por mim. Gostava de mim de verdade e mais cedo ou mais tarde mostraria isso da forma mais amorosa possível, entretanto, até lá, teria de ser um bom moço, até porque naturalmente eu era, então... chega de ficar esquentando a cabeça a troco de nada.

Graça veio sem nada nas mãos, dizendo “eles vão servir a gente”, sorrindo docemente. Sentou-se à minha frente, com os braços dobrados na superfície da mesa e os dedinhos entrelaçados. Me fitava sorrindo, o que me obrigou a fazer alguma coisa, eu também já estava no embalo: movi minhas mãos grossas e as posei nas mãos dela. Foi aí que ela fechou a dentadura, mas continuou sorrindo, olhou para as minhas mãos tocando as dela e continuou sorrindo. “Fica aqui perto de mim”, disse a ela, que levantou-se da mesa lentamente – descolando seus dedos dos meus com a maior manha – , deu a volta na mesa e sentou-se ao meu lado, aplicando uma pancadinha do seu quadril no meu braço, dizendo “chega pra lá”, enquanto ria. Envolvi meu braço esquerdo em suas costas, enquanto minha mão direita insistia em tocar e acariciar suas mãos. Eu estava excitado, de pau duro, mas não necessariamente pensava em sexo naquela hora. Enquanto nos olhávamos Graça acariciou meu rosto, perguntando: “perdeu a vergonha, é?”, e eu não respondi nada, não queria gastar saliva, ela já sabia a resposta.

- Como te disse no MSN, eu gostei muito do seu filme, mas prefiro o curta que você fez antes – disse ela, não deixando de tocar minha face. - Vi no seu filme que você se importa muito com o Rio.
- Mais ou menos, lá é bem mais atrasado que aqui – disse a ela, olhando para os passantes e pensando na demora de servirem os lanches – Uma coisa que eu prezo muito no estado são as ferrovias. Gostaria muito de trabalhar nelas, pelo menos daqui há uns anos. Não acredito que iria ficar rico por causa dos meus filmes.
- Mas por que? - indagou ela, abrindo a boca de modo ridículo. - Você ainda vai passar por muita coisa boa, pode não ficar rico, mas vai ganhar dinheiro suficiente pra ter uma vida decente. Bom, sua vida já é decente, e tenho certeza que vai melhorar ainda mais. O que eu te falei sobre pensar positivo?
- Não acredito nisso – disse a ela, depois disso a garçonete chegou com as bandejas. Pôs na mesa a de Graça, nada mais que um lanche vegetariano, filé de peixe, salada de alface, além de um suco que eu achava que era soja. Para mim, ela trouxe um cheeseburguer com muito molho, 300 gramas de carne, batata frita e refrigerante. - Você sabe que eu acredito que isso não tem a menor influência na minha vida.
- Ah, mas comigo isso funciona. Devia pelo menos tentar um pouquinho pra ver se acontece alguma coisa boa...
- Sabe que as coisas comigo não são assim. São mais realistas e racionais – disse a ela, antes de dar a primeira mordida no sanduíche.
- Mas não deve ser por isso que anda sofrendo? - perguntou ela. - Acho que você deve... se desarmar um pouco, sabe? Acho que se você seguisse o que eu digo, por pelo menos uma semaninha as coisas iriam melhorar. Precisa ser um pouco mais leve, anda muito amargo...
- Eu sempre fui amargo, desde criança – disse a ela. - Não adianta nada correr contra isso.
- Não adianta porque você não quer – insistiu ela. - Eu queria que você fizesse um esforço, por pelo menos duas semanas. Só duas semanazinhas, por favor.
- Qualé, vai ficar implorando pra eu fazer uma coisa que não tem o menor sentido? Me desculpa, mas não rola – fechei. - Sei que você vai dizer que, por eu não tentar eu sou um chato de galocha, mas hoje eu estou de sapatos, haha.
- Metido a engraçadinho, você – disse ela, rindo comigo. Depois pôs as mãos para trabalhar e segurou seu sanduíche de filé de frango, mordeu-o com gosto e tentou tirar os restos de carne que pendiam em seus lábios, estava absurdamente linda quando tentou tirá-los com o polegar. - Você sempre gostou de me ver comendo, desde a webcam.
- Fique parada por um momento – decretei a ela, que ficara estática, ainda com um pequeno bolo de filé de frango sendo mastigado e os lábios comprimidos de forma hilária e ao mesmo tempo muito bonitinha. Ficou como uma estátua. Me aproximei lentamente do seu rosto, segurei sua mão com leveza e apliquei um selinho em sua boquinha. Ela engoliu o alimento, engasgou um tanto e sorriu, como se estivesse constrangida, mas não estava. Bateu de leve com a mão no meu peito, como se dissesse “seu danadinho”. - Não aguentei, eu deveria ter batido uma foto.
- Foto? - perguntou ela. - Por que não disse antes? Eu trouxe minha máquina, até pensei em bater uma foto da gente junto, mas seria depois. Por que não batemos uma foto agora?
- Beleza! - Não demoramos tanto para decidir quais poses seriam usadas. Rapidamente inclinei minhas costas em seus peitos, Graça pôs o braço esquerdo em minha barriga e com a outra mão tirou uma foto nossa. Eu não estava sorrindo de modo convincente. Quando me mostrou a foto em sua câmera digital (que devia ter custado uns 300 ou 400 reais) fiz cara de nojo, pois achava estar muito feio. Daí, tiramos mais uma na mesma pose (claro que mudei a expressão, sorri mais decentemente) e mesmo assim me achei feio, pior que a foto anterior. Graça disse que eu não deveria exigir muito de mim, mas era foda, eu realmente estava muito feio. O problema é que sempre me acho feio na maioria das fotos. A mais bonita, digo, a menos pior abre o meu perfil no Facebosta. Graça me fez aceitar a foto do mesmo jeito, prometi que iria colocar em meu perfil, mas era evidente que não faria isso, mas ela acreditava que eu iria aceitar a minha lata feia de qualquer jeito.

Depois tiramos mais uma, Graça, como quem não quer nada, chamou um passante para tirar uma foto de nós sentados, com ela me abraçando. O tal passante era uma garota muito bonita – morena de seios grandes – , o que me fez relutar um pouco em aceitar ser fotografado por ela, pois pensava que ela zombava da nossa cara, por dentro, só eu que eu estava alongando meu sofrimento, já que tirar a foto da gente implicaria em tomar pouquíssimo tempo da morena, obrigado e tchau. Como eu era burro, não? E foi assim: ela tirou nossa foto e acabou, pronto, vai embora, filha da puta! Graça sentia-se muito feliz e eu, ainda mais incomodado por ter passado aqueles momentos na frente de todo mundo. Até tentei brincar, mas isso não combinava comigo. Não na frente de todos.

- Agora que tô vendo quão você fica quietinho enquanto come – disse ela, me vendo comer e beber tudo sem dizer uma única palavra. Eu tentava não me incomodar com a presença alheia, e nem precisei imaginar que estávamos sozinhos naquela praça de alimentação. Graça comia e bebia de forma tão natural e acostumada que senti uma pontada de inveja dela. Ah, querida...
- É, não gosto de falar muito quando encho a barriga. Depois disso o melhor seria tirar um descanso, ainda mais porque eu já estou ficando cansado... também não quer dizer que eu tô afim de ir embora, não é isso – disse a ela, fazendo questão de deixar claro que nosso encontro não se tornara enfadonho, muito pelo contrário. - Depois daqui vamos dar uma volta?
- Claro, mas não queria dar uma passadinha no cinema? - perguntou ela, depois de pôr para dentro o último pedaço de seu sanduba. “Sanduba” soa tão horrivelmente carioca, puta que me pariu. O pior do vocabulário carioca.
- Não, hoje não. Quero muito conversar com você e ficar contigo, mas longe desse pessoal todo. E parece que, apesar de ser um shopping essa porra não tem tanto barulho, o pessoal parece mais educado que o do Rio.
- Também fiquei surpresa, eles não costumam ser assim – disse ela. - Bom, parece que não temos corinthianos aqui, haha!
- Huehe! - ri quase junto. Que bom que ela não gostava de corinthianos, eu também não gosto. Mas é aquela coisa, Graça não costuma “desgostar” de algo, ela acha que mesmo a coisa pior, o pior cara do mundo tem alguma qualidade, uma coisa boa, mesmo se guardar para si mesmo. Era uma guria extremamente positiva. Ridiculamente positiva, e eu era o oposto. - Corinthians me lembra de Racionais Mcs, gosto de algumas músicas deles, mas não...
- Não daquele mimimi “mais um pretinho na prisão”, é isso? E eu estou doida para acabar com aquela revista.
- Eu também. Se eu for poderoso o suficiente daqui há alguns anos vou botar todo mundo dali no olho da rua.
- Você tem o meu machado! - exclamou ela, antes de quase morrer de rir. Eu estava mais leve, mais solto, mas tinha limites, eles só poderiam ser quebrados ao tomar uma garrafa de cerveja, só que eu não bebo. Estando sóbrio é essa merda que está sendo retratada aqui.
- Eu estou escrevendo um livro – disse ela, antes de dar uma golada no seu suco – Ele é meio inspirado nas situações da Jane Austen... te disse isso no MSN?
- Não. Eu nunca li nada sobre ela. A autora mais feminina que li foi Virginia Woolf, e mesmo assim detestei. Não gosto do estilo de escrita dela. Se alonga demais nas frases, é vírgula pra lá e pra cá, e também ainda não me acostumei com personagens sapatões. Vai me dizer para “tentar mais um pouquinho”?
- Não, nunca diria isso – respondeu ela, sorrindo de forma sarcástica. - Eu trouxe meu livro aqui, ó...
- Depois você me passa, amore – disse a ela, sorrindo.

Terminamos a refeição - “refeição” sim, pois aquilo foi o bastante para me deixar de cu cheio – e saímos da praça de alimentação. Descemos as escadas rolantes e saímos do shopping, mas demorou, pois a Graça quis fazer graça, praticamente me prendendo em uma gibiteria. Queria porque queria comprar uma revista do Homem Aranha, e questionei o gosto dela, já que este herói está em um dos seus piores momentos, ela deveria comprar alguma coisa do Ultimate Homem Aranha – o que vale – e não gastar mais de R$ 10,00 numa merda mal escrita e mal desenhada. Tipo, tinha muito amor próprio, mas na hora de escolher um bom gibi... haha, que hilário.

Nos retiramos do shopping e cada vez mais que direcionamos nossos corpos à saída eu me sentia feliz – ou algo bem próximo a isso. Não aguentava mais aquele porrilhão de gente falando pelos cotovelos, se esbarrando uns nos outros, além de sempre ostentar seus rostinhos com beleza acima da média, e olhe que Santo André nem é uma “cidade das mulheres bonitas”, como é Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais. Mas shoppings são assim sempre, né? Sempre reúnem as maiores gatas – vocês não lerão novamente o termo “gata” por aqui, não costumo falar esse tipo de coisa – , assim como o trem do ramal Deodoro, lá no Rio de Janeiro. Seu trajeto começava (ou saía) da estação Dom Pedro II até Deodoro, no subúrbio carioca, na boca da Zona Oeste – também conhecida como Zona Rural, no passado. Este ramal era apinhado de mulheres e meninas bonitas, especialmente porque embarcam e desembarcam em locais classe média e de população extensa: Cascadura, Madureira, São Francisco Xavier, Méier... e eu não suportava dar as caras nesse trem unicamente por isso, porque excesso de feminilidade me rasga a garganta de raiva – aturo isso de poucas pessoas, como a Graça, pela qual guardo grande admiração. Eu combinava mais era com os ramais mais suburbanos, como o Japeri, ou até mesmo o trem que subia para Três Rios e que fazia escala em Petrópolis, local que eu considerava mais meu lar que a capital. E eu já sentia saudade daquele lugar, do Rio de Janeiro e da minha vagabundagem naquele espaço.

Saímos, mas pelo o que eu sabia Santo André dispunha de pouquíssimas áreas verdes, onde podíamos sentar e conversar. Não precisava ser tão isolado das pessoas, então acabei me deixando guiar pelo o que Graça decidiria. Eu queria muito ir à sua casa, mas estava bem claro que ela não iria deixar. “Você tá cansado?”, perguntou ela. Fiz que sim com a cabeça. “Quer ir na casa duma amiga minha?”

Não teria como me opor, até porque não o faria. Eu não queria ter nosso relacionamento empatado por conta de uma retardada, mas eu realmente estava precisando descansar, e, como não teria onde sossegar a carcaça – até por estar longe do meu quarto, no Pari – acompanhei a guriazinha até a casa da amiga, bem próximo dali, quase em frente a uma igreja Batista. Tudo isso nas proximidades do terminal rodoviário. Melhor que eu não tivesse a necessidade de conhecer a cidade mesmo. Meu corpo não corresponderia a esta vontade e Graça entendeu isso muito bem.

Graça ligou para a tal amiga, que assentiu prontamente em nos receber. Já tinha cantado a bola pro porteiro, este abriu a grade e nos deixou entrar. Tomamos o elevador e lá dentro tomei a liberdade de abraçar a Graça por trás. Não disse nada, apenas sorria – o que não quer dizer que ela estava concordando totalmente com minhas investidas, poderia estar constrangida, mas tinha medo de me dar um passa-fora, e por aí vai – e não virou a cabeça quando eu estava atrás dela, com as mãos segurando suas mãos. Estava excitado, mas não cometi o ato de esfregar meu pênis no seu traseiro, não queria deixar uma má impressão, eu tenho o tom de foder meus próprios relacionamentos.

Chegando no décimo andar eu e Graça saímos do elevador – dãã! - e chegamos ao apartamento 1005, o de sua amiga. Confesso que eu estava curioso em saber que amiga era essa, como ela era e se não era uma imbecil, mas pelo menos nesse último quesito as possibilidades de não ser eram mínimas. Como se eu tivesse coragem para convencer Graça de não vermos esta amiga. Eu nem conhecia a garota, como teria uma opinião formada sobre ela? Eu meio que estava ficando maluco e não sabia. Mal a guria apertou a campainha a porta foi aberta.

- Oi,pessoas! - exclamou a amiga de Graça, nada mais, nada menos que uma lourinha alta (acho que media mais que 1,85m, pois era quase do meu tamanho) e magrela com short legging rosa e top azul. Usava uma espécie de xale, como se quisesse esconder seus ombros e braços largos de mim, sem sucesso, e também não precisava. Vinha para mim com um sorriso ainda mais radiante e impressionante que Graça, mas o trunfo da lourinha era dispor de olhos azuis como safiras polidas, além da boca ser bem maior e mais vermelha. Em suma, mais chamativa. Não tinha peitões, mas eram razoáveis. Coxas magras, como o corpo inteiro, mas seu corpo como um todo não era de se jogar fora. Se tivesse que namorar e transar comigo por anos e anos a fio eu faria na boa, pois era muito bonita e, até onde vi naquele momento, com alto estima. - Esse que é o carioca?
- Sim, mas eu não tenho o sotaque de lá – disse a ela, sorrindo timidamente. Graça também riu.
- Só que nasceu lá – completou a lourinha. - Sabe, eu sempre tive vontade de ir ao Rio... não sou aquele tipo de gente que entra no chat das salas do Rio só porque assisto novela não, hein? - ao dizer isso, fiquei pasmo. Alguém vazou parte do meu comportamento para ela e já posso imaginar quem. Fitei a moreninha, mas ela riu sem graça. E eu lá, desejando ter uma faca naquele instante para matar as duas...
- O Rio é bastante atrasado, depois que a capital se mudou para Brasília aquilo virou um inferno, digo, o Brasil inteiro virou um inferno – disse a elas, preparando-me para ministrar uma das minhas famoosas aulas de História do Brasil. Elas não mereciam uma encheção de saco destas. Graça me pediu para ficar à vontade, mas como faria isso na casa de uma desconhecida?
- Eu já li bastante sobre isso. Deixa eu te cumprimentar, paixão – disse a mim, pegou as mãos de Graça e beijaram seus rostos. Eu mal conseguia sentar, não por estar tudo desarrumado, pois não estava. Tinha apenas a timidez atravancando a minha trajetória naquele lugar. - Vocês já almoçaram? Fiz o almoço agorinha, hehe.
- Nossa, meu, são quase 5 horas da tarde e você... acordou agora? - indagou Graça, impressionada. Sua majestade de tranças deve ser o tipo que acorda cedo até nos domingos. - Ontem, teve uma festinha, né? Mesmo assim a casa está impecável...
- Eu tive que dar uma arrumação monstro hoje na madrugada – disse a lourinha, descalça, terminando de preparar uma laranjada. - Por isso que tô acordando agora, dormi muito. Tem certeza que não querem comer? Esse cara está tão magrinho...
- Haha, deve ser genético – disse Graça, passando a mão nos meus antebraços. Senti a pele do seus braços e me arrepiei, de tão macias que eram.
- E os cabelos dele... é tão bonito, mas está tão grande – disse a lourinha, acariciando minhas madeixas. - Quer que eu corte?
- Olha, eu tô afim de ficar com ele assim mesmo, ainda não tá na hora – respondi a ela, que logo após disse para eu me sentir à vontade em sua casa. Tive de vê-la se virar para voltar à cozinha, e novamente pirei em sua bundinha e em as sobrinhas de pele que pendiam na borda de seu shortinho, mesmo sendo magra. Graça percebeu que eu estava me enfeitiçando pelo corpo mais ou menos da loura e me acotovelou levemente. Demorou para eu sacar que seu ciúme tomava conta. E me senti feliz com isso.
- Olha, eu estou querendo fazer uma festa amanhã, vocês estão dentro? - perguntou a loura, pegando os pratos e talheres, obviamente preparando a comida para a gente – minhas amigas adoram um carioca, mas como você não tem o sotaque de lá ficarão meio ressabiadas, tipo, um carioca sem sotaque carioca é algo bem esquisito!
- Não sei, hoje eu já tenho algo pra fazer, mas dependendo do horário posso aparecer, sim – disse a ela, sem depender da decisão de Graça.
- Eu não vou poder, porque tenho balé – disse a própria.
- Ah, nem vem, seu balé é às 6 da tarde, a festa seria às 8 e terminaria às 10, não é nada tão grande assim, tipo, uma festa de arromba, nós apenas vamos comemorar o níver da Marcele, você sabe quem é. E a Laya aceitou.
- Mas eu não vou poder aparecer – reiterou Graça, e logo olhou para mim.
- Bom, me desculpa, mas eu também não poderei – disse para a loura.
- Ei, vocês não me parecem gêmeos – disse a lourinha, descendo um olhar maléfico sobre nós. - Nossa, eu queria muito que vocês estivessem aqui, mesmo você bonitinho, que eu não conheço muito bem – disse ela, aproximando-se de mim. Pôs sua mão direita no meu queixo e ficou puxando para cima. Deve ter gostado do meu queixo quadradão. As mulheres adoram mesmo.
- Desculpe, mas mesmo assim ele não vai – disse Graça, tentando finalizar a questão. Eu tinha certeza de que a lourinha discutiria com ela.
- Tudo bem... não é da minha conta se vocês dois estejam entrelaçados, parabéns pelos dois estarem transando, eu bem que queria participar, mas acredito que até nisso vou ser rejeitada, né? - perguntou a lourinha, que recolheu-se novamente à cozinha. Eu iria abrir a boca para falar alguma coisa, mas Graça não deixou, pegou minha mão, nos levantamos e nos encaminhamos até a porta.
- Nós já estamos indo, desculpa qualquer coisa – disse Graça, séria.
- Para de pedir desculpas – disse a lourinha, lá de dentro. Depois disso Graça abriu a porta e saiu ao corredor comigo. Fechou a porta e enquanto eu tentava perguntar o que estava acontecendo a baixinha não pronunciou palavra alguma. Certamente as duas estavam brigadas e a lourinha ter tentado flertar comigo talvez tenha re-despertado as rusgas. O que eu poderia fazer? Nada, pois estava praticamente comendo na mão de Graça naquele dia. Depois que tomamos o elevador (sem a intimidade de antes) perguntei à Graça o que iríamos fazer naquela tarde. Ela respondeu: - Meu pai está voltando hoje de viagem e pretendo ir com minha mãe à rodoviária lá na Barra Funda. Já está quase na hora de voltar para casa.

Anoitecia. Eu adoraria permanecer ao lado da Graça, mas assim como ela também estaria ocupada recepcionando o pai eu também estaria, babando no corpo da Sasha Green – bom, tentando babar, já que era certeza de que muita gente estaria empatando meu caminho até a mulher, tão babões quanto eu. Nunca vi pessoas tão dispostas a aturar uma junkie de merda. Então, depois que saímos do apartamento Graça foi comigo até a estação de trem. Achava cedo demais para nos despedirmos, o tempo passou num riscar de fósforos, ainda faltava muita coisa para falar com ela, muito o que viver, mesmo se fosse por uma maldita tarde. Eu queria a Graça, ainda naquele dia, mas é foda, não podia ficar forçando a guria a se ocupar comigo, e como disse, eu também estava marcado para ver uma pessoa – e disputaria minha chance com a Sasha. De qualquer forma teria de me despedir da Graça.

- É uma pena que a gente tenha que se despedir – disse ela para mim, próximos à bilheteria do trem.
- Então, é só não se despedir, ué – disse para ela, sincero. Estava chateado, o que é um prato cheio para começar com minha rispidez.
- Nossa, não fala isso – disse ela, dando um tapinha no meu peito. - Você não precisa de nada, não quer que eu te ajude em alguma coisa ou algo parecido? Não precisa ter vergonha, é só me responder.
- Por que você acha que eu estaria passando necessidade? - perguntei a ela, ainda na rispidez.
- Ué, qual problema em dizer que tem? Não tá passando vexame, eu te conheço bem, sabe que eu não falo dos seus problemas pra ninguém – disse ela. - Vai dizer que não tem problemas também? Antes de você vir pra cá falou pra mim que passava por problemas financeiros...
- E você quer me dar dinheiro – disse a ela, esboçando um sorriso constrangedor. Falávamos tão baixo que felizmente ninguém ouvia, ou pelo menos não demonstrava estar ouvindo. - Tá certo que eu gastei uma grana preta fazendo o filme, até tive um bom retorno, mas mesmo assim eu tô na merda, só que eu não posso aceitar qualquer ajuda financeira sua.
- Você me disse que tá desempregado...
- Mesmo assim, não vou receber esmola sua, me desculpa... - disse eu, saindo do seu foco e me encaminhando à bilheteria, quando Graça me pegou por trás, pelas costelas. “Não sai assim”, disse ela, e eu já começava a ser observado por terceiros. Achei que queria me beijar. Virei o corpo e o rosto, toquei seu rosto a partir do maxilar, e ela ficou me fitando com um olhar sério, a boca fechada, como se esperasse alguma coisa. Como se esperasse um beijo. Dãã. Toquei com o polegar no seu lábio superior, ela abriu a boca e foi assim que eu a beijei, sem meter a língua, não queria me alongar naquilo.

Depois disso a Graça me abraçou gostosamente e se despediu de mim, continuei com meu coração duro, fui à plataforma para pegar o trem em direção à estação da Luz, sentei preguiçosamente no banco, e quando ele veio, quase o perdi, de tão entretido em meus pensamentos que estava. Puta que pariu. Achei uma porcaria de encontro.

Tanto achei porcaria que resolvi barbarizar, mas sem contar com Graça. Minha trajetória com ela naquele dia havia terminado, não tínhamos mais o que conversar, porque eu estava visivelmente insatisfeito, enquanto Graça tinha suas coisas para fazer – como disse, foi recepcionar o pai, que havia chegado de viagem. Certamente não daria mais um tempo para mim nem se eu implorasse ajoelhado. Vocês sabem, naturalmente família é mais importante que amigos, afinal, qual ser humano iria de contrário a essa corrente? Quando o trem em direção a estação da Luz chegou virei o rosto para trás, e Graça ainda estava me observando – típica pessoa que espera a pessoa pegar o meio de transporte para dar uma última despedida, o que é bem normal – e me deu um aceno, deu um beijinho na palma da sua mão esquerda e jogou para mim, com toda a graciosidade que lhe é familiar. Eu sorri, não tão contente assim, até porque não estava, mas acenei quase da mesma forma, para ela não achar que tinha se comportado mal. Graça fez sua parte, quem estava bronqueado era eu. Entrei dentro do trem e vi que ela me fitou até as portas de fecharem, e segundos antes de isso acontecer deu seu último aceno, dando uma palmadinha em seu próprio peito, passando a palma na boca e depois jogou para mim novamente. Eu já estava de saco cheio desse sentimentalismo excessivo, mas teria de me acostumar, pois, se eu namorasse com Graça e evoluísse até o casamento suportaria essa personalidade todos os dias. Quando a porta do vagão fechou respirei aliviado, como se tivesse tirado uma bigorna da minha garganta. E o trem partiu.

Pensei que Graça não seria tão lerda para sair do centro de Santo André e chegar em casa – bom, eu nem sabia exatamente onde ela morava, podia ser no centro, e aí? - , pois se fosse meus plano seria arruinado. Imaginei ela retornando para a sua casa pensando em mim, pensando no que errou para suportar uma pessoa tão chata como eu, mas ela sabia o tipo de terreno que estava entrando. Mal consegui me mover no trem e me aborreci por estar há centímetros de uma gostosona, uma morena de cabelos cacheados e olhos azuis, estilo “cavala”, quase maior que eu, peituda e bunduda. Tão perfeita fisicamente que parecia um travesti. Além dela tinha suas amigas, mais baixas e menos corpulentas, e eu não queria me mover para tocar em seu corpos, não queria ser tocado, mas por que eu ficava tão puto se sairia por aquela porta, caralho?

Invés de eu prosseguir com meu caminho até a Luz soltei na próxima estação, Prefeito Saladino, indo para São Caetano do Sul. Achava que era certo da Graça não morar naquelas quebradas, lembro que ela morava em Santo André, mas provavelmente indo para Capuava, indo para a cidade de Mauá, e mesmo se morasse na porra do Centro não iria me ver tão fácil. Saí daquele forno do cacete, dando dedo para as meninas e atravessei a plataforma para pegar o trem de volta a Santo André. A insatisfação parecia arrebentar minhas entranhas, o encontro não foi completo e não iria descansar direito se não conseguisse pelo menos 50% do que eu queria. Era foda, eu precisava parar de me perturbar, mas só solucionando o meu problema mesmo. Fazia um sol marotinho , e minutos depois tinha chegado o trem, no modelo igual ao do que eu tinha pego antes: com ar condicionado posto bem fraquinho, para o pessoal morrer de calor. Lembro que a morenaça lá tinha suor pingando nos peitões – só de pensar fiquei excitado, já tinha um pensamento que conservaria para a punheta de hoje à noite – eu devia ter sido mais gentil com ela. Ah, lembrei que não trato bem meninas comprovadamente piranhas.

Desci novamente na estação Prefeito Celso Daniel – Santo André, temeroso, achando que a Graça poderia estar ali perto, poderia ter encontrado uma conhecida por ali ou então feito uma boquinha, mesmo a gente tendo comido lá no shopping. O que fiz foi apressar meus passos, saindo da estação e cortando o mercadinho próximo ao terminal rodoviário, novamente subi a ladeira onde eu e ela descemos – quando saímos da casa de sua amiga - , num caminho diferente do Plaza. Eu olhava para trás um tempo todo, como se fosse um criminoso, se eu fosse pego pela Graça minha relação com ela iria terminar, tinha certeza disso, me foderia bonito. Foi quando tomei uma rua tranquila, na qual eu e Graça passamos antes de chegar na ladeira.. a rua do apartamento de sua amiga.

Eu estava tenso pra caralho. Ainda olhava para trás. Quando vi uma menina morena e baixinha achei que fosse a Graça, aquela sensação de adrenalina pingava no meu interior como um alfinete, estava ficando com falta de ar, mas tudo o que eu não queria era aparecer de semblante deplorável pro porteiro, existem porteiros que julgam as pessoas pela aparência e pela cara, e eu precisava passar por ele naquele dia. Cheguei na grade da porta principal da porra do prédio e chamei ele. Me identifiquei. “Eu sou o cara que esteve aqui há uns 30 minutos atrás, com uma amiga dela, a Graça”, disse a ele, que já estava refrescando a própria memória rapidamente. Daí, o paraibão passou a ligação para cima, a lourinha pediu para eu subir – invés de dizer “o que ele quer?”, se dissesse eu nem saberia o que falar – e com isso abriu a grade para mim. Estava suando, ele percebia isso, mas não disse nada. Subi de elevador, óbvio.

As palavras de Graça ecoaram na minha mente, disse que iria encontrar o pai, beleza. Mas, e se ela tivesse decidido voltar para o apartamento da loura e eu achasse ela lá? Não, era certo de eu ser interceptado lá na entrada, pois provavelmente ela passaria a bola para Graça, que me questionaria. Claro que não sabia até onde a Graça era amiga dessa lourinha, então teria de me cuidar até para falar as coisas com ela. Pelo seu jeito iria me encher de besteiras, e não duvidaria se caguetasse para a moreninha que eu estava na sua casa. Sinuca de bico.

Saí do elevador com dificuldades, pintou um cansaço tão filho da mãe – aliado ao extremo calor que eu sentia naquele forno que chamam de trem – que me fazia curvar, arquear as costas e quase me arrastar pela parede. Não haviam câmeras no corredor do andar, então não precisava me preocupar em conseguir meus minutinhos de fama, pois não teria. Eu fazia um cu doce tremendo para chegar à porta do apartamento 1005, com um misto de medo e insegurança, eu não sei o que faria com a lourinha se ela me caguetasse para a Graça ou até mesmo para a Laya, que caguetaria para a Graça. Mas não tem como ser transparente com meu plano. Necas de pitibiriba. Apertei a campainha e esperei o pior. 2 segundos depois a porta estava sendo aberta.

- Olás – disse a lourinha, me fitando com seus olhos azuis, na porta entreaberta. Pude ver suas pernas nuas e longas brilhando à luz do sol. Tinha o sorriso maroto e meio sacana, que tinha conhecido antes. - Tudo bem contigo?
- mmm... - eu murmurava de um modo ininteligível, não estava mesmo afim de falar, num estado daqueles. Mas olhava nos seus olhos, só que para ela, claro, não foi o suficiente. Eu segurava minhas mãos na parede, de tão cansado que estava.
- Cadê a Graça? - perguntou ela, desmanchando o sorriso. - E cadê sua língua? Não taí na tua boca? - perguntou ela, abrindo a porta para se aproximar de mim. Usava uma camisola curta branca e uma blusa de manga comprida e quadriculada. - Deixa eu ver se ela ainda tá viva.
- Espera aí! – E a lourinha se aproximou de mim, metendo os dedos indicador e polegar da sua mão direita na minha boca, sorrindo, como se fôssemos amigos íntimos. Passou os dedos no céu da minha boca enquanto, com outra mão, segurava minha cintura. Depois tateou minha língua e puxou a sua ponta, me machucando. Se afastava para o interior do seu apartamento, e como eu não tinha escolha fui com ela. Como ela aparentemente não sabia onde estava pisando não demorou para ela tropeçar num canapé da sala de estar, e nós dois fomos ao chão, é claro. Pude ver sua calcinha branca. Acabei ficando em cima dela, mas ela não estava reclamando, seus seios estavam pressionados no meu peitoral, e suas coxas entrelaçadas nas minhas. Parece que ela queria ficar desse jeito mesmo. Nunca humano algum me recepcionou de forma tão bizarra quanto ela. Mesmo assim eu tava me divertindo com seu jeito. - Viu o que você fez?
- Seu babão! - exclamou ela, tirando os dedos da minha boca e passando a baba no meu ombro. Em represália me aproximei mais do seu rosto sardento e pálido e lambi todas as suas duas faces, com a lourinha socando minhas costas e se sacudindo. Socava tão leve que parecia estar gostando do meu banho de língua, parou de se sacudir rapidamente, parecia que estava ajustando suas coxas nas minhas do que querendo que eu saísse de cima dela. É, não sabia fingir. - Além de babão é porco! - disse ela. Mas não foi ela que tinha começado com a porqueira, caralho? - Nossa, por que você fez isso? - perguntou, secando seu rosto com os braços.
- Ué, não foi você quem começou? - perguntei a ela, quase estirado no chão, enquanto ela se levantava.
- É, eu comecei, mas não precisava lamber o meu rosto todo... e olha que eu nem tomei banho direito hoje... - disse ela. - Para de ficar olhando pra minha calcinha! O que você veio fazer aqui, sem a Graça?
- Acha que eu só posso vir pra cá do lado dela? - perguntei.
- Não, mas é, tipo, o seu primeiro dia na minha casa, por enquanto você é um estranho... um estranho bem bonitinho, mas mesmo assim um estranho – disse ela, sentando no sofá.
- Você sabe o telefone da Laya?
- Por que não perguntou pra Graça? Se não perguntou é porque tem treta por aí... - disse ela, com sorriso sacana.
- Não tem nada a ver, eu queria falar com a Laya, independente de eu ser amigo da Graça, tenho esse direito, não tenho?
- Tem, mas você não tem direito de machucar os sentimentos da Graça, pois ela é como uma irmã pra mim, eu sei o que você pretende – disse a lourinha para mim, contorcendo seus beiços rubros. - Ela sempre falou bem de você, e eu sempre acreditei nela, digo, nem tanto, porque os homens costumam enfiar a faca nas costas das mulheres...
- Não vem com essa, tá me dizendo que não tem mulher safada e que engana?
- Claro que tem, eu sou safada, mas não engano os outros.
- “safada” de um jeito que você sabe bem...
- Mesmo assim não te dá direito de machucá-la! - disse ela, quase bradando. - Aliás, o que você viu na Laya? Não sou de falar mal dos outros, Deus sabe disso, mas só sendo um completo imbecil para trocar a Graça pela Laya. E como os homens são imbecis por natureza...
- Eu não estou enganando ninguém. Não tive relacionamento nenhum com a Graça além da amizade. Pode perguntar pra ela se você quiser, oras.
- Mas não é preciso ser um gênio pra você entender que está fazendo besteira. E a Graça gosta tanto de você... tá me dizendo que não sente porra nenhuma por ela?
- Ah, a lourinha sabe xingar – disse para ela, sorrindo como um safado. - Pode deixar que eu me entendo com a Graça depois, não precisa fazer nada – mal terminei de dizer isto e a loura passou a mão em seu aparelho celular, tentando efetuar uma ligação para a Graça, a baixinha e graciosa Graça. Isto me desesperou, claro. Fui até ela com assombrosa rapidez e prendi seus dedos, que estavam ansiosos para apertar os botões. Ela queria mesmo me caguetar para a Graça, e se ela soubesse que eu queria ter alguma coisa com a Laya, me foderia bonito. E eu precisava da Graça , considerava cedo demais termos uma ruptura logo tão cedo. E olhe que nem tinha beijado a boca dela com gosto. Eu queria tê-la, mas a minha necessidade em querer comer o cu e a boceta da Laya falava mais alto. Não era a primeira vez que tinha sido um canalha. Mas eu ainda poderia mudar de id´peia.
- não adianta fazer isso, vou ligar pra ela de qualquer jeito, mais cedo ou mais tarde. A gente é unha e carne, já era pra você.
- Não, você não vai ligar – e, como desesperado que estava peguei ela pelo colo e coloquei em seu sofá, mas ela não relutava, tampouco abrira aboca para reclamar. Só depois que alisei seus cabelos que ela me disse – Agora você vai mesmo bancar o safado. Vá em frente, então.
- Ok, foi mal, me desculpa – disse a ela, me levantando. Não disse mais nada, me recompus e me preparei para sair fora do seu apartamento.
- Cara, espero que isso não se repita novamente – concluiu ela, vendo-me dar linha na pipa.

Certo que depois dessa iria me foder de verde e amarelo.

Depois daquilo tinha a plena certeza de que pioraria a minha situação com Graça ao ponto dela desmanchar o resquício de relacionamento que tínhamos. Acabou para a gente, porque de qualquer jeito a lourinha falaria para ela, e eu teria o meu pescoço cortado. A batalha no momento era me esforçar para não me sentir tão incomodado com isso, porque coisas assim pairam pela minha cabeça por dias, talvez semanas. Não tratava-se de um trauma tão grande, mas já me fustigava, deixava uma rachadura no meu peito – e eu já tinha uma porrada de traumas, bem maiores que este, construídos entre a minha infãncia e pré-adolescência – , até poderia sarar, mas ia demorar. Eu não devia ter sido tão imbecil assim com uma pessoa tão boa, quase sempre perdi pessoas queridas na minha vida, relacionamentos terminavam de forma indesejada, na maioria das vezes por minha causa. Eu já estava saindo do prédio, minha vontade era de subir lá em cima de novo e implorar para a loura não falar nada para Graça, só que estamos tratando de amigas que – aparentemente – possuíam uma relação forte, sólida. E eu, que mal conheço a Graça, estaria ainda pior na fita, já que a própria também não conhecia o meu “lado B”. Eu, que sempre quero presenciar o “lado B” das pessoas prejudicaria uma que – aparentemente, de novo – é desprovida desse tipo de coisa.

Entretanto, não dava o jogo por encerrado. Eu ainda podia virar a mesa. Teria de retomar meu contato com a Graça naquele dia, mesmo ela estando compenetrada em recepcionar o papaizinho querido, o que custava ela atender minha ligação de novo? Por isso mesmo, cheguei à estação ferroviária já me aboletando no telefone público, peguei meu cartão e inseri ali, só tinha 3 unidades – e como tinha o número do celular da criança não teria tanto tempo para conversar, tinha que ser objetivo. E embalado nisso, liguei para a Graça. “Oi, Gil, já chegou em casa?”, perguntou a mulher.

- Não, ainda tô longe – respondi a ela. - Olha só, eu tive que voltar pra Santo André.
- Por que?
- Bom, deixa eu falar logo: eu fiquei atraído pela Laya, por isso que voltei à casa da lourinha pra perguntar se ela tinha o telefone dela.
- Tá falando sério? Você fez mesmo isso? - perguntou ela, pasma. Eu já esperava o pior.
- Ela provavelmente iria me dedar pra você, achei melhor que soubesse por mim. Eu desci na Prefeito Saladino, peguei o trem de volta pra Santo André e falei com ela. Aliás, qual o nome de...
- Freya. Se pronuncia “Frêia” - disse a Graça, com voz entristecida. - Ela realmente iria falar pra mim, ela não te conhece o suficiente. Você já pagou sua passagem?
- Não, mas tô na frente da bilheteria.
- Bom, eu queria muito falar contigo...
- “Mas”?
- Não tem “mas”, pra sua sorte o papai vai voltar um pouco mais tarde, então a gente marca pra se ver numa praça aqui pertinho de casa. Tá?
- Me passe o endereço.

Fiquei surpreso, ela não soltou os cachorros pra cima de mim, como eu esperava. Normal que um ser humano tivesse feito isso, mas ela, tranquila de tudo, fez o contrário. Terminei sorrindo por causa disso, mas sabia que não poderia cantar vitória antes do tempo, nada estava ganho, mesmo se ela não brigasse comigo e prosseguisse com nossa amizade intacta, bem no fundo ela guardaria a lembrança, pelo menos tivesse um resquício de ressentimento, e com isso ficaria mais esperta. Poderia ser a mesma femininazinha de sempre – e isso era natural e próprio de sua personalidade – , mas estaria fustigada pela merda que fiz, eu não seria mais tão confiável assim. E como meninos vêm e vão na vida de jovens como elas... gostava de um cara mais velho (eu, dãã!), se se decepciona com gente de sua idade, como seria decepcionando-se amorosamente por um cara de 27 anos, como eu? Mais uma vez prejudicaria a mim mesmo.

Saí da estação e fui direto para a Praça Presidente Kennedy – enquanto que a Freya morava na rua das Monções, que quase dava no Grand Plaza Shopping – ah, agora lembrei o nome do shopping. Óbvio que tive de perguntar onde situava-se a praça, não conhecia a cidade. Em menos de meia hora eu estava lá, sentei-me num banco e relaxei, cruzei as pernas, tomei um copo de leite puro, e quando respirei fundo, de papo pro ar, olhei de soslaio Graça chegar, dessa vez trajando uma calça cinza, sapatos sociais marrons, cinto marrom à mostra e camisa sem mangas vermelha e amarela. Seus cabelos estavam soltos. Do relaxamento passei à tensão, se aproximou sem falar nada e sentou-se ao meu lado.

- Que bom que você foi sincero comigo – disse ela, iniciando a conversação. Eu estava envergonhado. - Se eu tivesse ouvido pela Freya acho que deixaria de falar contigo por um bom tempo, ou então não falaria. Só que você revelou pra mim baseado na sua... absolvição, né? Achou que assim eu iria pegar leve e iria perdoar o que você fez só porque saiu na frente dela.
- Sim, foi isso – disse a ela. - Mas eu também tô arrependido.
- Será que está mesmo? - perguntou, chegando tão próximo de mim que parte da sua coxa subia em cima da minha e seus grandes olhos castanho-escuros fitavam os meus, e eu tentava não sair da linha destes, não queria passar por alguém inconfiável, especialmente para uma pessoa tão especial quanto ela. Graça não merecia isso e qualquer um concordaria comigo. - Olha pra mim, por favor.
- … - e eu olhava, a fitava assim como ela fazia o mesmo comigo. Seus lábios fechados e estáticos estavam ainda mais vermelhos que antes, fechados que forma a influenciar na forma de suas bochechas, e Graça já envolvia seu braço esquerdo na borda do banco, caindo com a mão pequena nas minhas costas largas, parecia estar fazendo uma brincadeira comigo, do tipo “quem olhar mais o outro ganha”, e eu entrei nessa, sem tirar meus olhos dela. Estava triste comigo? Estava. Puta? Talvez, talvez estaria, mas do seu jeito. Suportava olhar para ela, mas o que não suportava era permanecer com o resto do corpo parado. E eu não sou um sujeito hiperativo, se tiver de ficar quieto fico numa boa, mas naquele dia eu queria tocá-la, compensar o meu erro. Péssimo jeito de compensar meu erro. Toquei sua cintura e subi até chegar em suas costelas, Graça não se movia, tampouco deixava de me olhar. Estava me devorando. Era mais poderosa que eu, caralho. Mesmo assim, já com a mão em suas costelas, movi meu rosto para o seu, sem deixar de olhar, mas movi meus lábios, pois precisava falar. - Me desculpa. Me desculpa, Graça, por favor.
- Desculpa? - murmurou ela. Passou um casal filho da puta olhando para nosso chamego. Deixei de olhar em seus olhos quando evoluí em minha sedução: alisei suas costas enquanto beijava seu pescoço, um pescoço lindo, mas ela não se movia tanto. Não movera os braços, apenas as coxas (já que lentamente eu avançava em cima dela), minha sedução fora genuína, não fiz aquilo para fazê-la mudar de foco, como ela já sabia, eu a queria. Depois que percebeu sua falha em me fazer fitá-la durante o dia inteiro (haha!) moveu suas mãos e passou-as pelo meu peito. Já tinha seu corpo colado no meu, a abraçava, e quando fui beijar sua boquinha Graça me empurrou violentamente. Bati a nuca na borda superior do banco de madeira. - Cara, você não pode ser falso comigo.
- Não tô sendo falso... beleza, pode tomar a decisão que quiser, eu peço desculpas, sinceras desculpas por querer procurar a Laya. Isso não vai mais acontecer.
- Claro que não – disse ela. - Eu iria te mandar pastar agora, mas penso em tudo que a gente conversou e não consigo acreditar que você mentiu em tu...
- Ei, ei, ei, pera lá, não menti em absolutamente NADA do que conversamos no MSN – disse para ela. - Nada. Eu ter me atraído pela Laya é uma coisa totalmente diferente disso, não tá no mesmo balaio, calma lá. Mas era só algo... carnal.
- E daí, isso não minimiza o estrago – disse ela, que levantou-se da cadeira, pegando minha mão. Saímos da praça e chegamos até uma barraca de cachorro quente. - Tá com fome?
- Eu disse, não precisa me aju...
- Moço, dois cachorros quentes.

Sentamos em uns banquinhos de plástico da barraca, que tinha uma televisão de 14 polegadas. Éramos os únicos. Percebi que vinha purê de batata no meu cachorro quente, PURÊ DE BATATA NO CACHORRO QUENTE, PUTA QUE ME PARIU! Paulista é foda. Foi o suficiente para eu dar altas gargalhadas, tal qual um louco, e quando vi que estava constrangendo Graça, parei. Ela estava tão bonitinha perto de mim, comendo aquilo e fazendo uma cara muito fofa enquanto mastigava e tirava os restos dos lábios com os dedos. Eu sabia que ela estava tendo muitos pensamentos, arquitetando sobre o que iria fazer comigo, se me despachava para a solidão total novamente – se bem que eu não estava deixando de ser sozinho, visto que ainda não era de fato namorado dela – , o futuro a ela pertencia, eu não podia fazer nada além de esperar seu veredicto. Tava foda, eu me sentia um brinquedinho nas mãozinhas curtas dela. Confortável e tudo mais, mas mesmo assim um brinquedinho. Quando o moço da barraca se ocupava eu acariciava o joelho e o início das coxas da Graça, que comia e olhava para mim sem emitir qualquer palavra, mesmo um protesto. Não movia suas coxas para me enxotar, também.

- Você está muito bonita – eu disse para ela. - Está desse jeito porque iria encontrar o pai?
- Isso – respondeu ela. - Te falei que ele vai chegar um pouquinho mais tarde, então eu já me arrumei. Depois de te botar no trem de novo eu volto pra casa e certamente mamãe vai me levar até o terminal.
- Ok... - disse, vendo ela terminar o último pedaço do cachorro. Repentinamente pegou minha mão, levantou-se e saiu dali comigo. Não olhava mais pra mim, olhava para a frente, somente para a frente. Eu me achava o maior por estar andando por aí com ela de mãos dadas, já que era uma pessoa muito bonita e delicada, o tipo e mulher que desde a segunda metade dos anos 80 esteve em falta. E eu me lembro muito bem da década de 80.

Então, eu e Graça caminhamos até a estação de Prefeito Celso Daniel – Santo André (que até pouquíssimo tempo era chamada de São Bernardo). Antes não tinha prestado atenção na beleza simplória dela, toda feita em arquitetura vitoriana, desde a casa até a passarela de ferro que unia as duas plataformas, a em direção à Santos (litoral do estado) e a em direção à cidade de Jundiaí, um tanto antes de Campinas, já se embrenhando no interior. Tive uma vontade louca de sair viajando de trem para o litoral e de lá descambando para o sul do estado do Rio, mas deixei essa bobeira de lado, pois tinha algo para fazer. Fora isso, precisava me reconciliar de verdade com a Graça. Não era preciso ser gênio para sacar que ela estava aborrecida por dentro. Na minha cara, sacou seu celular e ligou para a Freya, dizendo a ela para não recebe-lo sem seu aval novamente. Falava olhando para mim. Quando Freya assentiu, se despediram cordialmente. Desta vez, ela que pagou minha passagem. Passei a catraca. Graça tocou meu rosto e beijou minha boca, boca aberta a boca aberta, mas ainda sem meter a língua – mesmo assim pude sentir seus lábios e sua saliva, o que era muito bom. “Não me faça sofrer”, disse ela, concluindo nosso encontro de hoje. Virou as costas e saiu fora, sem olhar para mim.

O trem em direção à Jundiaí tinha chegado, mas claro que iria soltar na Luz para baldear pro metrô.

Pelo jeito iria me acostumar com os serviços da São Paulo Railway. Não tinha o mínimo interesse de utilizar os ônibus (pouquíssimos na capital) e bondes (abundantes) – mas quando tivesse necessidade, claro que usaria, já que as estações ferroviárias não cobriam toda a metrópole – , até quando tivesse de visitar novamente a Graça – isso é, se nosso relacionamento engrenasse de verdade. Minha vontade era de, além de conhecer o litoral paulista, de me embrenhar no interior, e as estações ferroviárias estavam ali para isso. Eu já conhecia boa parte do interior do meu estado – Rio de Janeiro, evidente – , chegando a ponto de considerar algumas localidades como “minhas”, mas não no sentido de posse, apenas achava que deveria dedicar meu amor àqueles lugares, passar ali sempre que possível, seja nas férias, seja nas minhas festas de aniversário (mas eu não desfrutava de festas minhas desde 1996), tinha a certeza de que a situação dali em diante melhoraria. Estava confiante, porque não amargava a solidão total em São Paulo e nem voltaria para o Rio com as mãos abanando. Eu tinha a Graça, o que já foi citado inúmeras vezes aqui. Tinha a confiança de que executaria muito bem o meu trabalho na cidade, trabalho este que ainda não estava tomando meu tempo e meus esforços, ainda não pegara no pesado do jeito que eu imaginava, desde o dia em que fui convocado. Se minha relação com Graça evoluísse poderia levá-la comigo ao Rio. Mas ela tinha quem ali em Santo André? Sua mãe, e isso já era bem importante e com certeza atravancaria meus planos de tê-la comigo, pelo menos por um tempo, até a própria Graça se emancipar – pelo jeito não tinha a menor pressa em fazer isso. Além disso, ela tinha a Laya, mais velha e, apesar de ser mais liberal, vestia uma capa de mistério que notei logo à primeira vez que conversamos. Eu não apenas estava com vontade de passar meu pênis nela, não era apenas desejo sexual, essa tal capa de mistério também me paudurecia. Isso eu não vi – ou não notei – na Graça, que sempre fora gentil e carinhosa comigo, seja no MSN ou pessoalmente. Na verdade, eu queria apenas foder com a Laya, e pelo jeito, ela faria isso sem o mínimo compromisso, o que eu realmente queria, pois desejava firmar meu relacionamento com a Graça. Então, só queria uma foda. Pelo menos 2 ou 3, queria vê-la gemendo ao pé do meu ouvido, queria mamar seus seios, meter bem agarradinho... Laya poderia me proporcionar isso a qualquer hora, se quisesse, enquanto que talvez teria dificuldades de desfrutar essa liberdade com Graça na hora da transa. Tinha a mó cara de que chuparia meu pau com uma ridícula delicadeza, choraria quando meteria em sua buceta e não gostaria de levar no cu, ou então guardava um instinto selvagem que talvez fosse maior que a de Laya... ou então a própria Laya não fosse lá aquelas coisas no sexo. Eu podia me surpreender bastante com algumas pessoas, não julgava que todas eram um poço de previsibilidade, pois não eram, eu não conhecia a mente das 6 bilhões de almas que estão na Terra.

Cheguei à Luz e antes mesmo de sair do vagão fui empurrado pela turba que se dirigia a ele. Tive que ser violento com um idoso que bloqueava a minha passagem com a sua lerdeza, quando ele deveria esperar a galera entrar primeiro antes de se aventurar, entrando com todo mundo que empurrava quem queria sair. Se entrasse depois qualquer malaco levantaria da poltrona para oferecer a ele. Não saí pela rua Cásper Libero, que rumava para o Centro, tive que sair pelo lado que dava no Parque da Luz. A estação estava apinhada de prostitutas e vagabundos. Andei mais um pouquinho e cheguei na esquina com a avenida Tiradentes. Como antes, teria de percorrer parte dela para chegar ao metrô Armênia, e de lá, prosseguir na Pedro Vicente para chegar em casa.

30 minutos depois já estava em casa. Tava louco para mexer no laptop, ver os emails das poucas pessoas que entram em contato comigo. Cheguei na Cohab com a canela esquerda doendo, pois tinha andado e permanecido em pé quase o dia inteiro, já sentia esta dor quando saí da Prefeito Saladino – putz, lembro que não tinha quase nada naquele local que circundava a estação de trem – para Santo André, o que deu mais motivo para eu querer me sentar na cama, botar o laptop no colo e navegar. Eu estava precisando de uma cama, mas também precisava beber alguma coisa. Por isso, antes de subir as escadas, fui ao bar comprar uma Coca de 2 litros, além de comprar uma quentinha. Aqui eles chamam de “marmitex”, e do pouco que vi os paulistanos “da gema” já incorporaram a interjeição nordestina “Osh” no seu vocabulário. Antes de entrar, notei um falatório em língua espanhola que ecoou na minha cabeça desagradavelmente. E como quem fala espanhol fala rápido, não entendi porcaria alguma – eu manjo um pouco de espanhol, huehe. Voltei a subir as escadas, e quando alcancei, mais alguns degraus ouvi mais uma vez, vindo lá de cima. Solas de chinelos eram batidos nos degraus, alguém descia freneticamente, e logo topei com uma gordinha evidentemente boliviana descendo as escadas tão rápido que tropeçou e caiu, mas sua gordurinha – haha – só facilitou sua queda livre até lá embaixo. Seria pior se eu não fosse ágil, pegando suas dobrinhas com a mão direita e seu tronco com a esquerda. Ela sangrava no canto da testa, o sangue se misturava com mechas do seu cabelo negríssimo e muito liso. Me preocupei mais com isso que com sua cara de lua e nariz adunco, mas tinha as mãos em seu corpo. Com o desespero, tinha suas mãos em meus braços. Como impedi sua queda e tudo parecia estar bem (menos sua testa) ela se sentou no degrau. “Você tá bem?”,

- Tô bien – disse ela, inaugurando o portunhol ao falar comigo. - Obrigada.
- O que fez você descer desse jeito? - perguntei a ela, encantado com a forma roliça do seu corpo.
- Ah... briguei com alguém – respondeu, olhando para mim. Ela era linda, mas linda do jeito boliviano. Toquei sua ferida, ela ergueu os olhos e viu o sangue escorrendo dos meus dedos para o resto da mão.
- Vou dar um jeito nisso aí, levanta – disse a ela, que prontamente disse que não queria subir de novo. - Não sou amigo de quem quer que seja daqui, então, fica tranquila, não vou fazer nada. - Notei que mesmo assim ela rejeitava, pois talvez achava que a tal pessoa lá em cima ainda estaria do lado de fora, mas fiz mais um esforço. - Vamos lá, dá uma chance, ele ou ela, não vai estar do lado de fora.
- Tá – disse, segurando meu antebraço. A boliviana trajava uma calça jeans bem apertada, chinelos Havaianas brancas, casaco branco e manchado e seu cabelo quase azul de tão negro estava em rabo de cavalo. A estatura eu já disse uma parte, mas direi tudo agora: baixa (como pelo menos 90% dos bolivianos), pernas meio tortas, braços curtos, pouco ombro, além das costas ser meio curvadas. Não deu pra ver direito o volume dos seus seios, mas não eram pequenos. Então foi isso: ela subiu o resto dos degraus comigo e quando chegamos no meu andar, o último e de onde ela desceu, viu que não tinha ninguém no corredor. “Viu? Não tem ninguém”, disse a ela, sorrindo. Mais uma vez, toquei a ferida de sua testa, e ela pressionou com a própria mão tentando estancar. Só sujava a porra toda de sangue. Peguei minha chave e abri a porta do meu quarto, ela entrou, meio ressabiada.

Eu tinha trazido uma milimétrica caixa de primeiros socorros, caso eu me fodesse durante a viagem, mas pelo jeito, ainda não tinha usado. Qual foi a última vez em que me feri nas minhas viagens? Nenhuma, acho. Já peguei umas coisas tolas, como o bicho do pé lá na cidade de Canavieiras – Sul da Bahia – , pelo jeito só isso, entretanto, imaginava que aconteceria algo ruim em São Paulo. Para a sorte da moça eu estava com aquela caixinha, então pedi para ela relaxar e sentar na cama. Fechei a porta, e ela ficou me fitando, como se pensasse que eu quisesse estuprá-la ou algo do tipo. Não vou dizer que não valeria a pena penetrar nela, muito pelo contrário, valia sim, senhor. Parte da iniciativa de tê-la colocado dentro do meu quarto – que mesmo sendo de aluguel era meu até que eu fosse embora – foi calcada na minha “paudurecência”. Ela era gostosa. Tinha até mais corpo que a Graça, que também era tão morena quanto. Geralmente bolivianas não estão no meu “menu” de alvos usados na minha masturbação, pois sempre as achei sem corpo. Esta opinião estava mudando.

Já que o sangue não parava de descer e que não demoraria para manchar seu casaco, pedi para ela tirá-lo. Meio relutante, atendeu meu pedido, ainda me olhando firme e com a boquinha entreaberta, enquanto eu tirava os instrumentos da caixa de primeiros socorros. Quando viu que eu não apresentava segundas intenções no rosto, abriu o zíper no centro do casaco e o tirou, sem olhar para mim, e eu aproveitava essa deixa para fitar seu corpo: braços curtos, mas grossos. Seios de tamanho normal, meio separados, com sua aréola e mamilos tão grandes que pareciam botões, só que ela não tava pelada, mas sim com uma camisa regata roxa e bem justa.


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REVERIE: COMEÇO DA PARADA Empty Re: REVERIE: COMEÇO DA PARADA

Mensagem  Admin Dom Fev 20, 2011 3:04 pm

REVERIE: COMEÇO DA PARADA Britne-Oldford-1

Não demorei muito para fazer um curativo naquele canto de sua testa. Ela permanecia imóvel, pude sentir sua respiração, estava ofegante, passados poucos minutos do acidente que sofreu. Queria ficar calma, mas como para mim ela não chegaria a este estado zanzando para lá e para cá decidi que ela poderia ficar um pouco comigo, deitada na minha cama e desfrutando de minha companhia... mas faltava combinar isso com ela. Além disso, antes de dizer que estava tudo bem com seu machucado – pus um band aid nele – e ela me agradecer quis tocar no seu corpo, pelo menos nos seus ombros... em suas costas, até chegar à sua cintura. Estava com a maior cara de que não iria deixar, normalmente pessoas que aceitam ser medicadas pelos outros em casas desconhecidas não querem terminar por transar com o anfitrião, e a pessoa tinha de que ser muito carente ou muito safada para tal, ou as duas coisas. Pelo pouco que notei dos bolivianos essa galera são muito na deles, não são de fazer amizades tão abertas com pessoas que não eram de sua etnia, do seu tipo, o que considero até normal, visto que até hoje nem todos os descendentes de japoneses são liberais – acho que neste caso vem a personalidade comum deles, independe do tempo que está instalado em tal lugar. A coisa é que eu a queria naquele dia, nem que fosse para uma transa amiga, não acreditava que existissem bolivianas que se sujeitariam a isso – acabei falando como se fosse algo repulsivo, entretanto, não era. Qual o problema de dar uma foda uma, duas vezes, se ambas as partes concordassem? E ela ficou parada, eu estava de costas para ela, parecia que esperava o meu próximo passo, seja ele sexual ou não. As coisas nunca foram tão fáceis para mim desse jeito. Nunca. Sempre fui um merda nas coisas do coração e do sexo e me prendia a este estigma, talvez fosse assim porque no fundo queria que fosse, ou não. Ah, claro que não.

Então, eu toquei seus ombros curtos e acariciei seus braços enquanto dizia “você é uma menina muito bonita, não entendo o por que de você brigar com alguém... isso não combina contigo”. Me aproximei um pouco do seu rosto, ainda alisava seus braços, parei quando fui beijar sua face e sua orelha, e quando lambi esta última foi a gota d'água para a boliviana, que saiu da cama e vestiu seu casaco. “Muito obrigada, mas eu já estou indo”, disse ela, percebendo o que teria, se permanecesse no meu quarto. Por dentro, comecei a me desesperar. Levantei da cama – eu estava tão excitado que qualquer pessoa perceberia meu pau querendo irromper da cueca – e quando ela viu sentiu ainda mais vontade de desparatar do lugar. Tateou a superfície da porta, quando achou a maçaneta, obviamente abriria, se eu não a pressionasse levemente na porta. “Pera aí, não precisa se assustar desse jeito”, disse para ela, tocando fundo sua barriga, sentindo a fofura da sua gordura, meus lábios se aproximavam dos dela, que, ao invés de se excitar, sentia medo e jogava esse medo na minha cara, como se dissesse: “eu não quero nada com você, seu imbecil!”. Não queria.

Toquei a mão que segurava a maçaneta e abri por ela. Pedi desculpas, foi embora. “Vê se olha direito para a escada dessa vez!”, bradei para ela, e acabei sendo observado no pátio, debaixo, pela família que me acolheu pela manhã. Viram a mulher descer as escadas com rapidez, e eu observando-os, pensando “puta que pariu, meu filme vai ser queimado”, mas estava na torcida para que pensassem que ela era uma prostituta. Fechei a porta e demorei para me sentar, foi quando vi que a boliviana esqueceu o seu RG, sua carteira de identidade.

“Ximena Gomez Estrada”, li. "Data de Nascimento: 10/11/1981". Pena que não tinha o endereço, mas a veria de qualquer forma, pois iria retornar. Deixei sua identidade no meu "borso", tirei a calça e fui para o banheiro, onde, pensando nela, me matei na punheta.

O dia ainda não havia terminado, chegou a noite e eu precisava me preparar para a coletiva com a cantora e atriz Sasha Green. Eu praticamente sabia de tudo sobre a criatura, conhecida por atiçar o coração dos descolados safados que vivem buscando pornografia na internerd, e me dava orgulho em dizer que era totalmente diferente deles. Tipo, nem descolado eu era, gozava de uma personalidade mais palatável, além de não colocar o sexo como pilar principal da minha vida. Bom, a quem eu quero enganar, afinal de contas? Beleza, como vocês viram eu pensava em sexo, mas não tanto quanto os retardados que compunham essa massa de pervertidos, nem fetiche sexual bizarro eu tinha! Por isso mesmo, por essa diferença eu teria de me fazer valer, de impor minha importância e superioridade para eles, provando que eu era merecedor de estar ao lado dela. Ela não estaria frente a frente com um imbecil bombado sem nada na cabeça, mas também não estaria frente a frente com um virgem de merda que calça All Star e assiste anime. Eu era o meio termo, mais um motivo para fazer valer minha personalidade e minha superioridade. E nem precisava dizer o que eu precisava dela, além do ar de sua graça. Tomei um banho, me produzi todo, carreguei no desodorante. Trajava uma camisa vermelha – Sasha tem o vermelho como sua cor preferida – , calça jeans preta e coturno. Penteei-me para trás e decidi não levar nada para o encontro. Tirei qualquer resquício de barba ou bigode – porque Sasha disse não curtir homens de bigode e barbados, o que a diferenciava da preferência nacional. Eu estava pronto. Se eu disse que iria ser melhor que eles, sim, eu seria melhor que eles, provaria isso, era só os filhos da puta marcarem bobeira pra ver só... fomentado por este sentimento, saí do quarto rindo. Eu ainda pensava se a boliviana, a Ximena, fosse voltar para pegar sua carteira de identidade, mas como passaram 3 horas de sua despedida assustada, não julguei que ainda seria preciso esperar. Eu tinha algo para fazer, tipo, uma buceta para foder.

A concorrência seria pesada. Eu sabia que sofreria um pequeno baque no coração vendo a turba de pervertidos – falo isso como se também não fosse um, haha! - babando por ela, quase em cima dela, querendo tocá-la de qualquer jeito, os olhos arregalados, os cuzinhos piscando, quase todas as aberrações incluídas em suas mentes, bissexuais, zoófilos, nego que curte um strap-on, necrófilos em potencial, gente que punheta para Hentai, pedófilos, etc. e tal, o nome de Sasha passava como um vendaval que carregava e arrebatava os corações de todos estes putos, estas pessoinhas que em sociedade, se comportam como cordeirinhos. Vindo junto com o baque teria o desencorajamento, pois sim, a mente pediria que eu chispasse fora do saguão daquele lugar, só os mais fortes sobreviviam, digo, só os mais fanáticos para conquistá-la, e olhe que por um grande período de minha vida fui um moleque com zero de auto estima.

Eu tinha dito anteriormente que a Sasha Green era junkie, certo? Errei, pois ela não usa drogas, e beberica um ou dois copos de vinho, e também depende do tipo de vinho. Sempre prefere os tintos ou os de sabores diferentes, como abacaxi ou morango. Não suporta cerveja, porque odeia o gosto amargo desta – calcando-se apenas nas Pilsen, quando tinha outros tipos bem mais saborosos, falo isso, mas não sou cervejeiro, não – e não fuma. Acha que “quem fuma, fede”, e eu concordo com ela. Sem contar que, se bebesse e fumasse não conservaria seu corpo tão gostoso até os dias atuais. O que não dá é para beijar uma mulher com bafo de cigarro ou de bebida. Só de pensar embrulhava meu estômago, mas sempre é esquisito e ao mesmo tempo engraçado tentar associar uma mulher linda a coisas repugnantes, como por exemplo, pensar na Charlize Theron arrancando um furúnculo do rabo (com jorros de pus e tudo), ver a Cameron Diaz fazendo careta enquanto caga ou a Anahí pegando no cocô. Esquisitaço, não? Pensar em coisas tão absurdas como essas me fez rir um bocado, e terminei por trancar meu quarto gargalhando a plenos pulmões, descendo as escadas da mesma forma, além de ser observado pela irmã do meio – daquela família que me acolheu pela manhã – , que trajava uma camisa branca justa de um time de futebol – acho que era São Paulo, não sei se já disse aqui, mas só viado e mulher torce por esse time – e uma bermudinha que deixava à mostra a maior parte de suas coxas. Queria ver também deixava à mostra as bandas das suas nádegas, mas para isso eu teria de vê-la de costas, eu não tinha tempo para bolar um plano mirabolante só para incluir mais uma lembrança para a punheta. Pus a mão atrás do bolso para conferir se o RG da Ximena estava comigo, não podia perdê-lo. Neste caso, seria melhor deixá-lo dentro do quarto, entocado em minha mochila, e foi isso que fiz: subi as escadas de novo, abri o quarto e deixei no “borso” da mochila. Ao descer novamente a irmã do meio estava conversando com a mãe, que acenou para mim. Acenei de volta, mas eu estava mais era de olho na bunda da filha, e sim, tinha as bandas da bunda aparecendo, pois o shortinho preto era ridiculamente pequeno. “Pede pra ela trocar esse short!”, gritei para a mãe, que assentiu mostrando o sinal de positivo com o polegar. Ganhei alguns pontos com a véia. Depois disso, saí da Cohab, peguei o bilhete do endereço para ver onde iria: “Casa das Máquinas. Rua Apa, 420, Santa Cecília, próximo à sucursal da Biblioteca Nacional”. Pelo que lembrava, Santa Cecília era um bairro da região Central, mas longe do Pari. Acabei me informando com um transeunte que terminara de atravessar a Cruzeiro do Sul: “Pega o metrô, solta na Sé, depois pega a Linha 3, a vermelha, que você vai soltar na Santa Cecília...”, disse ele. “Eu já ouvi falar nessa rua, acho que a Apa fica depois da estação, dá uma informada lá”, concluiu. Tava certo, me disse o bastante. Cheguei na estação Armênia e fui para a plataforma em direção a Jabaquara, o outro lado era em direção a Tucuruvi, na Zona Norte. Soltar na estação da Sé... beleza, então.

Como tratava-se de uma noite de sábado não me surpreendi com a quantidade massiva de roqueirinhos – dos dois lados, indies e headbangers – adentrando aos vagões do metrô. Alguns se divertiriam na tal Galeria do Rock, ali mesmo na região Central, um pouco próximo ao metrô São Bento, antes da Sé. Todos em grupo, falando besteira, como de praxe, algumas gostosinhas no meio, mas era aquela coisa 8 ou 80: ou era gostosa (ou pelo menos lindinha) ou era uma feiosa gorda. Desviei meu olhar para a janela do metrô e ouvia as risadas, ouvia, e percebia que sempre tinha uma putinha que ria por qualquer coisa, mesmo que humanamente tal coisa não tivesse graça alguma, sempre esquisito lidar com essa galera mesmo não tocando neles, não falando com eles. Mesmo assim, foda-se, eu não estava estressado, tampouco cansado. Só me cansaria depois de tanto transar com a Sasha Green, isso é, se tudo desse certo. Estava na companhia de um “item” que me ajudaria bastante na minha empreitada, mas adianto, algo que não poria a integridade física dos meus rivais em perigo. Para a sorte deles.

Ao chegar na estação de metrô na Sé, faltou eu me despedir dos merdas. Engraçado que não tinha otaku naquele bojo, mas otaku que é otaku sai ao dia, não naquele horário, que nas ruas é altamente nocivo a eles – naquele horário neguinho está é vendo anime deitado na caminha, além de provar o pudim de leite feito pela mamãe, mimimi!. Não sabia que estava tão bonito, pois os rédibendis olhavam para mim como se eu fosse um deles. Bão, eles não são bonitos. Ué, só porque estava de coturno? Mas não estava de camisa preta. Também não sou o tipo que diz adorar a morte, mas tem medinho de se matar. Ei, isso é característica dos góticos. Goticuzinhos, gotiCUZÕES. Então, qual o problema? Ao sair, obrigatoriamente me distanciei de parte deles, que desceriam ali para desembocar na São Bento e de lá partir para a Galeria do Rock. Fiz baldeação para a linha vermelha, tomando o metrô até a estação de Santa Cecília. Roqueirinhos, viados, sapateens, seguidores da Lady Gaga. Que tortura.

Saí da estação um tanto mais leve. Olhei para o céu, achei que ia chover, mas não, pelo menos naquela parte da cidade o céu não estava encoberto, no Pari pude sentir uma nuvem pesada sobre mim, mas não trovejava, nem nada. Se relampeasse era certeza de eu me esconder em algum local, pois era um dia péssimo para morrer. Estou fazendo tanto drama, né? Não precisava mais me preocupar, achei que a noite ali em Santa Cecília prosseguisse daquele jeito, com um pouco de frio, mas nada insuportável, porque frio em São Paulo nunca foi insuportável mesmo. Lembro que, quando eu estava vindo para cá passamos pelo Trópico de Capricórnio, lá em Mogi das Cruzes. Quando era criança, achava que tanto o Trópico de Capricórnio e o de Câncer, além do Equador, eram todos limitados por uma linha verdadeira, não imaginária. Malditas linhas que cortavam o mundo. Depois disso cair por terra foi a vez de cair por terra também a hipótese das linhas limítrofes de estados e municípios serem reais, e não imaginárias também. Eu era um moleque que acreditava em quase qualquer coisa, cheguei até a crer que minha mãe tinha morrido, quando ouvi a notícia de uma moça homônima no rádio. “Carmem Lúcia morreu!”, o radialista sensacionalista – e que até hoje ganha a vida inventando descaradamente notícias envolvendo homossexualismo e zoofilia. Não sei como não denunciaram esse puto.

Não demorou muito para que eu chegasse na rua Apa. Ela era dividida por um elevado que cortava quase todo o bairro, e prosseguia do outro lado, e como vi, a parte onde eu estava da rua era bem pequena, eu chegaria ao local atravessando a via – não em cima do elevado, mas a avenida que o cortava em baixo, - sem qualquer problema, e foi isso que eu fiz: atravessei, acabei passando por alguns mendigos que dormiam ali e, ao avistar um certo burburinho na porta de uma construção retangular, além de música techno, constatei que era o maldito lugar. Já comecei a ficar nervoso, mas ainda podia controlar minhas pernas, que bambeavam. Se estavam assim daquele jeito, imagine na frente da Sasha. Também não é necessário dizer que o medo espetou meu coração a ponto de eu querer sair fora, já sabia que aconteceria isso, mas não podia arredar o pé do meu objetivo, do meu caminho. Fora assim também na primeira vez em que pus o pé em um bordel, mas pior. Agora, já acostumado com a presença feminina – nem tanto – estava mais forte. Todavia, como fui chamado para uma festa homenageando uma grande estrela do cinema pornô mesmo?

Eu cago e ando para a pornografia. Não gosto nem de filmes eróticos – já não sei mais qual é a diferença. Não perco tempo assistindo filmes pornô, muito menos vendo um gif qualquer que seja, mas me senti atraído por certas atrizes, só que a Sasha é uma das 2 que pirou meu cabeção, mais até do que a outra. Então, navegando na internerd soube por terceiros que a própria Sasha Green estava preparando-se para vir ao Brasil, mas em uma festa particular, coisa de 150, 200 pessoas. Sasha deu início a um sorteio no seu site oficial, onde pelo menos 50 babaquinhas deixariam de ser babaquinhas para ser sortudos – e depois voltariam a ser babaquinhas – , mas a brincadeira não parou por aqui: Sasha iria escolher um deles para uma noite de sexo. Eu fiquei surpreso por ela ter que escolher um só. Essa desgraçada já participou de orgias, já foi penetrada por vários simultaneamente, entretanto, fiquei feliz por ver que, se eu fosse escolhido não teria de comer a mulher no mesmo tempo que outros filhos da puta, o que daria um mal estar já no começo da experiência. Dizem que ela nasceu aqui, em Pernambuco, e não em Nova York – fala um português macarrônico, demonstrado em seus vídeos no YouTube. Também tem um olhar enigmático, do tipo que puxaria uma faca para você, e justamente este olhar que me fez ficar... ahn... “apaixonado”. Creio não ser o único a gostar dela por causa disso. Sei que haverão outros dos meus semelhantes na festa. Eu já fui muito sortudo em ser sorteado para esta festa, e já poderia morrer tranquilo se fosse escolhido para transar com ela, mas no meu caso, “faria amor”. A atração que sentia por essa imbecil ultrapassava apenas o desejo de metê-la.

Chegando na porta, lidei com uns otários acotovelando os outros, e eu só não respondi à altura porque estava de muito bom humor para ver a Sasha. Apresentei ao segurança um cartão de identificação do sorteio – recebi pelo correio – , e depois disso me mandou para a fila. Fiquei quase no fim, e pude estudar a galerinha marota que também fora sorteada e estava comigo: espinhudos, gordos sebosos convivendo com bombados e “normais de tudo” de All Star vermelho no pé e cabelinho cortadinho. Estava convicto de que iriam implicar com o meu cabelo e meu coturno, mas lembrei que paulistano não é tão metido a engraçadinho como o carioca. Carioca gosta de implicar com quem não conhece. Paulistano é mais frio e racional. Um destes caras foi puxar papo comigo, dizendo o quão ele estava feliz pela certeza de poder ver a Sasha de perto dali há alguns minutos, com lágrima nos olhos, verdadeiramente emocionado. Eu não zoei nem nada, compreendia seus sentimentos, compreendia também que uma mulher maravilhosa como ela, mesmo tendo uma vida vazia de merda, arrebatava fãs de quase todos os tipos. Daí, pensei comigo: “vida vazia de merda? Ela transa muito mais do que eu!”. É. Como seria lidando com um sujeito que, como uns caras, queria “tirar ela daquela vida”? Isso porque evidentemente ela era uma puta, ué. Toda atriz pornô é puta. Às vezes nem precisa chegar a esse ponto pra ser puta.

Então, o moleque – devia ter uns 19 anos – chorava quase no meu ombro quando chegou minha vez de entrar. Fui revistado de cima abaixo, só faltou botar o dedo no meu cu, e depois disso entrei na boa. A tal música techno maltratou meus ouvidos a ponto de eu tontear, não lembrava que seria dessa forma, aliás, não lembrava como seria a tal festa, parecia mais um baile de formatura que uma boate, com a diferença que, rapidamente, após o último sorteado entrar e as portas ficarem entreabertas – com um segurança guardando – as luzes se apagaram e todos começaram a dançar. Não era mais uma fucking festa de formatura, e o espaço correspondente ao pátio era grande demais. Isso eu imaginava, mas não tão grande quanto um ginásio de futsal. Eu queria beber alguma coisa, para isso me deram umas fichas ainda lá na entrada, após eu ser revistado, o cara disse tão rápido para que seria que não entendi, visto que o som começava a se tornar insuportável. Luzes piscando, a negada dançando assim, tão rápido e fácil, me fez achar que, um a um os convidados seriam imobilizados para servir de alimentos a supostos vampiros, gente que trafica órgãos, ou até coisa pior. Pô, não tinha nada pior que isso a não ser ter a pele retirada enquanto vivo. Temia que acontecesse qualquer coisa, resolvi me sentar em um sofá. Entre um gole de refrigerante e outro notei que de um compartimento aberto irrompiam mulheres de biquíni e camisetas molhadas, gostosas demais, bundão, peitão, mas mesmo assim não me instigou a levantar dali, parecia que o sofá queria meu corpo de qualquer jeito. Cadê o moleque que até pouco tempo choramingava no meu ombro? Estava lá, sendo pajeado por uma loura alta e com peitos tão grandes que com uma porrada matariam aquele magrelo. Bom, não demorou muito para que viesse uma morena baixinha que sentou no meu colo, mas eu a repeli. “Meu, você é gay?”, perguntou para mim, mas nem respondi. Saiu fora. Meu refrigerante tinha acabado, então levantei para pegar mais. Estava com uma sensação tremenda de que estávamos sendo alimentados para o abate, assim como Hansel e Gretel. Tudo isso me levou a pensar no que Sasha estava tramando. Aliás, eu sempre quis saber como funciona o cérebro de uma atriz pornô. Existe algum hormônio da vergonha? Se existe, elas devem ser imunes a ele.

Andava entre os sorteados e as gostosas e pensava sobre os comentários de um site que participo, sobre a mulher: “Eu até admirava ela. Mas de uns tempos pra cá ela tem me irritado. Parece que não consegue olhar pras pessoas sem forçar os olhos entreabertos. Sempre tá com a visão cerrada pra pagar de sexy. Fora que ela sempre quer passar a imagem de inteligente. Porra, se tu é tudo isso, não precisa se preocupar. Acontece naturalmente”. Isso me fez recordar de uma atriz hollywoodiana que sempre põe a boca entreaberta. Ah, a Megan não sei o que. Uma magrinha gostosinha, mas com bosta no lugar do cérebro. Lembrava bastante outra retardada, uma modelo baiana chamada Adriana... nem lembro. E outros perguntando: “Por que ela faz pornô se é bonita e inteligente?”. Responderam, “por que ela é inteligente e bonita. Inteligente para saber que ganha 3 mil dólares para foder 3 horas com um ator, e que pode foder a semana inteira, uma de manhã e de tarde, encher o cu de grana enquanto ainda tem a beleza”. Eu concordaria com isso, até alguns anos atrás, quando me importava muito mais com sexo que hoje em dia. Minha opinião é que isso tudo é um bando de gente vazia e que usa uma coisa para preencher este vazio. Entretanto, não vou ser hipócrita e dizer que não comeria ela todos os dias e sempre que possível.

Então, peguei mais um pouco do refrigerante, e novamente fui interpelado por algumas outras “damas”. Aquele show de luzes e sons estava me enchendo o saco. Queria partir para um lugar mais reservado, mas parecia que nem no banheiro tinha este direito – vista a quantidade de gente gritando lá dentro. Voltei a me sentar no sofá, embora dessa vez tivesse um gordo enchendo a pança com... torta alemã, acho. Fiquei muito desconfiado. Sabia que a imprensa estava fora, mas cadê a Sasha? Me preocupei tanto com isso que me cansou. Abaixei a cabeça e cochilei.

Me acordaram. Vi a galera sentada entre mesas redondas, em frente ao palco. Não furtaram o meu “item”, mas devem ter visto o que era. Bom, não vi ninguém entrando ali carregando alguma coisa – fora máquinas fotográficas – além de mim. Um dos seguranças me disse: “ela está chegando, apronte-se”, como se estivéssemos perto de receber a rainha Vitória. Me pôs em uma cadeira, na companhia dos meus inimigos, digo, de um bombado tagarela e um “normal de tudo” com óculos de aro preto. Quando ouvimos um sujeito bigodudo e baixinho anunciar Sasha – sob som da trilha sonora do seu filme pornô mais famoso, “Buraco quente” - e esta apareceu amparada por dois seguranças mais baixos que ela, trajando um vestido preto ostensivamente justo, deixando transparecer parte da sua calcinha (rosa). Usava um cordão com uma bala de fuzil como pingente. Do lado dela uma mulher que devia ser a apresentadora – e logo após mostrou que era isso mesmo. E sim, depois dela apareceu a imprensa: fotógrafos, repórteres, gente que já enchia seus pacovás (“pacovás?”) lá fora e que veio encher ali dentro, tudo de canais pornôs/eróticos. Geral se levantou. Eu, não. Não estava bancando o sujeito do contra, mas estava cansado, não tão cansado a ponto de não ficar ligado com a presença da Sasha, que olhou para todos, olhou para mim e subiu no palco, após cortar o corredor formado por mesas. Muita gente tirando foto e filmando.

Isso me fez recordar de alguns caras ainda mais apaixonados por ela, do tipo que diz: “Sasha é um dos seres mais lindos que já vi, seja maquiada ou não. Pele branca, rosto bonito, bunduda e inteligente. Casaria fácil com ela não importa o que ela fosse ou o que continuasse a fazer depois do matrimônio”, e eu tirando uma com a cara deles: “Um bando de cantor de blues nesse tópico. Olhem bem pra eles. São pessoas que se apaixonam por putas ingratas e depois morrem de amores, sempre cantando o bom e velho blues. Oh, yeah!”. Mas, puerra, eu também casaria com ela, mas do jeito que está é complicado, muito complicado. Vamos dar um trechinho de como seria a vida casado com ela?

“- Oi, esposa, como foi seu dia?
- Horrível!!! Hoje tinha um cara insaciável que ficou socando no meu rabo por 1 hora e depois me lotou de gozo na cara.
* beijo na boca*
- Vou tomar banho, não deu tempo para tomar lá no set. Você vai esquentando a janta?”

Aí, não dá. Não tem como ficar a sério.

- Sinceramente, fico muito feliz por vocês estarem aqui – disse ela, tomando o microfone. Antes, simulara sexo oral no mesmo, atiçando ainda mais a libido dos sorteados. - Tive a feliz ideia de aparecer no Brasil, era um desejo de anos e anos, isso porque tenho um grande número de fãs por aqui. Vocês acompanham meus filmes, teclam em meu site com um fervor tão grande que se diferenciam dos fãs estadunidenses, vocês são especiais... mas não no sentido de retardados, entendem? Amanhã eu vou para o Rio de Janeiro, sei que os paulistanos não gostam muito de praia (risos), então, me desculpem, pois passarei mais ou menos 3 dias por lá, tem uma grande gama de pessoas querendo conversar comigo, mas digo que eles não são melhores que vocês. Entretanto, não vim aqui falar deles, mas sim de vocês, dos sorteados, dos grandes felizardos, por enquanto tiveram sorte até agora. Todos terão a oportunidade para falar comigo, infelizmente não será um a um, isso eu guardarei apenas para o meu “príncipe”, o que será escolhido para passar essa noite comigo, mas falarão, o que já é importante. Quero comunicar também que ano que vem estarei escolhendo esse mesmo “príncipe” para protagonizar um filme comigo (gritos da plateia), e esta pessoa receberá tudo o que quiser, darei tudo de mim para agradá-lo. Como viram em meu site, esse concurso é o primeiro aberto por mim, com o patrocínio do canal Sexy Caliente e das revista Sensuality e Playbunda, as maiores dos Estados Unidos e Brasil, respectivamente. Então, vocês já aproveitaram a festa, o que o Sexy Caliente pôde oferecer a vocês (falando das putas, dos comes e bebes), mas ainda não é o fim. Agora, escolheremos o “príncipe”, o meu príncipe (negada gritando muito). Todos vocês são muito bonitos e garbosos (geral gargalhando), e quando eu escolher espero que os que não conseguiram não fiquem aborrecidos com meu “príncipe”. O meu príncipe...
- SASHA! - gritei com toda a minha força para ela. Todos fitaram meu rosto, como se perguntassem “quem é este viado?”, “por que este puto está interrompendo minha Sasha?”. Os seguranças, atentos, rumavam até mim, mas continuei. - SASHA! - olhou para mim, abaixando o microfone nos peitos. Finalmente tirei da minha bolsa plástica a carta da minha manga, O MEU ITEM! - SASHA! PODE MANDAR ESTES MALACABADOS PRA CASA, PORQUE EU SOU SEU PRÍNCIPE!
- Você... - Sasha não disse muito, mas viu eu agitando no ar a garrafa de vinho de pêssego. Segundos depois, com água na boca e todos olhando para mim com caras furiosas, Sasha disse: - Escolhi meu príncipe... EU JÁ ESCOLHI MEU PRÍNCIPE!

Eu estava feliz. Prosseguia com a garrafa de vinho para o alto, para que ela não mudasse de ideia, teria de continuar enfeitiçando-a. E eu continuaria assim, se todos os meus adversários não estivessem visivelmente fulos da vida comigo e partissem para cima de mim, com o intuito de me quebrar a cara. Já tinha sacado isso desde o primeiro olho feio. Foi fácil derrubar um chutando seu saco, a coisa estava ficando cada vez mais difícil ao derrubar outro com um murro certeiro, mas o desgraçado, ao invés de cair, ficou segurando meu tronco, e como era gordo e forte me derrubou no chão. Os demais pularam em cima, me chutaram e outros tentaram me socar. Uma bagunça daquelas. Os seguranças agiram com truculência à altura, socando e empurrando os que estavam me esmagando, afastando um, dois, três... cada vez mais eram postos para a lona com precisão, e eu estava ficando sufocado, precisava o quanto antes tirar aquele bando de cima de mim, os seguranças me ajudavam, os fotógrafos fotografavam e a Sasha desceu do palco para ajudar, mas do modo mais feminino possível: nem relou um dedo nos caras, pois talvez tivesse medo de quebrar a unha, coitadinha. Ela também não precisou agir, os baderneiros estavam sendo postos em seu devido lugar e logo após a queda do gordo que pressionava sua pança na minha cara fui içado pelos seguranças com um olho roxo, uma costela quebrada e escoriações nas pernas. Sorte que nenhuma perna ou braço quebrou, poderia tirar de letra o sarar da costela, mas era óbvio que eu teria de ficar de molho por uns tempos. Não sei como Sasha realizaria meu desejo depois daquilo. Achava que também não ficaria comigo, pois era uma profissional muito atarefada, uiuiui. Um dos seguranças chamou a polícia enquanto outro me pegou no ombro e acionou os paramédicos. Eu estava todo fodido mesmo, mancava e olhava torto. Sasha pôs delicadamente a sua mão no meu rosto e disse: “Vou ficar contigo como o prometido”. Bom, disso eu já sabia, mas daria para a gente furunfar?

Me mandaram para um hospital no Anhangabaú, com Sasha junto – ela disse que estaria do meu lado, verdade. Eu podia me sentar, não estava num jeito tão crítico, mas não podia me mover livremente por causa da minha costela quebrada, uma fratura que, embora pequena, incomodava. Lá dentro me botaram para ficar num leito e fizeram seu trabalho. Troquei de camisa e me puseram para repousar, alguns fãs da Sasha reconheceram a criatura e a tietaram, antes disso um dos repórteres pôs o microfone na minha cara, perguntando “como é vencer o Brasil na porrada após 'ganhar' Sasha Green”? Respondi: “Na verdade, venci pela esperteza, isso que me fez tão sortudo perante fãs tão burros”, algo assim. Eu estava meio grogue. 20 minutos depois eu estava na cama, de frente a uma janela ampla e limpa. Sasha estava em pé na minha frente, com o mesmo vestido, acarinhando meu rosto.

- Nem vou perguntar se você está bem, mas pelo menos, está melhor que antes – disse Sasha, tocando minha boca. Deixou um pouco seu dedo lá dentro, para que eu mordesse, o que acabei fazendo. Sasha não sofreu dor alguma, isso porque eu apenas mordiscava, e quando fazia isto podia ver a expressão paudurecedora de prazer saindo de seu rosto. A sobrancelha direita levantada, os olhos semi-fechados, a boca entreaberta e com os dentes juntos, eu amava tudo aquilo. Seu gemido e expressão agiram como uma prévia do que me esperava. Gemia e eu passava a mão na sua bunda, gemia e eu viajava com minha mão da bunda em suas coxas e terminando em sua vagina, que foi estimulada por meus dedos. Sasha curvou-se, gozava de prazer real quando sussurrou: “vou fechar a porta”, então foi lá e fechou, sem antes pedir para a enfermeira não incomodar-nos, já que iria ter uma longa conversa comigo. Esta assentiu dizendo que eu também já estava pronto para descansar quando quisesse, o que deixou Sasha ainda mais feliz. Entrou no quarto, fechou a porta, tirou o salto alto, o vestido, a calcinha e o sutiã, mostrando-se nua em pelo. Me excitei. - Vai se importar se eu beijar sua boca?
- Não, isso é, se você não mamou ninguém hoje – respondi para ela, com seu bafo quente (e agradável, pois não era bafo de porra nem de onça, haha!) encostando na minha boca, então ela me devorou a partir dos meus lábios, no início da realização de meu sonho. Sasha Green voltou a deitar minha cabeça no travesseiro na base do beijo, mas eu não queria ser o “beta” daquela relação sexual, tudo fazia mais sentido se eu avançasse sobre ela, e não o contrário. Estava em cima de mim, nuazinha, com minhas mãos na sua bunda e sua língua triangular na minha boca, agindo de tal ferocidade que parecia querer me contorcer a partir dali, movendo minha boca e minha língua para ângulos impensáveis, eu só queria permanecer agarradinho no seu corpo, meu pênis roçando os pelos de sua boceta e seus seios batendo no meu peitoral, como dois saquinhos de boxe. Eu ainda tinha muito a fazer, muito para brincar, e pelo jeito Sasha permitiria. Pegou a camisinha, pôs no meu membro e o estimulou mais ainda me masturbando, me beijava, eu segurava seus seios e tentava me descolar de sua boca para mamá-los. Quando o fiz, agi ao mesmo tempo em que afundava meus dedos em sua boceta, cada vez mais os movimentos de vai e vem faziam ela gemer e mostrar que estava gostando. Eu mamava suas tetas até sair leite, e quando saiu fiquei como um bebê, dependurado nos seus seios, eu não poderia ficar tanto tempo assim, mas já constituía em uma vitória. - Você é viciada em anal, né? - perguntei a ela, que me respondeu quase de pronto: “sou sim, sou!”. Eu ainda brincava com os dedos na sua vagina quando ela se prostrou de quatro. Beijei seu cangote, suas costas, até chegar ao início de suas nádegas, meu pinto estava tão duro que parecia querer explodir! Mas cometia um grande erro, pois preocupar-se em dar prazer a uma puta (quando deveria ser o contrário) era o cúmulo, só que eu sempre quis brincar com o corpo dela! Com o membro roxo de tão rijo, meti dentro do seu rego, enganchei em suas coxas e, com as mãos segurando as dela, comecei a ir e vir, quase chorando de felicidade! Eu estava nos céus, digo, no inferno! E passei a socar, socar e socar, Sasha preocupava-se com os decibéis dos seus gemidos e passou a gemer baixinho, com leves e rápidos agudos. Eu estava tão empolgado que estapeava suas nádegas, depois passava a acariciar seus seios, ela me via de lado, penetrando em mim um olhar tanto assassino quanto penoso, a língua lambendo os beiços, nos unimos, ficamos agarrados por minutos até vir o clímax, quando entreabri os olhos e trinquei os dentes, e gozei. Ah, como gozei. Não preocupava-me tanto por ela, naquele momento. Era como se eu tivesse dado tudo de mim, pelo menos toda a minha vida naquela transa. E sim, antes dela fiquei um longo tempo sem chegar àquele “estágio” com uma mulher. Bota longo nisso. E me sentia ainda mais feliz por estar na cama com a Sasha Green, nada deu errado, nem de minha parte e nem dela. Derrubados na superfície da cama e abraçados, demorou para acreditar que estava realizando um sonho que não era tão sonho assim, mas só de ter chegado num ponto em que os próprios fãs verdadeiros da Sasha não chegaram já me enchia de alegria. Uma alegria meio passageira, sim, mas ainda sim uma alegria genuína. Eu realmente tava lá naquela cama de hospital, abraçando Sasha, ofegante de tanto sexo (e ela também), terminando por acariciar sua buceta mais uma vez, meu esperma depositado seu cu enlameado, descendo pelas coxas e em ambos a expressão de relaxamento absoluto e dever cumprido. Eu deveria era ter comido sua boceta e não sabia se ainda teria direito a isso. Ainda podia me excitar, então, voltei com meus dedos em sua vagina, pus minha boca ali e passei a chupá-la. Demorou um pouco para Sasha receber uma chupada tão forte que a fez entortar seu queixo e contorcer sua boca. Gemia firme e forte, mas eu não terminaria o trabalho daquele jeito. Troquei a camisinha, cheguei até seu rosto, e com o pênis novamente rijo penetrei em sua vagina. Sasha mantinha as pernas abertas como os de um frango pelado. Pus meus braços embaixo dos seus, as coxas juntas e mandei ver. Tinha vergonha de continuar metendo daquele jeito, pois minha bunda levantava e abaixava, com o ânus abrindo e fechando no vazio, tinha outro jeito, mas não estava a fim de trocar. Ela olhava para o meu rosto enquanto levava rola e demorou para eu respondê-la à altura, fitando-a também, entretanto, seu olhar era tão matador, mas tão matador... chegou uma hora em que ela própria teve de fechar e virar os olhos, contorcer a boca e esticar o pescoço, de gemer passou a guinchar baixinho, até que obtive meu segundo gozo, como se meu pênis desmanchasse dentro dela. Minha pele arrepiou, arfei há milímetros de sua boca, que beijei logo depois. O lençol do hospital já estava salpicado de esperma, e mesmo assim permanecemos abraçados, com Sasha acariciando meu cabelo e olhando para mim como se eu tivesse feito a melhor coisa do mundo para ela, quando na verdade era corriqueiro até demais alguém comer aquele cu e aquela boceta.

“Meu príncipe”.

Domingo.










Ainda estava no hospital. Dormindo com Sasha. Esta despertou primeiro, ao ouvir um bater de portas que primeiramente julguei ser da enfermeira – que não interrompeu nossa transa da noite anterior porque fora paga para isso – , mas que eram de jornalistas da Sexy Caliente, acompanhados dos seus inseparáveis fotógrafos, que tiveram de ser repelidos pelos seguranças da atriz, ou seja, tava todo mundo ali. Segundos depois acordei, com a mão nas costas de Sasha. Esta tornava a me acariciar o rosto, e não obstante o burburinho instalado atrás da porta do quarto disse para mim: “bom dia, meu príncipe”, e eu já estava ficando de saco cheio dessa coisa de “príncipe” pra lá, “príncipe” pra cá, mesmo dito pela boca de uma mulher tão gostosa como ela. Olhei para baixo e avistei a quantidade de manchas brancas no lençol do leito. Parecia que tinha tirado tudo de mim, mas como testículos são testículos meu esperma já estava todo reposto lá dentro do meu saco há muito tempo. Sasha levantou, foi à porta sem se cobrir com nada, abriu um pouco e teve uma conversa fugaz com seu assessor, um bombadinho de terno, gravata e cabelos arrepiados, ouvi que minha diversão havia terminado e que ela deveria preparar-se para bandear pro Rio de Janeiro, como combinado. Nem precisei me enciumar por isso, pois tinha feito minha parte, meti no cu e na boceta, algo que a maioria de seus fãs nunca fizeram e nunca fariam. Sujeito de sorte, pelo menos naquele dia. Sasha voltou a mim empunhando a garrafa de vinho de pêssego que eu havia lhe dado, brandiu no alto como fosse um troféu e o assessor lhe deu duas taças. Me senti obrigado a me levantar e pelo menos ficar sentado na cama enquanto ela também sentava e nos servia. “Seria perfeito se tivéssemos um café da manhã à sós”, disse para mim. “Mas,eu não poderei, por aquela questão de eu ter que ir ao Rio. Quero que você prossiga assistindo meus filmes, quem sabe eu não apareço em São Paulo de novo e...”

- Eu nunca assisti seus filmes, deliciosa – disse a ela, sorrindo. Sasha ergueu uma de suas sobrancelhas e sorriu. - Mas já tinha ouvido falar de você. Não quer dizer também que não dou a mínima para a sua carreira. Se me permite ser sincero, você... merece... merece algo melhor...
- Mereço algo melhor do que protagonizar filmes pornográficos? - perguntou, vendo que eu relutava em dizer algo que achava de coração, visto meu temor dela se despedir decepcionada.
- Sim – respondi. - É, é isso, mas não quer dizer que eu tenha sido menos merecedor deste corpinho...
- Isso mesmo, porque normalmente eu cago e ando pro que pensam de mim. Entretanto, sempre tem um fã ou apenas alguém futilmente interessado que quer “me tirar dessa vida”. Qual livro gostaria que eu lhe desse?
- Livro? Você lê? Certa vez vi uma imagem sua segurando um exemplar de “Orgulho e Preconceito”...
- Sim, é um dos livros que gosto, mas prefiro os do Salinger, Kafka... - disse Sasha, me fitando com aquele olhar filho da puta. - Faz um tempo também que estou escrevendo, estou digitando um romance, mas nada pornô, já passei das 400 páginas e pretendo lançar no fim do ano, mais ou menos em outubro.
- Legal, sinceramente legal, hein? - disse a ela, sorrindo genuinamente. - Então, você me manda um exemplar pelo correio.
- Fechado! - disse ela, pegando de leve meu queixo duplo. Eu já sabia que aquele seria o último beijo, então me empenhei: nos alongamos neste beijo por uns 20 segundos, chupando as línguas, sugando as salivas, torcendo os lábios uns nos outros. Sasha concluiu com uma lambida do meu queixo até a testa. O assessor veio, a cobriu com um jaleco de pele (falsa) de tigre. Antes de se despedir tirou uma foto comigo. - Vou mandar pro seu email. Boa sorte na sua vidinha.
- Peraí, responda uma coisa, você nasceu mesmo em Pernambuco? Fala um português tão fluente e convincente que... - fechou a porta.

A certeza era que eu seria responsável por aquela bagunça na cama. Tentei sair do hospital mesmo tempo que a equipe de reportagem, mas embarreiraram minha porta, propositalmente. Que gente mais mesquinha e mequetrefe. Gastaram uma nota com preparativos da festa, comes, bebes e putas, e para se responsabilizar por umas gozadas feitas no leito do hospital tiram logo o corpo fora... mas, do que eu estava falando, se quem ejaculou fui eu? Como todos foram embora era certeza também que além de ser responsável, passaria vergonha na frente de todos. E foi assim: faxineiras vinham juntas com o pessoal da Administração, que foi de curiosidade, para “visualizar os danos”. Acabou que, mesmo levando a culpa – justa – não precisei desembolsar nada na mão do diretor e supervisor, que também eram fãs da Sasha e se lamentavam por não ter ao menos cheirado o cangote da mulher. Eles poderiam arrebentar meu dia, de tão invejosos que estavam, mas me mandaram para casa mais cedo. Tomei uma ducha muito da rápida no banheiro dali mesmo e fiquei ruborizado ao ver a faxineira limpando a cama suja de esperma, olhando para mim e me chamando dos termos mais indecorosos. Eu merecia, sempre há um preço a se pagar na realização de um desejo tão cobiçado. Meus e-mails seriam bombardeados com mensagens invejosas, se bobear, com trojans e qualquer outro tipo de vírus disponível ou indisponível. Eu era a bola da vez, pelo menos por algum tempinho. Mas, e o meu site, iriam bombardear também? Talvez sim, não sei se alguma pessoa lá no galpão me associou com o diretor independente criador do filme “O Ventre”, sobre dois mancebos portadores de uma doença rara e de verve mitológica, e rodam parte do mundo em busca da cura. Mesmo se destruíssem meu site ou minha reputação – eu ainda não era famoso o bastante para qualquer pessoa influente se escandalizar por ter transado com a Sasha – não me importaria tanto quanto me importaria se continuasse a ser um fracasso total. Bom, eu era um fracasso, mas não total. O fato de ter sido sorteado para comer a Sasha Green – e de ter jogado com um Ás para deixar todo mundo babando de ciúme e inveja – provava que eu tinha jeito. Um desejo realizado, com todo o prazer que me foi dado e que eu dei. Qual seria o próximo passo naquela manhã de domingo? Voltar para a Cohab. Eu não tinha mais nada a fazer, além de deitar meu corpo naquela cama dura e observar as tintas da parede rachando até eu dormir. Sim, estava com um sono tremendo.

Parti para a estação Anhangabaú – Linha 3 do metrô – , soltei na Sé e fiz baldeação para a Linha 1, parando no metrô Armênia. De lá, o mesmo de sempre: caminhei toda a Pedro Vicente para chegar ao meu lar provisório. E cheguei todo quebrado, cansado e cabisbaixo, não obstante ter vivido uma noite louca, a melhor de toda a minha vida. Logo topei com a mãe de família que tinha me recebido na manhã anterior. “Bom dia”, disse ela para mim, e eu respondi baixo, tanto que ela não entendeu nada além de grunhidos. Pediu para eu repetir, mas eu apontei para a garganta e entreabri a boca. Deixou quieto. Além dela, a menorzinha apareceu e correu até mim, terminando por abraçar minha perna, e eu lá, acarinhando sua cabeça, mas não tava afim de brincadeiras. Em segundos me despedi das duas e voltei a subir as escadas, e quem eu encontro ali, parada em frente a porta do quarto? A boliviana, desta vez trajando uma calça jeans preta, casaco azul certamente mais curto que seu corpo. Voltou para pegar sua Carteira de Identidade.

“Por favor, devolva minha identidade”, disse ela, quase sussurrando. Calma, querida. Abri a porta e fui à mochila, onde peguei o RG e dei para ela. “Muito obrigada”, disse, e eu me deitava na cama, pedindo para que fechasse a porta quando saísse. Eu ainda sentia alguma atração por ela, entretanto, estava tão cansado e entorpecido pela transa com Sasha Green que nem liguei quando ela partiu. Fiquei de costas para a porta, deitado de lado. Tive calor, custei para levantar e me dirigir ao chuveiro, onde tomei mais uma ducha. Após isto, liguei o laptop e fui checar meus e-mails. Como imaginava, gente xingando e falando besteira, negada expondo de verdade os seus sentimentos pra cima de mim, como era previsível. Tinha até um maluco me ameaçando de morte. Bom, se acabei sendo subjugado por estes cabras é capaz que um deles seja pirado o suficiente para me matar por aí.

A intenção seria deixar as barbas interneteiras de molho por uns dias, talvez semanas, mas precisava entrar por duas coisas bem simples: 1- receber os e-mails dos fãs, parceiros e interessados e 2- matar o meu tédio! Uma hora essa palhaçada toda iria terminar e tinha a certeza de que, embora tenha ocorrido o que ocorreu logo após eu ter sido escolhido pela atriz, eles não seriam capazes de acabar comigo mano a mano, um por um. Bom, pelo menos a maioria deles. Teriam de se armar com paus, pedras e armas de fogo, já tinha abatido um ou dois que vieram para cima de mim, depois disso é que começaram a me juntar. Não me considerava um super homem, até porque realmente não era, mas sabia fazer frente às investidas dos nerds. Há uns 10 anos atrás eu era um cuzão nesse sentido, mas muita coisa mudou de lá para cá. Bem, não perderia mais meu tempo pensando em uma coisa como essa, por isso, ia fechar minha Caixa de Entrada, até lidar com um e-mail escrito pelo Giovanni, pedindo para que eu aparecesse na casa dele ou que ao menos ligasse antes. Sinceramente, não estava a fim de sair da casa naquele dia, todavia, uma coisinha atiçava minha curiosidade: a relação que ele tinha com o lourinho lá, que mais parecia uma menina. Eu também podia aproveitar o encontro para resolver de uma vez por todas com o sujeito. Já tinha me aborrecido por conta de sua afetação. Fiquei fustigado ao vê-los namorando no sofá da casa dele, um em cima do outro, gerando aqueles ruídos nojentos de bocas colando e descolando. E também, não precisava dele mais para nada. Saí da cama, me arrumei, tranquei o quarto e fui até o metrô Armênia pegar o Cocaia em direção à Guarulhos.

Cheguei à frente do prédio decidido, tão concentrado que esqueci de ligar para ele antes de vir. Chamei o porteiro e disse que precisava falar com Giovanni, ele sabia de quem se tratava e quem eu era. Contatou o próprio pelo telefone, e me mandou subir. Ao invés de utlizar o elevador, subi as escadas, como se desse uma chance para mim de pensar direito no que pretendia fazer. Em vão. Giovanni me recebeu, já deixando a porta aberta, mas ele estava ocupado não sei com o que dentro do apartamento. “Pode entrar!”, disse ele. O procurei a partir do quarto. Lá deparei-me com seu namorado Gi, dormindo de bruços e sem camisa, vestia apenas uma calcinha rosa. Fiz uma expressão enojada e logo desfiz quando este me olhou e disse “bom dia”. Virei-me e fui para a sala de estar. Não achei Giovanni.

- Cadê você? - perguntei, gritando. Não demorou para que este brotasse da cozinha, com um bule de chá nas mãos.
- Desculpa, tava fazendo o café... aliás, você está obviamente convidado para...
- Não quero tomar café, não – disse ele, demonstrando tensão nos meus gestos. - Vim aqui porque tô te dizendo na sua cara pra gente romper nossa amizade.
- Que? - Após a pergunta, Giovanni arregalou os olhos e quase derrubou o bule nos nossos pés. - O que aconteceu? O que eu fiz de errado?
- Você é viado, cara – respondi a ele. - Eu achava que poderia tolerar isso numa boa até morrer, mas não deu, não posso ser amigo de quem dá a rosca, desculpa, mas não vai mais rolar.
- Rapaz, você está cometendo um er...
- Ah, não? - perguntei, bradando. - E o moleque que está deitado na sua cama, prova que você é gay, vai dizer que não? E o seu jeito todo afetado, fala mansa e tudo mais?
- Ai, ai, você me conhece tão pouco... - Giovanni pôs o bule de chá na mesa da cozinha para rir, e gargalhou tão alto que jogou suas costas para trás, como se tivesse tirando uma com a minha cara... depois, pegou meu braço dizendo “vem comigo” e foi até o quarto onde o Gi estava deitado, mas ele não estava mais lá. Rumamos para o banheiro, que estava aberto. Terminamos por avisar o Gi sem camisa, na frente do espelho, de costas para o box do banheiro. - Gi, imaginei que o Gil aqui pensasse o que te disse ontem, mostra pra ele que você é homem.
- Ok... vê se eu sou homem, Gil - e Gi, que virou-se e mostrou os seios. Seios! Pequenos, mas eram seios. Logo depois tirou a calcinha na minha frente e mostrou sua vagina, com poucos pelos. Fiquei boquiaberto. - Agora, vem aqui me tocar.
- E então, vê? Toca nela, mas toca fundo! - perguntou Giovanni, sério, indo comigo até Gi. Então, movi meus braços e toquei o corpo de Gi, apalpei os seios, verifiquei a bunda, toquei em sua vagina. Vi as curvas, vi que também não tinha gogó e nem pé grande. Gi riu como se escarnecesse de mim, enquanto Giovanni virava-se para mim, dizendo: - Você vai perguntar porque ela se vestia de homem e se chamava como homem, a Gi é adapta do Cross-dressing, que é nada mais do que alguém vestindo-se como uma pessoa do sexo oposto. Entendeu agora?
- Então... é mulher mesmo? - murmurei, envergonhado.
- Não, eu sou marciana – disse Gi, entre risos.
- Eu também errei, porque entrei na brincadeira da Gi, achava que você iria sacar, mas como demorou tanto a ponto de mostrarmos que ela não é “ele”... vai perguntar sobre meus gestos afetados também? Não existem homens afetados, mas que são héteros?
- Sim... foi mal, me desculpa mesmo, cara – disse a ele, tão pequeno que queria me esconder de tanta vergonha. Desci as escadas freneticamente. Fui para o ponto do ônibus e peguei a condução de volta para o Armênia, encolhido no banco. Apesar de aparentar naturalidade em apresentar Gi como mulher, ele não iria me perdoar tão cedo.

Antes mesmo de voltar para meu quarto, cheguei a um orelhão, catei o cartão telefônico e efetuei uma ligação – não, peguei o sapato e coloquei no ouvido, dããã!. Eu precisava falar com uma pessoa, especialmente porque era domingo e eu precisava me preparar para a semana que vem, pois iria chegar aquela pessoa e eu precisava ter contato com ela. Direcionei todas as minhas atenções para Graça. Minha costela não doía mais e parecia estar posicionada certinho no lugar, como se não tivesse quebrado anteriormente. Aliás, não me incomodava com as dores desde quando transei com a Sasha Green. A puta carregava uma aura tão”libertadora” que me fez esquecer que eu estava com uma fratura na costela. Eu precisava desabafar naquele momento, e como o próprio Giovanni fora chutado por mim minha única opção era chorar nos ombros cheirosos da Graça. É, iria fazer isso cedo ou tarde. “Bom-dia, quem fala?”, perguntou ela, simpática como sempre. Senti vontade de morder seus lábios. “É o Gil, amor”, disse, emulando o mesmo grau de simpatia, temendo que ela me dispensasse.

- Vou ser direto ao ponto. Eu queria muito conversar contigo, amor – disse para ela, em tom suplicante. - Eu não sei o que fazer nesse domingo, tá certo que a gente brigou, mas eu não tenho com quem desabafar, preciso de um ombro, preciso de você, minha querida. Por favor, tem como a gente conversar hoje? Nem que seja por uma horinha sequer?
- Hum... onde você está? - perguntou ela, pensativa.
- Estou no Pari, perto da Cruzeiro do Sul. Não tenho nada pra fazer mesmo, até tenho uma graninha, mas não dá pra fazer nada estando sozinho, seja ir ao cinema, ir ao teatro... se bem que eu odeio teatro, só iria contigo, querida.
- Está bem, eu entendi – disse ela, extremamente tranquila. - Eu estou pensando em uma forma de te ver hoje, porque aconteceu um imprevisto e eu tive que trabalhar, aliás, estou falando do trabalho agora.
- Trabalhando no domingo, não acredito – disse eu, tentando jogar conversa fora. Já estava assegurado de que ela iria me ver hoje de qualquer jeito, pois me amava verdadeiramente. - Onde você trabalha, docinho de coco?
- Na Pirelli, é uma fábrica de pneus aqui perto – respondeu ela, e logo após seguiram-se barulhos vindos possivelmente do maquinário do local. - Mas essa semana eu estou pedindo as contas, pois vou ficar uns tempos em Paranapiacaba... sabe onde fica? É uma vila que tem depois de Rio Grande da Serra, descendo pra Santos. O trem passa por lá.
- Posso ir até a fábrica te ver?
- Acho que meu chefe não gostaria... e nós chegamos à fábrica de trem, temos uma estação própria para os funcionários da Pirelli, acho que não te deixariam descer nela sendo que você não é funcionário.
- Tranquilo – com isso, minhas esperanças desvaneciam-se. - Não tem outro jeito? Não posso então simplesmente te pegar no fim do seu expediente?
- Pode, mas meus pais...
- O que tem eles? Vai me dizer que eles não vão gostar de ver você sair com um cara mais novo? A gente já saiu ontem, então, qual problema? Ou você está inventando moda?
- Não tô inventando nada, fica calmo – disse ela. - Não fica assim. Tem como me ligar daqui há alguns minutinhos? Vou ligar para os meus pais e com certeza te darei uma resposta, querido.
- Tudo bem, linda – respondi. - Um beijo molhado na sua boca.
- Um beijo molhado na sua também, hueue. Te amo – disse ela, e desfizemos a ligação.

Eu deveria ter dito que precisava de alguém para conversar naquele momento, exato, ali, logo de uma vez, ao invés de deixar para papear à noite ou no fim da tarde. Então, de qualquer forma eu passaria o dia sozinho, zanzando para lá e para cá. Para a minha sorte eu tinha a internerd como amiga presente, minha grande aliada, mas conversar na sala de bate papo do UOL ou conversar no MSN não era a mesma coisa que fazê-la pessoalmente. Também, não estaria tão desesperado a ponto de conversar com qualquer transeunte na rua, até porque quase sempre carreguei a misantropia, nos dias de hoje então, quando ponho enorme dificuldade em falar com alguém que não conheço. Seria ótimo se, nestes momentos de merda, eu estivesse como bêbado, extrovertido e disposto a falar com tudo e todos. Esta sensação de estar solitário em São Paulo – cidade com mais de 10 milhões de habitantes, de todas as classes e etnias – me devorava por dentro, comendo meu intestino, culminando o devorar até minha língua, quando tenho de gritar comigo mesmo que estou enlouquecendo. Por isso mesmo que perco meu tempo em salas de bate papo, almejando novos relacionamentos, pessoas que possam movimentar um pouco o meu viver, preciso de gente que não necessariamente esteja disposta a me amar, mas apenas conversar, vivenciar comigo coisas simples, como passear por aí, bater um rango em algum restaurante pé-sujo ou conhecer a casa de sua família – bom, não precisava conhecer suas mães, pois, como eu disse, mães sempre complicam minha situação. Acreditava que poderia suprir tudo isso oficializando e firmando meu relacionamento com a Graça, mas até lá, muita coisa podia acontecer. Por exemplo, eu não ficaria tanto tempo em São Paulo, teria de voltar para o Rio, já que estava programado para fazer o que tinha que fazer aqui e vazar. Esta viagem foi a oportunidade perfeita para conhecer a Graça pessoalmente – bem, de qualquer forma iria conhecê-la, mais cedo ou mais tarde. Instiguei tanto a menina para que me desse uma chance nas coisas do coração (mas não suplicando como um carente crônico e imbecil) que era obrigação vê-la depois disso – , além de tudo, não obstante tudo o que acabei de dizer, eu não precisava de um bando de idiotinhas na minha vida. Precisava de alguns, para suprir esta carência de diversão, precisava de colegas que com o tempo transformariam-se em amigos reais, e isto iria perpetuar (em alguns casos, não), mas um bando de macaquinhos? Não. Sempre fui uma negação em me entrosar com grupos e com um número expressivo de amigos à parte. Talvez não precisasse realmente deles. Talvez Graça pudesse fazer tudo no lugar destes cabras, naturalmente. E faria mesmo, pois lembro-me de estar diante de uma menina “pau para toda a obra”, apesar da sua feminilidade. Mesmo assim, não faria mal conhecer 2 ou 3 pessoas. Tinha certeza de que a Graça concordaria comigo.

Após deixar o orelhão comecei a pensar no Giovanni e na minha decisão de não ser amigo do sujeito. Fiquei pensando por um bom tempo pensando que ele gostava de queimar a rosca, de empurrar um pouco de bosta ao contrário, de levar na boleia – entre outros termos que remetiam ao simples “dar o cu” - e, já que estava equivocado, achei que deveria dar uma segunda chance ao sujeito. Não merecia ser fustigado pela minha mágoa relacionada ao falso homossexualismo dele, mas agora eu é quem seria “vítima” de sua mágoa, criada com razão, pelo meu equívoco. Então, tinha acabado tudo entre a gente – bom, isso sim soou bicha – e eu deveria seguir meu caminho, só que era amigo de muito tempo do cara e não poderia deixar as coisas ruírem daquele jeito... bom, não de muito tempo assim. Fora a minha viagem para a terra da garoa só o tinha visto apenas uma vez, e isso quando nos conhecemos em um evento de animes e mangás na qual ele foi participante, no Rio de Janeiro. Tínhamos quase os mesmos gostos e crenças, nem preciso dizer que contribuiu para que nos tornássemos amigos inseparáveis... de internerd. A gente só se falava pela internerd, batendo papo por MSN, e eu, sendo espetado por seu aparente desleixo com minha vida e meus problemas, eu estava tão dependente dele – no sentido de querer desabafar com alguém, e ele quase sempre estava Online – que por um momentinho achei que deveria agradecer por receber seus conselhos crus e frios, não obstante sua personalidade calma, ponderada e até brincalhona. Aparentava quase sempre estar de bem com a vida, o puto. Por uns dias, quis matá-lo ou melhor, fazer desaparecer da minha vida, mas sem dar cabo do sujeito. Eu ainda estava convencido de que, depois do que aconteceu ele não iria me dar uma segunda chance, provável que fosse o oposto, mas mesmo se desse mesmo eu não aceitaria. Vamos ser francos, estava de saco cheio de olhar na lata do cara. Até queria que ele sumisse mesmo, cedo ou tarde iria deletá-lo da minha lista de contatos do MSN e tudo mais, todavia rompi com ele de uma das formas mais toscas possíveis... isso, bola para frente, eu não precisava mais dele. Não era o que eu queria? Então.

Graça trabalhava na Pirelli, haha. Depois dessa não poderia mais me surpreender. E no que Laya, que era uma pessoa de fibra, trabalhava? Confeccionando bolinhos e tortinhas? Ao pensar nessa possibilidade soltei uma gargalhada tão escandalosa que chamou a atenção do grupo de jovens bolivianos que atravessava a rua. Como eu já estava com a cara para o alto, dei uma olhada nas nuvens e notei que iria chover. Mas novamente? Ah, esqueci que eu não estava no Rio. Pensei que a Graça seria uma pessoa ambiciosa, não por trabalhar em uma empresa de pneus – e isso não tinha muito a ver com ambição, pelo menos em minha convicção – , entretanto não sei o que fazia apitar minha mente para esta possibilidade, dela ultrapassar objetivos que normalmente lhe seriam conferidos. Digo isso porque é normal qualquer pessoa achar que “essa é assim, então terá o futuro assim, essa é assado, então terá este futuro”, etc. Eu ainda teria muito de me surpreender com minha garota.

Como não tinha absurdamente nada para fazer, cheguei junto em uma igreja, uma das neopentecostais que sabem mais pedir do que dar. Sentei-me em um dos bancos finais e notei a grande turba que se acomodara nas primeiras fileiras, e o pastor despejava seu grande gesticular, além da fala articulada que fazia com tranquilidade o trabalho de manter os fiéis zumbificados. O pastor era apenas um das dezenas de “profissionais” empenhados em exercer esta profissão, e como aquela igreja era uma empresa arrecadadora de grana nada mais normal que existir o pastor e seu rebanho, disposto a depositar de pequenas a enormes quantias em dinheiro para comprar sua vaguinha no céu, além do tão sonhado sucesso financeiro em terra. Bem que me disseram, classe média baixa adora cair nessa. Não é a toa que no Rio de Janeiro estas igrejas prosperam e arrecadam mais em áreas de baixa renda. Eu estava preguiçoso naquela poltrona gostosa – o fato dela ser quentinha e confortável fomentou a preguiça – e presenciei todo o teatro, toda a fala do pastor.

“Quem pode ajudar com R$ 1000, vem aqui na frente”, disse o funcionário, de terno bem cortado, para os fieis, em sua maioria em chinelo de dedo, camisas e calças perfuradas no estilo “foi na guerra e nem me convidou, hein?”. Posei o espaço entre o dedo indicador e polegar no queixo, estudei a cena e meus olhos moveram-se para focalizar o doador em potencial. Ninguém. “Quem pode ajudar com R$ 500, vem aqui na frente”, disse o pastor, abaixando o valor. Ninguém. “Quem pode ajudar com R$ 200, 100 reais, por favor, vem aqui na frente”, abaixou ainda mais, o funcionário. Uma pessoa levantou-se da poltrona, um velho alquebrado de terno marrom puído. Segurava uma nota de R$ 50 e um pequeno maço com notas de 10. Depois disso, o pastor tornou a abaixar o valor do “sacrifício”. “Quem pode ajudar com R$ 30, 20, 10 reais, com 5, com 1 real, ou até com suas moedinhas, lá do fundo do seu bolso, pode vir aqui na frente”, disse o pastor, com um indefectível sotaque carioca e um timbre de voz único entre os pastores, obreiros e tecladistas daquela igreja. Pelo que contei ao menos 32 fieis levantaram suas bundas das poltronas e depositaram seu suado dinheirinho no pé do púlpito. “Quem não teve nada para oferecer hoje, Deus vai abençoá-los depois”, concluiu ele. Eu tinha algum dinheiro e meu desejo era dar uma quantia à “congregação”, sem antes de enfiar no cu e arrancar um pouco de bosta. Ri só em pensar nisto. E minutos depois, após uma citação e estudo muito do superficial em passagens bíblicas pediu a atenção de todos para que contribuíssem na compra de miniaturas de cruzes vermelhas, alegando que elas foram banhadas no Rio Jordão, pediu R$ 10 em cada uma delas. Teve quem comprou. Cruzei os braços e desatei a rir. Presenciei boa parte dos fieis – sob música feita pelo tecladista – depositar mais uma grana. O que eu faria, se tivesse uma arma de fogo à minha disposição? Mas matar pequenos dedos de um corpo inteiro – matar pastorezinhos de quinta, invés de passar fogo nos bispos, entendeu agora, moleque? - não seria nada, era como cortar o rabo de uma lagartixa, sendo que ele cresceria de novo. Inútil, mas a sensação de ter mandado um enganador para o Inferno seria maravilhosa. Enganadores, falsos profetas, o povo já é burro em sua essência, e masoquista, não à toa se deixam enganar. Terminado todo o teatro pastoral levantei-me e quando me dirigi à porta fui abordado por 3 pessoas, digo, 3 pirralhos, do tal Grupo Jovem – e isso pôde ser percebido por suas camisas padronizadas. Uma lourinha peitudinha e de corpo magro, um gordo que fez escova e uma negra de cabelos igualmente escovados e erupções cutâneas na cara. Mas era gostosinha.

- Ei, a gente tava te observando – disse a negrinha, de fala e gestos bem graciosos – e queria dizer se você quer participar do nosso grupo, do Grupo Jovem.
- É, a gente acha que precisamos de mais jovens para evangelizar, entre outras coisas legais – reforçou a lourinha.
- Não vou poder – disse para eles. - Infelizmente não tenho uma frase de efeito pra dispensar vocês, mas, gatinha, se precisar de um cara para dar uns beijinhos, procura no meu Facebook, meu nome é Josef Gil – concluí, passando a mão na coxa direita da Senhorita Escovinha, e depois caminhei bem rápido. Ouvi atrás ela e a amiga dizerem algo como “desaforado do caramba...”, o que me fez sorrir. Legal, cumpri a boa ação do dia.


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REVERIE: COMEÇO DA PARADA Empty Re: REVERIE: COMEÇO DA PARADA

Mensagem  Admin Dom Fev 20, 2011 3:05 pm

REVERIE: COMEÇO DA PARADA Britne-Oldford-2

Depois disso, rumei para a Cohab, onde eu iria acessar a internerd. Fiquei com uma vontade louca de transar com a boliviana, pena que ela foi embora.

Pensava tanto em transar, transar e transar que encheu o saco. Uma hora isso tinha que acontecer. Eu tinha 27 anos, mas com uma libido de um moleque de 15, meu corpo aparentava não abraçar a velhice, o que só contribuía para que eu prosseguisse firme e forte, com pintão duro a quase toda hora e tudo mais. Também imaginava que cedo ou tarde meu corpo reagisse conforme a idade, até demoraria, mas meu metabolismo encararia o peso da idade numa boa e como resposta aos meu tesão extirparia-o expressivamente – ou não, já que tem idoso muito do fogoso hoje em dia. E a pílula azul? Estava tão novo para cogitar a possibilidade de usá-la no futuro... eu devia era frequentar um terapeuta, uma psicóloga, que me desse a melhor resposta – não a que quero ouvir, mas a certa – e eu passaria a me tratar sem problemas. Nem que fosse à base de remédio. E eu também andava tão desocupado – não obstante minhas ocupações principais e únicas em São Paulo – que cada vez mais pensava em transa. E foi eu conversar coma Laya, e foi eu dar início ao meu relacionamento com a Graça... levar a boliviana pro meu quarto e tudo... por um lado eu não estava querendo me desvencilhar do estigma sexual de minha vida, mas agora vejo que não devia dar tanta trela para o prazer de tocar em alguém, bater uma punheta, fazer sexo... eu não tenho uma vida sexual corrida, ter me com Sasha Green foi a melhor coisa que me aconteceu neste “ramo”, todavia existiam coisas mais importantes que isso. Como por exemplo, o meu ingresso em um concurso público. Bem antes de eu aportar nas terras dos bandeirantes eu me inscrevi para ser condutor de trens, maquinista da E. F. Leopoldina, que até poucos anos era a E. F. Príncipe do Grão Pará e anteriormente a E. F. Mauá, a primeira do Brasil. Poderia conduzir o trem de Barão de Mauá para Três Rios – um dos sonhos possíveis da minha vida – , poderia com tranquilidade ser o maquinista simultaneamente ao cineasta independente. Tinha tudo para vencer e sabia que o resultado final da minha prova no concurso seria dado. Semana que vem, era certo. É, meu destino era permanecer morando no Rio, não exatamente na capital, não tinha outro jeito. Não obstante Graça e eu sermos namorados não saberia se ela viria comigo, era maior de idade, o que não queria dizer que ela estava independente dos pais, não, não. Teria que, como dizem os descoladinhos de merda, “dar a louca” e com isso, vir morar comigo no pé da Serra da Estrela. As locomotivas Baldwin (da Leopoldina Railway) me esperavam. Meu desejo era morar no bairro Meio da Serra, em Petrópolis. E eu já estava trabalhando para isso.

Chegando na Cohab, terminei por dar a volta e telefonar para a Graça. Quase tinha me esquecido de ligar para ela. “E então, amor, o que você resolveu?”, perguntei a ela. “Hoje eu vou sair mais cedo, então tem como você vir pra cá?”, perguntou ela. Fiquei mais feliz. “Daí, a gente se encontra, ou então eu te vejo aí, mas não ficarei por muito tempo”. “Beleza, tem como a gente se encontrar no metrô Armênia, então?”. Pronto, combinamos. Agora sim o meu domingo estava salvo.

Fiquei no quarto, acessando a internet. Por precaução – para não falar com Giovanni – não entrei no MSN, eu não estava afim de discutir. Estava na cara de que a Graça iria se desdobrar para ter tempo para mim hoje, visto que teria de pedir permissão para os pais e tudo mais, e eu estava torcendo para que ela se emancipasse o quanto antes. Eu estava sendo egoísta ao pensar desse jeito, só que ela era mais velha que eu e tinha a vida formada, por que ainda dependeria de papai e mamãe? Devia ter seus motivos, mas era algo que eu não conseguia me conformar – e não me conformava por ter uma experiência de vida bem diferente, então, não teria direito de medi-la com minha régua. Era diferente de mim, eu devia me conformar com isso. Já era bom demais tê-la por perto e sendo minha namorada, eu já estava arquitetando o “Plano B” para traze-la comigo à Petrópolis – como é muito mais fácil acontecer coisas ruins que boas na minha vida, se ela declinasse no convite eu já preveria – , logo, eu teria de ser mais paciente. Deixá-la aqui para que um sujeito imerecedor de seu amor e carinho a namorasse? Só de pensar me aborrecia.

Deu 1 hora da tarde, eu estava perdendo meu tempo lendo um blog quando bateram à minha porta. Olhei por uma fresta, era a filha do meio daquela família que me recebeu no dia anterior. Estava um calor desgraçado lá dentro, depois de despachá-la iria deixar a porta entreaberta. Abri a porta e vi que ela estava vestida de uma calça jeans azul bebê e uma camisa branca bem curta. Tinha seus cabelos soltos. Eu não estava muito afim de falar, tudo bem. “Oi, mamãe pediu para te chamar, pra almoçar com a gente”, disse ela, sorrindo. “Quer vir?” E eu iria recusar, se estava com fome? Descemos as escadas e lá embaixo notei a pequenina abrindo os braços para mim, preparando para me abraçar. A abraçei, erguendo-a do chão, e senti seu cheiro natural perpassar a minha pele e as minhas narinas, estava com saudades de ter com ela. Depois disso entramos na casa da família e a mãe me recebeu com um abraço, como se eu já fosse o melhor amigo deles. Novamente, me senti sem jeito. “Onde está a mais velha?”, perguntei, o que gerou certa desconfiança na filha do meio. “Ela teve de sair mais cedo porque fui estudar para um concurso”, respondeu a mãe de família. “E meu marido teve que acompanhar o Serginho em Curitiba”. Ao perguntar para ela quem era Serginho, a filha do meio respondeu-me que era um cantor de forró com sucesso mediano. O pai da família era um dos agentes do sujeito. Foi até melhor ele estar fora, pois não conseguiria aturar qualquer homem naquele dia. Nos sentamos e sorri ao ver os pratos na mesa redonda: arroz, feijão – o “mulatinho”, paulista não come feijão preto – , peixe assado, salada de alface com tomate e cebola. Mesmo louco para me esbaldar na comida tive que me conter. “Pode se servir”, disse a mãe.

Fiquei quieto durante o almoço. Chegou uma hora em que mandei a etiqueta às favas – até porque “etiqueta” não era o forte daquela família – , com a permissão da mãe peguei grandes pedaços de peixe e tomei 3 copos grandes de suco de goiaba, me achava magro até demais e não era o único. Todas aprovaram o assassinato da minha fome. Comia e pensava em Graça, comia e pensava em Graça. Combinamos de nos encontrar na Armênia às duas, apesar de quase todas as mulheres da casa constatarem que eu não estava de papo – e sim de comer – a irmã do meio me perguntou: “Não conseguiu arrumar nenhum amigo aqui? Nem namorada?”. Eu não estava a fim de responder, mas como ela fazia parte da família – e eles faziam um favor para mim me alimentando – respondi. “Rompi a amizade com um cara, ele fez uma besteira aí que nem quero dizer, e tenho namorada, sim. Eu sei que os jovens adoram falar de namoro, mas eu não gosto muito”.

- “Osh”, só perguntei – disse ela, achando-se afetada com o que eu disse. - Qual o nome dela?
- Ele não quer falar sobre isso – disse a mãe, entre suas mastigações. - Deixa ele.
- Desculpa – disse à irmã do meio.
- Ah, tudo bem – respondeu ela, fingindo não estar tão fustigada. Mudou de assunto. - Olha, vocês sabem o que eu li no jornal? A Suzana... aquela Suzana vai ser liberta hoje!
- Que Suzana? - perguntei a ela, fingindo não saber de quem se tratava e rindo pela gracinha que a irmãzinha fazia para mim, do meu lado, imitando a irmã do meio no gesticular.
- A Suzana, aquela que matou os pais, a Suzana von Eisenhofen! - bradou a mulher, deixando a mãe boquiaberta pela notícia.
- Ah, ela passou um bom tempo presa – disse a todas. - 20 anos.
- E achei pouco, ela devia apodrecer na cadeia, devia ficar até a morte lá, pegar prisão perpétua – disse a irmã do meio, como se Perpétua existisse por aqui.
- Depois ela vai botar a boca no trombone nas entrevistas, nesses programas de variedades – disse a mãe.
- Alguém duvida? - perguntei a todas. Depois, voltei a comer tranquilamente.

Sabia disso, como já ficou dito. Eu já tinha algo para fazer depois de falar com a Graça – embora eu certamente perderia mais tempo com ela que o programado... ué, não teria nada programado, eu ficaria com ela por dias seguidos, se me deixasse. Era engraçado, uma menina como ela trabalhar na Pirelli e fazer balé... eu ainda estava rotulando as pessoas baseado em estereótipos, achei que já tinha passado por cima disso há muito, mas pelo jeito... se eu ainda estava embasbacado com isso imagine se eu souber que Laya trabalha com algo totalmente diferente ao seu estilo... é, ainda preso nos estereótipos.

Saí da casa da família feliz e sorridente. Cumprimentei-as e agradeci o almoço que me ofereceram, eu iria fazer um lanche bem magro, caso não me convidassem à mesa. Já estava quase na hora de eu ver a Graça, teria de tomar um banho, me arrumar e encontrá-la no metrô Armênia. Fiquei impaciente, tomei um banho rápido e acabei usando as mesmas roupas, pois eu tinha poucas, mesmo sabendo que iria permanecer mais que 5 ou 6 dias na cidade. Estou acostumado a usar as mesmas roupas, só que eu estava lidando com uma menina, é necessário ter o mínimo de asseio, eu precisava de outras roupas, mesmo sendo velhas. Por isso mesmo, verifiquei a existência de alguns brechós na região, pela internerd. Tá certo que tais brechós eram aqueles chiques, com roupas e calçados caros – mesmo sendo brechó – , eu não tinha escolha, por enquanto era isso.

Fui para o Armênia, ela me disse que me esperaria em frente às catracas. Eu até queria levá-la para conhecer o quarto onde estou morando, mas ela iria achar cedo demais para isso, evidentemente confundindo na hipótese de eu querer fazer sexo com ela. Queria sim, mas não forçaria nada. E também não naquele dia, tinha adquirido um certo cansaço interior ao ter uma noite de luxúria com a atriz, então guardaria as forças para descarregar em outro dia. Dizendo isso parece que sou o tipo que fraqueja fácil no sexo, hein? Não, não é isso, só estava preparado para fazer o que a Graça certamente pensava, em se guardar para um momento especial comigo. Não é preciso dizer que tanto eu quanto ela não concordávamos em desfrutar deste momento num quarto fedorento e com paredes descascadas, o que resumia quase toda a extensão daquele conjunto habitacional. Se eu quisesse podia listar aqui os problemas daquele local, detalhá-los um por um, mas não seria tão cruel com o lugar onde tinha passado uns dias, usando-o como casa enquanto resolvia problemas de suma importância – e, não obstante o sexo com a atriz pornô e as minhas desventuras amorosas, eu resolvia um problema importante, sim. Independente disso uma coisa que me intrigava era como retornar ao Rio de Janeiro, depois. Se por ônibus ou por trem... mas ônibus era uma coisa que não estava sendo tão usada quanto o trem, ainda firme e forte no país. Eu podia descer para Santos e de lá pegar uma condução – já que não tinha trem de lá para o Rio – ou então seguir o Ramal de São Paulo, desceria na estação Barra do Piraí – já no Estado do Rio – e fazer baldeação, pegando o entrocamento do Ramal do Centro, da Estrada de Ferro Central do Brasil. Eu poderia zoar um pouco com as coisas e, como adorava viajar, podia também pegar o Ramal Sapucahy, rumando para Santa Isabel do Rio Preto, no município de Valença, também no Rio. A estação Barra do Piraí é a mais importante do Sul Fluminense. O trem era tão necessário em minha vida que, se eu realmente passasse no concurso me desligaria de todos os meus afazeres na capital para me dedicar à este meio de transporte. A impressão é que eu esteja falando tudo isso à toa, para alguém que não dá uma foda por isso, assim como ocorre com facilidade no dia a dia. Hoje em dia, creio que menos de 1% da população se importe com trens... digo, não são tão xiitas no assunto quanto eu.

Eu já estava chegando ao Armênia quando rolou aquele friozinho na barriga, apesar de já ter visto, falado e beijado a Graça. Eu já estava colocando Laya de lado na minha mente, o que era bom, pois eu ainda tinha salvação, não precisava esfaquear a Graça pelas costas de novo e muito menos romper com ela para correr atrás de uma garota que provável, não investiria em um relacionamento comigo, até porque, eu pensava que ela iria era curtir uma com a minha cara, como fez antes. E possível, me achava feio, não aquele feio repugnante, mas apenas... feio. Eu podia ter uma boa transa com ela, fazê-la subir pelas paredes, mas me achava feio. Mais um motivo para não me dedicar a quem não está nem aí para mim, e eu tinha a Graça, caramba. Aguardei uns 10 minutinhos quando vi a própria descer as escadas, e quando me viu, sorriu. Trajava uma saia alta – possivelmente cobria o seu umbigo – amarela com estampa de inúmeras flores minúsculas, um casaco vermelho, uma blusa de manga curta com a mesma estampa e cor do vestido, meiões pretos e sapatilhas pretas, cabelo trançado para trás. São Paulo era frio – ma non troppo – , só que ela exagerava na vestimenta. Para que se empacotar toda? Ou temia que eu arrancasse um pedaço da sua pele? Ela era evangélica ou o que?

- Amor... - suspirou ela no meu ouvido, quando nos abraçamos. Ela estava do outro lado da catraca. Eu já me incomodava com as pessoas olhando para nós. Graça limpou o resto de comida da minha boca. - Tá com a boca suja...
- Não precisava ter se arrumado tanto, querida – disse a ela. - Vamos sair fora daqui.
- Quer que eu passe a catraca ou você vem comigo? - ao perguntar isso lembrei-me de que não poderia levá-la ao meu quarto, ainda. Me desprendi dela, paguei minha passagem e, de mãos dadas, subimos a escada rolante. Mulheres altas e gostosas olhando para a gente, e eu me incomodava, mesmo achando que o ser humano faz isso normalmente. É a mesma coisa da gente estar comendo alguma coisa por aí e sermos observados por quem, na maioria das vezes, tem fome. Lá no Rio me olhavam direto, se era homem achava que era viado, óbvio. Antes mesmo de chegarmos à plataforma com destino à Jabaquara a Graça notou meu incômodo. - Você ainda se mostra chateado com os outros só porque estão te olhando?
- É, mas falar disso é uma merda, deixa quieto – respondi a ela, olhando para a frente. Sabia que a Graça não desistiria tão cedo de tocar nesse assunto, então...
- Sabe que não tem nenhum problema em desabafar comigo. Não dou conselhos clichê, e sei que você odeia isso – disse ela, sorrindo. Eu poderia permanecer de mãos dadas com ela por anos. - Os bancos da plataforma situavam-se no meio desta, um tanto distante das escadas. Aliás, das escadas vi que alguns filhos da puta já a ocupavam, fora isso, mesmo domingo os espaços onde estacionavam as portas dos vagões já estavam cheios. Roqueirinhos olhavam para mim, e Graça, observadoríssima, disse aos risos: - É, tá na hora de cortar esse cabelo e tirar esse coturno.
- Eu ainda acho muito cedo – respondi, olhando para meus pisantes, que apesar de negros não podiam esconder a sujeira. Depois disso pensei melhor (em poucos segundos) e achei que ela estava certa, acertou na mosca. Só faltou uma jaqueta de couro, para combinar com o calçado e os cabelos, que já ultrapassaram a nuca, e como eles crescem rápido em pouco tempo chegariam ao início das costas, o que me deixaria ainda mais dispensável na lista de “bonitos” das mulheres. Graça não contava (já que ela namorava comigo).
- Quer que eu corte seu cabelo? - perguntou ela. - Mas eu teria que ver se mamãe está em casa, lembro que ela me disse que iria sair com umas amigas, era aniversário da empresa hoje, então...
- Cortar hoje? Mas para isso eu teria que ir na sua casa, né? - perguntei a ela, sorrindo no canto da boca. Graça sorriu e assentiu com a cabeça, sem dizer nada. Demorei um pouco para sacar que ela matutava sobre a possibilidade de eu estar na sua casa, nós, sozinhos. Mesmo tendo dito anteriormente que iria fazer amor com ela em um local melhor que o quarto onde estava, ainda não era o momento de tê-la por completo. Eu sentia isso.
- É, teria, vou perguntar para ela se ainda está em casa – respondeu Graça, que sacou seu celular e efetuou uma ligação à mãe. Pensei na hora que, se mães não eram conservadores demais calcadas na burrice elas podiam ser espertas, talvez esta achava que Graça estava comigo, então, quando a menina perguntaria se a mãe sairia naquele dia esta responderia que não, que ficaria o dia inteiro em casa e aproveitaria para diminuir o tempo do encontro da filha. Creio que, mesmo se me conhecesse a fundo a mãe da Graça não mudaria seu jeito em relação a isso. Ah, que vontade de matá-la. O trem chegou, entramos, apontei um local distante dos outros, onde eu pudesse me sentar com ela sem problemas, e sentamos. Ela ainda estava presa ao telefone, depois desligou. Todo o tempo acompanhei suas expressões. Pelo jeito, como ela não manifestou nem decepção ou tristeza, me animei. - Ela já saiu, tá com as amigas, mas disse que já tá voltando pra casa.
- Hah, sabia – disse, quando na verdade não sabia. - A Laya não tem máquina? Podíamos aparecer na casa...
- Não, não tem – respondeu Graça, séria. - Eu queria realmente cortar o seu cabelo, vou ligar pra mamãe e perguntar se podemos aparecer lá em casa contigo...
- Não liga – disse a ela, segurando sua mão. - Ela vai dizer que não pode, vai inventar um probleminha, você sabe que mães não gostam de ver suas filhas saindo com caras que conheceram na internerd. Eu já te disse isso pelo MSN. Sua mãe não é diferente, na boa.
- Nossa, tá bom, você tá certo – disse Graça, pondo o aparelho na “borsa”.
- Não precisa dizer “nossa”, não gosto disso.
- É modo de falar – Graça sorriu constrangedoramente ao dizer.
- Beleza, mas vamos fazer uma coisa: não dependa da sua mãe pra me ver ou ficar comigo na sua casa. Ok, vai me dizer que ela é dona da casa e tudo mais, mas ela não aprovará tão cedo qualquer coisa que você perguntar, qualquer permissão que pedir. Como eu te falei antes.
- Minha mãe não é igual a estas...
- Você sabe que é – atropelei. Graça abriu a boca para retrucar, mas desistiu. Respirei fundo e toquei sua mão, acariciei-a com meu polegar.
- Quer ir à Liberdade comigo? - perguntou ela, como se não tivesse mais nada de bom para falar. Mesmo assim acabamos indo. Eu já estava puto por ter perdido tempo pensando na mãe da Graça, mesmo estando perto da guria, de mãos dadas, não conseguia me acalmar. Talvez fosse melhor me descolar dessa e ficar sozinho, tomando uma água, isolado, do jeito que eu gosto, mas não cometeria a sandice de deixá-la sozinha, especialmente por ser o nosso encontro. Descemos na estação da Liberdade e subimos lentamente até a superfície, não conseguia olhar na cara da Graça, porque eu estava muito aborrecido. Pedi com toda a delicadeza do mundo que não tocasse em mim, então ela pareceu ter entendido e tirou sua mão da minha. Meu peito esquentava, meu coração doía. Ainda na estação, me curvei um tanto, Graça viu-me encostar na parede e quando uma japa me observava bradei: “tá olhando o que, japa de merda?”, provocando imediato constrangimento em Graça, que queria me tocar, mas se conteve. Eu fitava o chão, respirava fundo, mas percebi que ela estava confusa, sem ter o que fazer, até que cantou a bola.
- Vamos ao médico? - perguntou.
- Não, só preciso tomar alguma coisa – respondi a ela. Não queria que se desesperasse. Saímos da estação sem Graça me tocar, então me deparei com um vendedor de água, refris e guloseimas, comprei 2 garrafas d'água. Eu tomava uma e Graça segurava a outra. Esta aproveitou para comprar jujubas. Falando em jujubas, lembro que comprei um saco com mais ou menos 200 gramas na Luz e demorei a comer, pois eram amargas, repugnantes. Só sendo paulistano mesmo pra aguentar isso. Eu já estava melhor, quando Graça quis sentar-se comigo na praça, mas como estava cheio de weeaboos de merda (como sempre esteve) chegamos no flipperama, aquele mesmo de R$ 0,75. Estava curioso quanto ao desempenho da guria nas máquinas. Comprei 4 fichas, e quando me preparava para guardar o troco Graça me disse: “depois vamos tomar alguma coisa que não seja água, como um sorvete”. Assenti sorrindo.
- Ai, eu sempre fui meio chatinha nesses jogos – disse Graça, tomando a iniciativa de entrar num jogo de carro. Fiquei atrás dela, acompanhando tudo. Era péssima, guiava o carro na direção errada da pista, batia o tempo todo, mal conseguia passar a marcha e virar a curva, eu ria, mas não achava tanta graça quanto ela, pois queria que ao menos terminasse a porcaria da prova. Nem isso seus dedos frágeis e curtos podiam fazer, digo, sua mente. Em compensação Graça me deu os sorrisos mais sinceros e gostosos que já tinha visto em uma menina, digo, mulher, já que Graça era alguns anos mais velha que eu. Dei mais uma ficha a ela, pois queria jogar também, em outro jogo. Cheguei no Street Fighter IV e me emputeci com o Blanka me vencendo à base do “choquinho”. Os personagens também eram pesados, mas não incontroláveis, e não deu, não deu para passar do terceiro oponente. Olhei para Graça e notei que o chinesinho histérico observava o desempenho dela atentamente. Pus a ficha no outro jogo de porrada, The King of Fighters 2001 e em 15 minutos zerei, mandando o Igniz (o chefe) pro inferno com meu quarteto feminino completo: King (é uma mulher, apesar do codinome), Mai Shiranui, Li Xiangfei e Shijo Hinako. Se Graça tinha dificuldades em manejar um carro de mentira, imagina botar uma personagem para brigar?
- Você está indo bem – disse a ela, sem mentir, pois realmente tinha conseguido controlar o carro e pelo menos maneirado na velocidade ao ter de passar pelas curvas. Terminou a prova em quinto lugar, e eu sorri com sinceridade. Graça bateu palmas e saiu com pressa do banco da máquina para me abraçar e me beijar. Nessa hora, o moleque aparvalhado se afastou sem que eu pedisse e viu Graça apertar seus braços nas minhas costas e apertar os meus lábios contra os seus. Acho que já foi dito aqui, não gosto de ser beijado quando tem alguém observando, isso é muito incômodo, então eu tirei Graça dali. Até poderia levá-la para um canto, o flipperama tinha banheiro, mas tê-la nos braços perto de um vaso imundo era inapropriado para a minha princesinha. E como ela queria tomar alguma coisa, fomos a uma lanchonete ali, na avenida Liberdade, indo para a Praça da Sé. Nos sentamos e como antes, Graça fez as honras, levantou-se para pedir o que iríamos traçar: banana split e água, 2 garrafas d'água. Queria pagar tudo sozinha, então tá.

O céu estava tão azul que confundiria qualquer burro que ouvisse pela primeira vez que estávamos sob monóxido de carbono. Até pouco tempo choveu pra caramba e o sol na cara conseguia aborrecer mais do que a chuva. Graça não tava nem aí. Ainda preocupada com o meu estresse – e fingia que não tava – Graça voltou e sentou-se à minha frente. Ainda temia tocar as minhas mãos. Toquei as dela, como prova de que não tava tão puto quanto antes. Sorriu para mim. “Já posso sentar do seu lado?”, perguntou ela, e eu assenti com a cabeça. Sorriu para mim ao estarmos juntos, colados, com sua mão esquerda segurando a minha e sua direita acariciando meus cabelos que mais um tanto seriam longos. Pegou das pontas até o topo da cabeça, descendo um pouco até as bordas da minha testa ampla. Meio que me estudava. Me deixou relaxado pra caralho. Poderíamos ficar assim durante todo o tempo, se o oriental pinto pequeno (pleonasmo!) imbecil de merda não tivesse interrompido tudo ao nos servir. Desgraçado. Olhei feio para aquela criatura adiposa – gordo só faz gordice, não bastava ser oriental? - , mas Graça, percebendo tudo – como se me conhecesse mais do que nunca – virou meu rosto para ela. “Mantenha o foco em mim”, disse, sorrindo. Fiquei de boa. “Você não gosta dos outros”.

- Achei que já tinha percebido isso – disse a ela, abrindo os braços lentamente. - Eu quero me isolar.
- Mas por que? - indagou Graça.
- A gente já não conversou sobre isso? - perguntei a ela.
- Sim, mas lembro que você não me respondeu tudo, quando a gente tava conversando pelo MSN...
- Beleza. Eu não gosto de gente, pessoas, normalmente sou seletivo pra escolher amigos, só quando tô carente pra cacete que me torno uma putinha fácil, que mendiga a amizade alheia. Agora, estou no meu “Normal Mode” ou “Standard Mode”, o sujeito misantropo, preconceituoso, inteligente e sincero de sempre. Na minha carência extrema eu sou estou no “Lacking Mode”, ou “Putinha Mode”, como preferir...
- Não fique assim – disse, e depois disso fiz uma careta para ela. - Quer dizer, eu tô aqui, então não precisa... ah, caramba, eu não sei o que dizer, a maioria dos conselhos que eu sei para pessoas tristes e misantropas são tudo clichê!
- Então, não diga – disse a ela. - E não me rotule. Só eu posso rotular os outros. - caí na risada, e Graça, estranhando toda a situação, riu junto, mas eu sacava que, se eu prosseguisse com esse jeito se afastaria de mim. Riu de nervosa que estava. Graça era uma das poucas pessoas que ainda acreditavam em mim. Se eu a perdesse voltaria à estaca zero, e todo fodido. Convenhamos que seria desagradável voltar novamente o “Putinha Mode”
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